1 – Quais são os distúrbios respiratórios relacionados ao sono? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Segundo a atual Classificação Internacional dos Distúrbios do Sono, publicada em 2005, as síndromes respiratórias relacionadas ao sono são assim categorizadas:1. Síndromes da apnéia central do sono
2. Síndromes da apnéia obstrutiva do sono
3. Síndromes da hipoventilação/hipoxemia relacionadas ao sono
4. Síndromes da hipoventilação/hipoxemia relacionadas ao sono causadas por condições médicas
5. Outros distúrbios respiratórios relacionados ao sono |
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2 – Qual a definição de síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
SAOS é caracterizada por episódios recorrentes de obstrução parcial ou total das vias aéreas superiores durante o sono. Manifesta-se como redução (hipopnéia) ou cessação completa (apnéia) do fluxo aéreo apesar da manutenção dos esforços inspiratórios. Ocorre dessaturação da oxi-hemoglobina e, em casos de eventos prolongados, hipercapnia. Os eventos são freqüentemente finalizados por despertares. Acredita-se que sintomas diurnos, como sonolência excessiva, estejam relacionados à fragmentação do sono (despertares freqüentes) e possivelmente também à hipoxemia recorrente. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
3 – A síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS) é muito freqüente? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A prevalência da SAOS varia de acordo com a população estudada. Nos Estados Unidos é de 4% em homens e 2% em mulheres, entre indivíduos de 30 a 60 anos. No Brasil não temos estudos epidemiológicos utilizando dados de polissonografia e sim com questionários abordando queixas de sono. Estima-se que, acima de 40 anos, 24% das mulheres e 36% dos homens refiram ronco. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
4 – Qual a fisiopatogenia da síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A permeabilidade da via aérea superior é mantida pelas estruturas ósseas e cartilaginosas que revestem a nasofaringe e orofaringe, associada á ação dos músculos esqueléticos locais. Fisiologicamente, durante o sono há relaxamento do tônus muscular dessa região, no entanto, a via aérea ainda permanece suficientemente pérvia. Nos portadores da SAOS, em função do excesso de tecido mole e/ou relaxamento excessivo da musculatura local, ocorre, durante o sono, acentuada redução do calibre da via aérea provocando obstrução parcial ou total ao fluxo de ar, desencadeando os episódios de hipopnéia ou apnéia. Tal evento promove a superficialização do sono ou mesmo o despertar do paciente, de tal maneira que os músculos da nasofaringe voltam a contrair e permitem o restabelecimento da permeabilidade da via aérea e o indivíduo volta a dormir. O portador da SAOS apresenta diversos episódios de apnéia/hipopnéia durante a noite, consequentemente há fragmentação do sono, que perde a sua capacidade restauradora. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
5 – Quais são os fatores de risco para a ocorrência da síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
São considerados fatores de risco bem estabelecidos para a ocorrência da SAOS:
Outros fatores potencialmente de risco para SAOS são: tabagismo, hereditariedade e congestão nasal. Além disso, há fatores que agravam a SAOS, como o uso de drogas sedativas e o álcool. |
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6 – Como se suspeita de que um paciente tenha síndrome da apnéia/hipopnéia obstrutiva do sono (SAHOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os sinais e sintomas mais comuns da SAHOS são o ronco, a sonolência excessiva e pausas respiratórias durante o sono observadas pelo companheiro(a). Prejuízo das funções cognitivas, tais como, concentração, atenção e memória e de função executiva são observados. Alterações de humor, tais como irritabilidade, depressão e ansiedade são encontradas. Vários estudos tentam, atualmente, a partir de questionários e medidas de exame físico, predizer o diagnóstico da SAHOS. Dentre essas variáveis destacam-se, como de maior valor preditivo, a circunferência do pescoço, o índice de massa corpórea, história de hipertensão arterial sistêmica, história de ronco e relato do companheiro de quarto sobre apnéias durante o sono. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
7 – Quais as diferenças na síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS) da criança e do adulto? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Na criança os fatores predisponentes são hipertrofia adenoamigdaliana, malformações craniofaciais e doenças neuromusculares, enquanto, no adulto, obesidade, sexo masculino e fatores como uso de álcool e substâncias sedativas favorecem a um maior colapso da faringe. O quadro clínico na criança se apresenta como déficit de crescimento e de aprendizado, enquanto no adulto predominam sonolência excessiva, déficits cognitivos e alterações de humor. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
8 – Todo paciente que ronca tem a síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O ronco é um dos sinais característicos da síndrome da apnéia obstrutiva do sono. Assim, o médico ao deparar com o paciente que ronca deve ter sempre a preocupação de afastar ou confirmar tal diagnóstico, em função das graves conseqüências dessa entidade. No entanto, a presença de ronco isoladamente não significa que o indivíduo seja portador da SAOS, é a combinação dos sinais e sintomas (ronco, sonolência diurna excessiva, episódios recorrentes de apnéia, fadiga excessiva, redução da libido, déficit de atenção, entre outros) que apontará ou não para o diagnóstico de SAOS. A polissonografia é o exame padrão ouro para definir o diagnóstico de SAOS, no entanto, não são todos os pacientes que roncam que devem ser submetidos a esse teste diagnóstico. Há estudos que mostram que em cerca de 80% dos pacientes que roncam e que não têm outras características para SAOS o exame polissonográfico é normal. Assim, o simples fato de roncar não é, isoladamente, uma indicação para a realização de polissonografia. No entanto, em função dos fatores de risco para o ronco primário (sem SAOS associada) serem praticamente os mesmos para SAOS, pode considerar que os pacientes que roncam regularmente provavelmente apresentam risco aumentado para o desenvolvimento da SAOS. Assim, o acompanhamento e a possível correção dos fatores de risco (exemplo: obesidade) deve ser tentada. |
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9 – Como avaliar a sonolência excessiva diurna? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A sonolência excessiva diurna é um sintoma fundamental para o diagnóstico da SAOS, sendo também importante para a avaliação da sua gravidade. Assim, a sua documentação deve ser uma prioridade na avaliação do paciente. Uma forma de aferir a presença da sonolência diurna excessiva é através da Escala de Sonolência de Epworth, que consiste em um questionário simples e de fácil aplicabilidade, que o paciente deve responder. Veja na tabela 1 essa escala:
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10 – Quais dados do exame físico devem ser explorados no paciente com suspeita da SAOS? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Com exceção do peso, o exame físico é frequentemente normal no paciente com SAOS. Na avaliação dos pacientes com suspeita desse diagnóstico o médico deve avaliar os sinais que indicam risco aumentado para a presença de SAOS: peso (IMC > 30), circunferência do pescoço (as chances de SAOS são significativamente maiores em indivíduos com circunferência maior que 44,5 cm), alterações crânio-faciais e alterações na nasofaringe e orofaringe. A avaliação da pressão arterial é muito importante, visto que aproximadamente 50% dos pacientes com SAOS têm hipertensão arterial, mais proeminente na parte da manhã. |
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11 – Como se avalia a gravidade da síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A SAOS é considerada leve quando sonolência ou episódios de sono involuntários ocorrem durante atividades que requerem pouca atenção, como assistir televisão, ler ou andar de veículo como passageiro. Nesse grau de doença, os sintomas produzem discreta alteração da função social ou ocupacional. Na polissonografia, o índice de apnéia e hipopnéia (IAH) é maior que 5 e menor ou igual a 15. Quando a SAOS é moderada, a sonolência ou os episódios involuntários do sono ocorrem durante atividades que requerem alguma atenção, como assistir a eventos socioculturais. Os sintomas produzem moderada alteração na função social ou ocupacional. O IAH é maior que 15 e menor ou igual a 30. Na SAOS acentuada, a sonolência ou os episódios de sono involuntários ocorrem durante atividades que requerem maior atenção, como comer, conversar, andar ou dirigir. Os sintomas provocam marcada alteração na função social ou ocupacional. O IAH é maior que 30. |
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12 – Quais as conseqüências da síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Atualmente já se pode afirmar que a SAOS é um fator de risco independente para hipertensão arterial sistêmica. A SAOS pode contribuir para a instalação e progressão de outras doenças cardiovasculares como arritmias, insuficiência coronariana, insuficiência cardíaca e acidente vascular encefálico. Sonolência excessiva, associada aos défictis cognitivos (atenção, memória e função executiva), é responsável por acidentes automobilísticos, de trabalho e diminuição da capacidade profissional. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
13 – Quais os critérios diagnósticos da síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os critérios diagnósticos da SAOS incluem:
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14 – O que é a polissonografia? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Polissonografia é o exame padrão ouro para o diagnóstico da síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS). Convencionalmente o exame é realizado em um laboratório do sono, onde o paciente irá dormir e terá o seu sono monitorado. As variáveis fisiológicas mensuradas durante o exame incluem:
O diagnóstico da SAOS é considerado em adultos sintomáticos quando do registro de mais de cinco eventos de apnéia/hipopnéia por hora. Em adultos assintomáticos o diagnóstico é sugerido quando a ocorrência de eventos de apnéia/hipopnéia for maior do que 15 por hora. |
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15 – Como se definem os eventos respiratórios anormais durante o sono? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os eventos respiratórios anormais durante o sono são assim caracterizados no exame polissonográfico: Hipopnéia/apnéia obstrutivas
São critérios necessários para caracterização desses eventos os itens 1 ou 2, mais o item 3. Despertares relacionados a esforços respiratórios (DRER) |
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16 – É necessário sempre realizar polissonografia para o diagnóstico de síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O estudo polissonográfico de noite inteira e realizado no laboratório do sono sob supervisão técnica continua, sendo o principal método diagnóstico para os distúrbios respiratórios do sono. Em situações muito específicas podem ser utilizados métodos simplificados de registro: pacientes com forte suspeita de SAOS grave, quando a polissonografia clássica não esteja disponível, quando o paciente não pode realizá-la no laboratório do sono ou quando o paciente já se encontra em tratamento. Nessas situações a polissonografia deve ser feita assim que possível. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
17 – Quais são os parâmetros mínimos recomendados para o registro da polissonografia na síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A polissonografia é baseada no registro simultâneo de algumas variáveis fisiológicas durante uma noite de sono espontâneo. Os parâmetros mínimos necessários são: eletroencefalograma (EEG); eletrooculograma (EOG); eletromiograma (EMG) de região mentoniana/submentoniana; eletrocardiograma (ECG); fluxo aéreo (nasal e oral); esforço respiratório (torácico e abdominal), saturação de oxi-hemoglobina. Registros de decúbito corporal, de movimentos de pernas e de som traqueal são recomendáveis. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
18 – A polissonografia pode ser feita de dia ou dividida em duas partes para avaliar o diagnóstico e o tratamento em uma só noite? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Exame de noite inteira com registro parcial (“split-night”), realizando numa mesma noite o diagnóstico e a titulação do tratamento, tem suas limitações, mas pode ser usado quando há suspeita de que o grau da doença é acentuado e o tratamento deve ser instituído prontamente. Considerando que sono REM predomina na segunda metade da noite, os eventos respiratórios relacionados a esse estágio do sono não são identificados quando se faz o registro parcial. A polissonografia diurna não tem sido recomendada com base nas evidências atuais. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
19 – Existem outros tipos de exames mais simples para realizar o diagnóstico da síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os testes de registro visam simplificar o diagnóstico, já que a polissonografia clássica é cara, requer tempo, material e pessoal altamente qualificado. As limitações devem-se ao fato de não se abordarem outros distúrbios do sono e à impossibilidade de intervenção durante o exame. Suas indicações já foram citadas quando a realização da polissonografia clássica não é possÍvel. Atualmente são aceitos os registros até nível III de resolução (abaixo descritos). Considerando a diversidade dos sistemas polissonográficos disponíveis na atualidade, uma classificação foi proposta de acordo com seus respectivos níveis de resolução:Nível I (polissonografia padrão) Parâmetros: mínimo de sete canais, incluindo eletroencefalograma (EEG), eletrooculograma (EOG), eletromiografia (EMG) submentoniana, eletrocardiograma (ECG), fluxo aéreo oronasal, movimento respiratório e saturação da oxi-hemoglobina. A posição do corpo pode ser documentada ou objetivamente medida. EMG de pernas é opcional. A supervisão é constante e intervenções são possíveis.Nível II (polissonografia portátil) Parâmetros: mínimo de sete canais, incluindo EEG, EOG, EMG submentoniana, ECG (ou registro de freqüência cardíaca), fluxo aéreo oronasal, movimento respiratório, saturação da oxi-hemoglobina. A posição do corpo pode ser documentada ou objetivamente medida. EMG de pernas é opcional. A supervisão e intervenções não são possíveis.Nível III (sistema portátil modificado para diagnóstico da SAOS) Parâmetros: mínimo de quatro canais, incluindo ventilação (pelo menos dois canais para movimentos respiratórios, ou movimento respiratório e fluxo aéreo oronasal), ECG (ou registro de freqüência cardíaca), saturação da oxi-hemoglobina. A posição do corpo, EMG de pernas, supervisão e intervenções não são possíveis.Nível IV (registro contínuo de um ou dois parâmetros) Parâmetros: mínimo de um (saturação da oxi-hemoglobina por oximetria associada ou não a registro de freqüência cardíaca). A posição do corpo, EMG de pernas, supervisão e intervenções não são possíveis.Monitorização avançada nível IV Geralmente são aparelhos que registram a oximetria e mais um canal respiratório (fluxo aéreo, ronco). |
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20 – Quais são as orientações terapêuticas para um paciente com síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O tratamento clínico deve incluir medidas comportamentais, como perda de peso, evitar o decúbito dorsal ao dormir, medidas de higiene do sono, retirada de medicamentos sedativos e álcool. Doenças otorrinológicas e o refluxo gastroesofágico, quando presentes, devem ser tratados. O tratamento medicamentoso das doenças como hipotireoidismo e acromegalia é útil na redução dos eventos respiratórios obstrutivos. A reposição combinada de estrogênio e progesterona no climatério tem mostrado melhorar o quadro clínico e polissonográfico de mulheres na menopausa com SAOS. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
21 – O que é CPAP (do inglês, continuous positive airway pressure)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O CPAP nasal consiste em um método não-invasivo de aplicação de pressão positiva contínua de ar na via aérea. O aparelho gera um fluxo aéreo contínuo que, através de um tubo flexível, alcança uma máscara nasal ou nasobucal que é ajustada à face por tiras fixadoras. A pressão indiretamente gerada nessa máscara é transmitida à via aérea do paciente e cria-se no seu interior um coxim pneumático que tende a deslocar o palato mole em direção a base da língua, e a dilatar a área de secção de toda a faringe. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
22 – O CPAP (continuous positive airway pressure) deve sempre ser indicado no tratamento da síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Atualmente, o CPAP é a modalidade terapêutica de escolha para a SAOS. Ela deve sempre ser considerada, mas pacientes com SAOS moderada à grave são os mais indicados para o uso desse aparelho. Quanto mais limitado pela doença (grau de sonolência e prejuízo cognitivo), mais chance tem o paciente de usar adequadamente o CPAP. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
23 – O que impede uma pessoa de usar o CPAP (continuous positive airway pressure)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Apesar de ser um tratamento extremamente eficaz, há falhas na adesão e na aceitação em longo prazo. As principais razões da baixa adesão são:
Nessas situações medidas terapêuticas associadas são necessárias. |
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24 – Quais as indicações na síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS) de aparelhos tipo BIPAP/VPAP (bi-level positive airway pressure/ variable positive airway pressure)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Aparelhos com pressão positiva inspiratória e expiratória em dois níveis diferentes, BIPAP ou VPAP diferem do CPAP, pois permitem um ajuste independente das pressões inspiratória e expiratória. A indicação mais precisa é no caso de hipoventilação (primária, por obesidade, por doença pulmonar crônica obstrutiva ou por doenças neuromusculares), pois, a impedância mecânica no CPAP pode agravar o quadro. Também são indicados quando com o CPAP causa desconforto expiratório. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
25 – Os auto-CPAP são melhores que o CPAP (continuous positive airway pressure)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Sob a denominação de auto-CPAP encontram-se aparelhos com pressão auto-ajustável, ou seja, são elaborados para variarem a pressão positiva para mais ou para menos de acordo com a necessidade para manter a via aérea aberta. O benefício do seu uso em longo prazo em domicílio não tem sido comprovado. Apesar de manter uma pressão média menor nas vias aéreas, a redução do índice de apnéia e hipopnéia, a melhora da sonolência excessiva e a adesão do paciente ao tratamento são semelhantes às obtidas com o CPAP. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
26 – Quais as medidas para melhorar o uso do CPAP (continuous positive airway pressure)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Medidas terapêuticas para melhorar o uso de CPAP:
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27 – O que são os aparelhos intra-orais? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os aparelhos intra-orais são dispositivos usados na cavidade oral durante o sono com o objetivo de aumentar o volume da via aérea superior por uma manobra mecânica. O mecanismo de ação basicamente se dá por tração da mandíbula e/ou da língua, da manutenção da boca fechada e do aumento do volume da via aérea superior. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
28 – Quando os aparelhos intra-orais devem ser indicados? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
As principais indicações dos aparelhos intra-orais são:
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29 – Existem contra-indicações para os aparelhos intra-orais? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Suas contra-indicações principais são para pacientes com apnéias predominantemente centrais, pacientes com condições dentais inapropriadas, como, por exemplo, doença periodontal ativa e disfunção temporomandibular (DTM) com sintomas significativos. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
30 – Quais os efeitos colaterais dos aparelhos intra-orais? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Salivação excessiva, xerostomia, dor ou desconforto nos dentes de apoio, dor nos tecidos moles intrabucais, dor ou desconforto na musculatura mastigatória e nas estruturas da articulação temporomandibular (ATM) são relatos comuns nos curto e médio prazos. No longo prazo, as alterações de padrão oclusal são observadas. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
31 – Quando se deve pensar em procedimentos cirúrgicos para o tratamento da síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A cirurgia nasal é indicada nos pacientes com queixa de obstrução nasal ou com alteração anatômica acentuada (desvio de septo, hipertrofias de cornetos, hipertrofia adenoamigdaliana). Esses procedimentos podem aumentar a adesão ao CPAP, por diminuir a pressão positiva necessária para abolir os eventos respiratórios anormais. Nas crianças com SAOS, a adenoamigdalectomia tem resultados muitas vezes curativos. | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
32 – Quais as cirurgias especializadas disponíveis para síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os procedimentos cirúrgicos especializados para a SAOS no adulto compreendem basicamente aqueles que modificam os tecidos moles da orofaringe (adeno-amigdalectomia, uvulopalatofaringoplastia, glossectomias) e aqueles que abordam o esqueleto facial (hióidopexia, mandibulectomia com reposicionamento do genioglosso e avanço maxilo-mandibular). A uvulopalatofaringoplastia apresenta resultados limitados. Uvulopalotofaringoplastia, associada ao avanço do músculo genioglosso e miotomia do osso hióide, tem resultados melhores nos pacientes com quadro leve. O avanço maxilo-mandibular apresenta taxas de sucesso maiores que as demais cirurgias. Está indicada na falha ou rejeição ao CPAP, bem como nos casos de insucesso de outros procedimentos cirúrgicos em pacientes com SAOS de grau moderado ou acentuado. |
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33 – Existem remédios que tratam a síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O tratamento farmacológico específico não tem se mostrado eficaz, pois as drogas empregadas são estimulantes ventilatórios e antidepressivos que reduzem o sono REM, além de causarem efeitos adversos com a dose recomendada para tratar SAOS. Os estudos são limitados devido a avaliarem poucos pacientes, sem randomização, sem comparação com placebo e com CPAP e com curto prazo de acompanhamento. Atualmente alguns estudos com um estimulante central específico para a vigília, modafinil, têm demonstrado que esse medicamento pode ser útil como co-adjuvante ao CPAP no tratamento da sonolência diurna residual em pacientes com SAOS. |
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34 – Como tratar a criança com síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS)? | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A abordagem terapêutica na criança requer tratamento clínico para rinite, adenoamigdalectomia, controle de hábitos de sono, evitar sedativos, manter peso adequado e CPAP quando essas medidas anteriores não forem suficientes. |
1 – Qual a definição de asma? |
Asma tem sido definida, por diferentes autores, com base em suas características clínicas, fisiológicas e patológicas. Em sua atualização de 2011, o GINA (Global Initiative in Asthma) define asma como: “doença inflamatória crônica das vias aéreas em que várias células e elementos celulares participam. A inflamação crônica associa-se com hiperreatividade das vias aéreas, que determina episódios recorrentes de sibilos, dispnéia, aperto no peito e tosse, particularmente a noite ou cedo pela manhã. Estes episódios associam-se com obstrução ao fluxo aéreo difusamente nos pulmões, mas variável, reversível espontaneamente ou com medicações“. Essa mesma definição descritiva é adota pelas diretrizes da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia para o Manejo da Asma (SBPT, 2012). |
2 – Qual a prevalência da asma? |
A asma é uma doença comum e com distribuição universal entre as diferentes regiões do mundo. Estimam-se 300 milhões de pessoas acometidas pela doença. Apesar de universal, a ocorrência de asma não é uniforme, com prevalências que variam de 1% a 18% da população. Não se sabe se essas diferenças decorrem de fatores genéticos, ambientais ou de variações nos métodos de obtenção dos dados para análise estatística. A tabela 1 ilustra a variação da prevalência de asma em diferentes regiões do mundo.Existem evidências de que a prevalência da asma está aumentando em alguns países, enquanto em outros, após elevação recente, ela encontra-se estável. Especula-se que o aumento da sensibilização atópica, com aumento concomitante de rinite, seja um dos fatores responsáveis pela elevação da prevalência da asma. Verifica-se este fenômeno, por exemplo, em populações que têm mudado o estilo vida para o padrão ocidental e que têm migrado da zona rural para urbana. Em países desenvolvidos a “teoria da higiene” tem sido usada para explicar, pelo menos em parte, o aumento da prevalência da asma. Esta teoria será discutida mais adiante. |
3 – Qual a prevalência da asma no Brasil? |
O estudo mais recente sobre a prevalência de asma em adultos de 20 a 69 anos de idade, de base populacional, é o de Macedo, no RS. Utilizando diferentes definições para asma, as seguintes prevalências foram encontradas:
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4 – Qual a mortalidade da asma? |
O número de óbitos anuais relacionados a asma foi estimado em cerca de 250.000 em todo o mundo. Da mesma forma que ocorre com a prevalência, as taxas de mortalidade por asma variam entre as diferentes regiões. De forma interessante, não há, necessariamente, uma correlação direta entre as áreas de maior prevalência com as de maior mortalidade por asma.Apesar de trazer grande impacto sobre a qualidade de vida das pessoas, a asma tem letalidade relativamente baixa, conforme pode ser visto na tabela 2.Segundo dados do DATASUS, a taxa média de mortalidade no Brasil, entre 1998 e 2007, encontra-se estável, ao redor de 1,52/100.000 habitantes (variação de 0,85 a 1,72). |
Capítulo 2 – Fisiopatologia |
5 – Qual a etiologia da asma? |
Não existe uma etiologia única para asma. Sua ocorrência é resultado da interação entre fatores do hospedeiro e ambientais, os quais provocam e mantêm a inflamação brônquica e, por consequência, os sintomas da doença. Os fatores que influenciam a asma podem ser divididos em dois grupos:
A tabela 3 ilustra os principais fatores relacionados à asma. |
6 – A asma é uma doença genética? |
Não há dúvida de que a asma é uma doença de caráter hereditário, pois há nitidamente uma distribuição familiar da doença e diferenças marcantes de prevalência entre as populações. Entretanto, os genes envolvidos e suas formas de transmissão não estão estabelecidos. É provável que a genética da asma envolva genes diferentes, com diferentes interações com fatores ambientais, gerando um cenário complexo e que não será alvo de nossa discussão. Os estudos sobre a genética da asma têm tentado estabelecer relações com os seguintes fatores:
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7 – Qual a fisiopatologia da asma? |
A inflamação é o principal fator envolvido na fisiopatologia da asma. Ela está presente em toda via aérea, incluindo, na maioria dos pacientes, o trato respiratório superior e a mucosa nasal, mas seus efeitos são mais pronunciados nos brônquios de médio calibre.Um dos modelos usados para explicar a inflamação da asma é o da ativação dos mastócitos por alérgenos, ou outros agentes, como células ou citocinas. Na ativação por alérgenos, por exemplo, a exposição a eles determina a produção de IgE específica, relacionada a maior expressão da resposta Th2 em relação a Th1, que por sua vez tem determinação genética, talvez com influência ambiental. Uma vez sintetizada e secretada pelos plasmócitos, a IgE se liga a receptores específicos nos mastócitos e basófilos e, quando em contato com nova exposição ao antígeno, a ligação antígeno-anticorpo determina a degranulação dos mastócitos, liberando mediadores, tais como histamina, prostaglandina D2 e leucotrienos (LTC4, D4 e E4) que promovem broncocosntrição. Esta é a chamada fase precoce da inflamação na asma.A fase precoce pode ser sucedida por uma outra, chamada tardia, caracterizada pela chegada de eosinófilos, linfócitos T e basófilos, que também liberam mediadores que, além de broncoconstrição, promovem outras alterações que culminam em redução do calibre das vias aéreas, como edema, hiperplasia de glândulas mucosas e fibrose.Todas as alterações decorrentes da inflamação relacionam-se com alterações nas vias aéreas, as quais serão responsáveis pelas manifestações clínicas:
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8 – Como se dá a redução do calibre das vias aéreas na asma? |
A redução do calibre das vias aéreas é o principal fator responsável pelo quadro clínico da doença. Ela se dá por:
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9 – O que é a hiperreatividade brônquica? |
A hiperreatividade brônquica é o estreitamento das vias aéreas em resposta a estímulos que seriam inócuos em uma pessoa normal. Ela está diretamente relacionada com a inflamação da via aérea. |
10 – Como ocorrem as alterações estruturais dos brônquios (“remodelamento”)? |
O “remodelamento” decorre, provavelmente, de reparações de inflamações crônicas nas vias aéreas. Elas podem gerar um componente irreversível de obstrução ao fluxo aéreo, determinando formas mais graves da doença. As alterações encontradas são:
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11 – Quais são as principais células e mediadores inflamatórios envolvidos na inflamação na asma? |
As principais células envolvidas na asma são os mastócitos, os eosinófilos e os linfócitos Th2, natural killer. Outras células que podem participar de alguma forma da inflamação são as células dendríticas, os macrófagos e os neutrófilos. Mais recentemente cresce o conhecimento sobre a participação de células estruturais do parênquima pulmonar, como as células epiteliais e endoteliais, os fibroblastos e as células musculares lisas.A tabela 4 lista os principais mediadores inflamatórios envolvidos na asma, com suas origens e efeitos mais importantes. |
12 – Qual a relação entre tabagismo e asma? |
O tabagismo é um fator agravante da inflamação e da hiperreatividade brônquica, com consequente piora dos sintomas da asma. Além disso, asmáticos que fumam têm menor resposta ao tratamento da asma quando comparado com aqueles não tabagistas, sobretudo por menor resposta aos corticoides.O tabagismo passivo também pode ser considerado como fator agravante da doença, além de haver estudos apontando para uma possível associação com o desenvolvimento da asma. Estudos de meta-análise demonstraram que lactentes expostos passivamente à fumaça de tabaco apresentaram sintomas respiratórios com maior freqüência, sobretudo se a mãe era tabagista. Os que avaliaram a relação entre tabagismo passivo e asma indicaram a existência de associação entre fumo materno e aumento na incidência de sibilância, principalmente até os seis anos de idade. |
13 – O que é a teoria da higiene dentro da fisiopatologia da asma? |
Estudos epidemiológicos sugerem que exposição a infecções em fases precoces da vida leva ao desenvolvimento de um padrão imunológico menos suscetível a alergias, reduzindo a ocorrência de asma e outras atopias. |
Capítulo 3 – Quadro clínico |
14 – Quais são os principais sintomas da asma? Como eles se comportam? |
Dispneia, tosse e sibilância torácica constituem a tríade clássica de sintomas associados à asma. No entanto, não é incomum um ou mais desses sintomas estarem ausentes ou o paciente apresentar outras queixas, como, por exemplo, opressão ou desconforto torácico.Caracteristicamente, os sintomas ocorrem de forma episódica (“crises”), recorrente e são mais intensos durante a noite ou nas primeiras horas do dia. É comum a detecção de fatores precipitantes ou agravantes: infecção respiratória viral, exposição a alérgenos ambientais ou ocupacionais (polens, fungos, ácaros, pelos de animais, fibras de tecidos etc.), exposição a irritantes (fumo, poluição do ar, aerossois etc.), medicamentos (aspirina, anti-inflamatórios não hormonais, beta-bloqueadores), alterações climáticas, ar frio, alterações emocionais (riso, ansiedade), exercícios. Os sintomas costumam melhorar espontaneamente ou com o uso de medicações específicas como broncodilatadores e anti-inflamatórios hormonais (corticoide tópico ou sistêmico). Durante o período intercrise, o paciente geralmente permanece assintomático ou oligossintomático, embora nas formas graves da doença os sintomas possam ser contínuos.Os pacientes asmáticos frequentemente têm manifestações de outras atopias, sobretudo rinite alérgica, e, geralmente, têm história familiar de asma ou de outra doença atópica. |
15 – O que é tosse variante da asma? |
Em alguns pacientes a tosse é a única manifestação da asma, constituindo a tosse variante da asma. A tosse predomina no período noturno, sendo que o paciente costuma ficar assintomático durante o dia. Para o seu diagnóstico é preciso documentar a variabilidade da função pulmonar ou a hiperreatividade das vias aéreas. A tosse variante da asma deve ser diferenciada da bronquite eosinofílica, que se caracteriza por tosse, eosinofilia no escarro, mas sem alteração na função pulmonar e sem hiperreatividade brônquica. |
16 – O que é a asma induzida por exercício? |
A atividade física é um dos fatores mais comuns que podem desencadear o surgimento de sintomas no indivíduo asmático, sendo que, para alguns, principalmente crianças, é o único fator. Habitualmente, o broncoespasmo induzido pelo exercício ocorre cinco a dez minutos após a cessação da atividade física, sendo raro o surgimento dos sintomas durante a mesma. Os pacientes apresentam os sintomas típicos de asma ou, às vezes, apenas tosse. Tais sintomas geralmente desaparecem espontaneamente após cerca de 45 minutos. Atividade física que envolve corrida, realização da atividade em condições de clima seco ou frio são situações que aumentam as chances de broncoespasmo.O diagnóstico de asma desencadeada por exercícios é sugerido quando há alívio dos sintomas com o uso do beta-2 agonista de curta duração ou quando os mesmos são prevenidos pelo uso prévio de broncodilatadores. |
17 – Quais os achados de exame físico na asma? |
As alterações de exame físico na asma estão diretamente relacionadas com a obstrução ao fluxo aéreo. Assim, com a obstrução sob controle, o exame físico pode ser absolutamente normal.O principal achado de exame físico na obstrução ao fluxo aéreo são os sibilos. Conforme a gravidade da obstrução eles podem ser audíveis somente à expiração forçada, ou apenas na expiração, ou na inspiração e na expiração (níveis crescentes de gravidade). Os sibilos na asma são caracteristicamente variáveis, ou seja, iniciam e terminam em diferentes pontos do ciclo respiratório, têm tons e durações variáveis (sibilos monofásicos são mais sugestivos de obstruções fixas das vias aéreas, como tumores e aspiração de corpo estranho). Em obstruções extremas, os sibilos podem desaparecer, em conjunto com a redução do som vesicular (constituindo o “silêncio respiratório”) e com outros sinais de gravidade. Outros achados observados na ocorrência de obstrução ao fluxo aéreo são taquipneia, prolongamento do tempo expiratório e tiragens, estas presentes em formas mais graves e em pacientes com parede torácica mais complacente (ex. crianças).Pacientes com asma grave ou durante crises graves podem apresentar hiperinsuflação pulmonar, cujo exame físico pode evidenciar: redução da altura laríngea (distância entre a proeminência laríngea e a fúrcula esternal), redução da expansibilidade, hipersonoridade à percussão e redução do murmúrio vesicular. Por fim, em razão da associação frequente com as doenças atópicas, pode-se encontrar estigmas dessas patologias: rinorreia, palidez da mucosa nasal ou presença de pólipos, eczema flexural, entre outros. |
18 – O diagnóstico de asma pode ser baseado apenas nos dados clínicos? |
O diagnóstico de asma é fundamentado na história clínica, de tal forma que, se o paciente apresenta sintomas e evolução característicos (dispneia, tosse e sibilância, que ocorrem de forma episódica e recorrente e há identificação de fatores desencadeantes), o médico está autorizado a iniciar o seu tratamento. No entanto, não são todos os pacientes que cursam com essa apresentação típica; assim, nos casos em que há dúvida diagnóstica, a avaliação da função pulmonar, com identificação do distúrbio obstrutivo e sua reversibilidade, pode ser necessária. |
19 – Quais os principais diagnósticos diferenciais da asma em adultos? |
Os principais diagnósticos diferenciais de asma em adultos são:
O principal diagnóstico diferencial da asma em adultos é a DPOC, sendo, às vezes, impossível a separação entre as duas. |
20 – Como diferenciar asma de DPOC? |
Por serem duas doenças que se caracterizam por obstrução ao fluxo aéreo, asma e DPOC têm várias características clínicas e funcionais em comum, fazendo com que nem sempre seja fácil, ou mesmo possível, a distinção entre as duas. A tabela 5 lista características que auxiliam nesta diferenciação.A despeito dessas características mais sugestivas de asma ou DPOC, alguns pacientes asmáticos, sobretudo quando expostos a agentes tóxicos, particularmente a fumaça de cigarro, desenvolvem inflamação nas vias aéreas com características das duas doenças e com limitação ao fluxo aéreo não completamente reversível. |
Capítulo 4 – Exames complementares |
21 – Qual o papel da espirometria no diagnóstico da asma? |
A espirometria é o principal exame complementar no diagnóstico da asma, sendo que o padrão habitual é a presença de obstrução ao fluxo aéreo e prova broncodilatadora positiva. A obstrução ao fluxo aéreo é caracterizada pela relação VEF1/CVF menor que 70%, ou, sendo mais rigoroso, abaixo do limite inferior particular (calculado por equações baseadas em sexo, idade e altura). A reversibilidade ao broncodilatador é definida por:
Ou
Vale a pena lembrar que a espirometria pode ser normal em períodos de estabilidade da doença, com ou sem medicação. Nesses casos, deve-se proceder a prova broncodilatadora, que pode mostrar resposta positiva e reforçar o diagnóstico de asma, embora a resposta negativa não o invalide. |
22 – Quais as outras aplicações da espirometria na asma? |
Além de auxiliar no diagnóstico, a espirometria permite avaliar a gravidade da obstrução brônquica, auxiliando no acompanhamento do paciente e de sua resposta ao tratamento, em conjunto com os dados clínicos. Assim, idealmente, a espirometria deve ser realizada na avaliação inicial (objetivo diagnóstico), após a estabilização dos sintomas com o tratamento e, posteriormente, conforme a evolução clínica de cada paciente.Na crise de asma, quando disponível, a espirometria traz dados objetivos sobre a gravidade, podendo auxiliar em algumas tomadas de decisão, como, por exemplo, internar ou não o paciente. Como ela geralmente não é disponível nos serviços de urgência, tende a ser substituída pela medida do pico do fluxo expiratório. |
23 – Qual a importância do pico do fluxo expiratório na asma? |
O pico do fluxo expiratório (PFE) é o fluxo máximo de ar obtido durante uma manobra de expiração forçada. Pode ser medido durante a espirometria ou por meio de pequenos aparelhos portáteis elaborados especificamente para isso (“mini peak-flow meter”).A medida do PFE pode ser útil no diagnóstico da doença, pois asmáticos apresentam uma variação diurna exagerada do PFE. Assim, a monitoração do PFE no período de 2 a 3 semanas pode identificar uma diferença percentual média entre o PFE matinal e o noturno superior a 20%, fato bastante sugestivo de asma. Outro dado extraído da medida do PFE que é indicativo de asma é o aumento do PFE 15 minutos após o uso do beta-2 agonista de curta duração (>20% nos adultos e >30% nas crianças). No entanto, convém salientar que a medida do VEF1, obtida na espirometria, e sua resposta ao broncodilatador é um parâmetro diagnóstico de melhor acurácia do que o PFE.O PFE também é importante na monitoração dos pacientes, especialmente naqueles com maior gravidade. Em pacientes com má percepção dos sintomas, pode-se usar a redução do PFE como sinal de alerta para a busca do recurso médico ou para a implementação de um plano terapêutico.Nas crises de asma, o PFE também pode trazer dados objetivos sobre a gravidade, podendo auxiliar em algumas tomadas de decisão, como, por exemplo, internar ou não o paciente. Ele é mais amplamente disponível e fácil de ser obtido do que o VEF1; por isso, mesmo que com menor acurácia, tem substituído este parâmetro espirométrico na avaliação da crise de asma. |
24 – Qual a indicação de se realizar a radiografia de tórax na asma? |
Com exceção dos quadros mais graves, a asma por si só não provoca alterações radiográficas. Assim, a importância da radiografia na avaliação do asmático é principalmente excluir outras doenças associadas. De maneira geral, recomenda-se realizar a radiografia de tórax no início do acompanhamento do paciente asmático e nas crises mais graves da doença.Os pacientes com formas leves e moderadas da doença habitualmente apresentam radiografia de tórax normal, enquanto aqueles com doença grave podem ter sinais radiográficos de hiperinsuflação pulmonar. Nas exacerbações graves da doença, a radiografia está indicada para afastar ou identificar complicações relacionadas, como pneumotórax e pneumomediastino (figuras 1 e 2). |
25 – Quando e como realizar a pesquisa da hiperresponsividade das vias aéreas no paciente com suspeita de asma? |
Não é raro o paciente com sintomas sugestivos de asma apresentar espirometria normal e ausência de resposta ao broncodilatador durante o exame espirométrico. Tal fato ocorre em função da asma ser uma doença que caracteristicamente intercala períodos de sintomas com outros em que o paciente permanece assintomático. Assim, a espirometria pode não detectar a obstrução se for realizada em um momento de remissão dos sintomas, principalmente nos pacientes com doença mais leve.Como a asma se caracteriza por apresentar hiperresponsividade brônquica, a detecção desta resposta exagerada das vias aéreas pode sugerir o diagnóstico da doença. Assim, em indivíduos com função pulmonar normal e suspeita clínica de asma, a detecção da hiperresponsividade brônquica por meio de testes de broncoprovocação pode ser muito útil. Tais testes consistem em submeter o paciente a estímulos externos e verificar o grau de broncoconstrição desencadeada. Os exames mais realizados são:
Importante destacar que a presença de hiperresponsividade brônquica não é exclusiva do asmático; pacientes atópicos não asmáticos (ex. rinite alérgica), fumantes ou idosos podem ter teste de broncoprovocação positivo sem que sejam necessariamente asmáticos, ou seja, os testes de broncoprovocação têm alta sensibilidade para o diagnóstico de asma, porém limitada especificidade. |
26 – As medidas do estado alérgico devem ser realizadas em pacientes asmáticos? |
Embora a asma seja uma doença alérgica, os testes que avaliam atopia têm pouca contribuição para seu diagnóstico e não devem ser realizados rotineiramente. Alguns autores defendem seu emprego para o planejamento terapêutico, sobretudo em relação aos alérgenos que devem ser evitados. Os testes usados são os cutâneos e as dosagens séricas de IgE específica por teste radioalergoabsorvente (RAST). |
27 – A avaliação da inflamação das vias aéreas deve ser realizada em pacientes asmáticos? |
Como a asma é uma doença inflamatória, a identificação e o monitoramento dessa inflamação poderiam ser úteis no acompanhamento do asmático. Assim, desenvolveram-se exames não invasivos com esse objetivo, com destaque para a quantificação dos eosinófilos no escarro induzido e para a medida do óxido nítrico exalado (está elevado em asmáticos quando comparados com indivíduos saudáveis). No entanto, a aplicação dessas medidas de avaliação da inflamação na prática clínica ainda não está bem estabelecida. |
Capítulo 5 – Classificação |
28 – Como a asma pode ser classificada segundo sua gravidade? |
Durante muitos anos a asma foi classificada como intermitente ou persistente, sendo esta ainda dividida em leve, moderada ou grave, com base na frequência dos sintomas e na função pulmonar. Entretanto, esta classificação não levava em conta as medicações necessárias para manter o controle da asma, gerando distorções, como pacientes assintomáticos e com função pulmonar normal, mas necessitando de tratamento intensivo para manter este quadro (neste caso, como classificá-lo quanto à gravidade?). Em função desta dificuldade, esta classificação foi abandonada, passando a ser usada outra, com base no controle ou não da doença. |
29 – Como classificar a asma em relação ao seu controle? |
Como a classificação da gravidade da asma não contempla sua evolução com o tratamento, o próprio GINA e também a SBPT em suas diretrizes de 2012 optaram por estratificar a doença em três níveis de controle: controlada, parcialmente controlada e descontrolada. Esses níveis determinarão a necessidade de aumento da medicação ou a possibilidade de sua redução. Eles estão descritos na tabela 6. |
Capítulo 6 – Tratamento |
30 – Quais são os objetivos da asma? |
Apesar de não haver cura para a asma, pode-se obter um bom controle da doença, com excelente impacto na qualidade de vida dos pacientes e de seus familiares, além de benefícios para a sociedade como um todo.As diretrizes atuais dividem os objetivos do tratamento da asma em dois pilares:
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31 – Quais são, em linhas gerais, os componentes do tratamento da asma? |
São eles:
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32 – Qual o papel da educação em asma para o controle desta doença? |
Assim como os medicamentos, a educação é um dos pilares do tratamento da asma, que pode melhorar o controle da doença e permitir vida normal aos pacientes. A educação dos pacientes e dos familiares deve ser feita com uma linguagem clara e acessível e com conteúdo adequado ao público alvo. Neste processo, deve-se estabelecer uma boa relação entre médico, paciente e familiares, adequando-se o que eles precisam saber (julgado pelo médico) com o que eles querem saber (as necessidades dos próprios pacientes e familiares). O objetivo principal é auxiliar o paciente e seus familiares na aquisição de motivações, habilidades e confiança no manejo da asma. Todos envolvidos no processo de educação devem ter em mente que se trata de um processo contínuo, em que conhecimentos e experiências são trocados mutuamente, com ampla discussão sobre expectativas, receios e crenças de cada um. |
33 – Que pontos devem ser abordados em um programa de educação em asma? |
Os programas de educação em asma devem ser adaptados para as realidades locais, segundo as disponibilidades profissionais e físicas da instituição, levando em conta também as características da população atendida. A seguir, listamos alguns pontos recomendados pela Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia e pelo GINA para um programa de educação em asma:
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34 – O que são os planos de ação por escrito para manejo da asma? |
Alguns autores e diretrizes sugerem que o paciente deva receber um plano de ação por escrito, para que possa rapidamente ajustar o tratamento e manter a asma sob controle. Os planos devem conter orientações sobre:
As Diretrizes as SBPT para o Manejo da Asma (2012) e o GINA (2011) trazem modelos de planos de ação, que podem ser empregados ou adaptados para cada paciente. |
35 – Medidas que reduzem a exposição do paciente asmático aos gatilhos da doença são eficazes? |
A asma nitidamente piora com a exposição a uma série de fatores denominados gatilhos, que incluem alérgenos, irritantes, infecção viral, ar frio e medicamentos. A redução da exposição a alguns desses fatores comprovadamente facilita o controle da asma, com destaque para:
Em relação a outras exposições, não estão bem estabelecidos os benefícios de evitá-las:
A alergia alimentar não é um fator considerado importante na asma. A vacina anti-influenza não desencadeia crise de asma e, por seus benefícios, está indicada para os asmáticos. |
36 – Como podem ser classificados os medicamentos empregados no tratamento da asma? |
É importante que o médico e o paciente saibam reconhecer que os medicamentos da asma podem ser divididos entre os controladores da doença (tratamento de manutenção) e os para alívio dos sintomas e tratamento das crises (tratamento sintomático ou de alívio). Alguns medicamentos encaixam-se nas duas classes, conforme ilustrado na tabela 7. |
37 – Por que utilizar preferencialmente a via inalatória para a administração das medicações no tratamento da asma? |
A maior vantagem da utilização da via inalatória no tratamento da asma é a possibilidade de se obter maior efeito terapêutico com menos efeitos sistêmicos. Isso ocorre em função da droga atuar diretamente sobre a mucosa respiratória, permitindo a utilização de dosagens relativamente pequenas (30 vezes menores do que as por via oral) e, por consequência, com baixas concentrações séricas. Além disso, a via inalatória permite um início de ação muito mais rápido do que quando se emprega a via sistêmica. |
38 – Quais são os critérios para a escolha do dispositivo inalatório no tratamento da asma? |
Os dispositivos empregados para a administração de medicações por via inalatória dividem-se basicamente em três grupos:
A escolha do dispositivo mais adequado depende de vários aspectos e deve ser individualizada. A preferência pessoal do paciente deve ser levada em consideração, bem como a sua capacidade de utilizar corretamente o dispositivo. Certos pacientes têm dificuldade em utilizar os aerossois dosimetrados, inclusive quando acoplados a espaçadores, pois os mesmos exigem coordenação para o seu uso correto. Nesses casos os inaladores de pó parecem ser mais indicados. Pacientes com deficiências motoras ou visuais, idosos debilitados ou com alterações cognitivas podem ter dificuldade de usar tais medicações. É importante escolher o dispositivo que melhor se adapte ao caso, sendo os nebulizadores de jato uma opção. Sempre que possível, deve-se usar apenas um tipo de dispositivo para facilitar o aprendizado da técnica e melhorar a adesão ao tratamento. Maiores detalhes sobre o assunto estão disponíveis no tema “Como administrar drogas pela via inalatória”. |
39 – Como iniciar o tratamento medicamentoso da asma? |
Habitualmente o tratamento de manutenção da asma deve ser iniciado com a associação de um corticoide inalatório em baixas doses com um beta-2 agonista de longa duração. Outras opções em relação a esta, mas de menor eficácia, são: 1. corticoide inalatório em doses moderadas ou altas, 2. associação de um corticoide inalatório em baixas doses com xantina de ação prolongada. Em todas essas alternativas, o paciente deve ser orientado a usar beta-2 agonista de curta ação para alívio de sintomas, conforme a necessidade. Em pacientes que estão menos sintomáticos, o início pode ser feito apenas com corticoide inalatório em baixas doses, ou, como alternativa, embora menos eficaz, com um antileucotrieno. Aqui também o beta-2 agonista de curta ação deve ser prescrito como medicação de resgate.Quando o primeiro atendimento do paciente asmático é feito em uma situação de crise, além do início do tratamento com corticoide inalatório em baixas doses com um beta-2 agonista de longa duração, ele deverá receber um curso de corticoide sistêmico, habitualmente prednisona (40 mg/dia) por 7 dias. |
40 – Como ajustar o tratamento da asma com base no controle ou não da doença? |
Uma vez iniciado o tratamento, o paciente asmático deve ser avaliado em relação ao nível de controle da doença (controlada, parcialmente controlada ou descontrolada), conforme já discutido anteriormente. Se a doença está sob controle, o tratamento deve ser mantido, até que, após 3 meses assim, ele deve ser reduzido para um nível abaixo. Por outro lado, se a asma está descontrolada, eleva-se o nível de tratamento, progressivamente, até se obter o controle. Em pacientes apenas parcialmente controlados, também se deve cogitar aumentar o tratamento.A figura 3 ilustra os diferentes níveis de tratamento. Para todos os níveis estão indicados educação, controle ambiental e beta-2 agonista de curta ação de resgate. Em relação a esta medicação, ela pode ser substituída pela associação budesonida+formoterol em pacientes que já estão recebendo-a regularmente como tratamento de controle. |
41 – Como devem ser feitos os ajustes do tratamento da asma para níveis mais baixos (redução das medicações)? |
Em primeiro lugar, deve-se ressaltar que reduções no tratamento de controle da asma são feitas apenas após 3 meses de estabilidade da doença. Quando o paciente encontra-se em uso de corticóide inalatório (CI) em doses moderadas ou altas, elas devem ser reduzidas em 50% e, então, mantidas por 3 meses para reavaliação. Após 3 meses de estabilidade com CI em doses baixas, o tratamento pode ser reduzido para 1 vez ao dia. A retirada desta dose mínima de medicação de controle deve ser feita após o paciente permanecer 1 ano sob controle.Quando o paciente encontra-se uso da associação de corticoide inalado com beta-2 agonista de ação prolongada (CI+LABA), prefere-se reduzir progressivamente a dose de CI, até seus níveis baixos, para só aí retirar o LABA. Uma alternativa aceita é a administração da associação uma vez ao dia. Outra opção consiste em retirar o LABA e depois reduzir progressivamente a dose do CI. Cada etapa deve ser precedida de 3 meses de manutenção da asma sob controle.Quando o controle é obtido com a associação de CI e antileucotrieno ou teofilina, deve-se reduzir a dose do corticoide em 50%, até que a dose baixa seja alcançada, para depois retirar a outra medicação de controle. Aqui também cada etapa deve ser precedida de 3 meses de manutenção da asma sob controle.A última etapa de redução da medicação, ou seja, a retirada do CI em doses baixas, só deve ser tentada após 1 ano de controle da asma. Mesmo assim o paciente deve ser mantido sob avaliação periódica e frequentemente o tratamento precisa ser reinstituído. |
42 – Como devem ser feitos os ajustes do tratamento da asma para níveis mais altos (aumento das medicações)? |
A falha em se obter o controle da asma deve fazer com que o tratamento seja aumentado para a próxima etapa. Quando o paciente entra em crise, opta-se pelo uso de corticoide oral (entre 40 e 60 mg/dia de prednisona ou prednisolona), por um período de 7 a 14 dias. Alguns estudos sugerem que quadruplicar a dose do corticoide inalatório pode trazer os mesmos resultados. Se a exacerbação se deu de forma aguda, pode-se, ao final dela, retornar para o mesmo nível de tratamento de manutenção. Mas, por outro lado, se ela ocorreu num contexto já de piora do controle da asma ou vem se repetindo, deve-se elevar o nível de tratamento de manutenção.Uma estratégia que vem ganhando força no tratamento da asma consiste em se usar a associação budesonida-formoterol como medicação de controle e de alívio de sintomas. Assim, a partir de uma dose basal desta associação, o paciente pode usar doses extras, conforme a necessidade. Acredita-se que, assim, tão rápido o paciente perceba piora do controle da asma, ele aumenta a dose de corticóide, impedindo que uma exacerbação mais intensa se instale. |
43 – Quais são doses dos diferentes corticóides inalatórios consideradas baixas, médias e altas? |
A tabela 8 ilustra a equivalência de doses dos diferentes corticóides inalatórios disponíveis, separando-as em baixas, médias e altas, em relação ao uso em adultos. |
44 – Quais são os efeitos colaterais dos corticóides inalatórios (CI) em adultos? |
Os CI podem determinar efeitos colaterais locais, como candidíase oral, rouquidão e, eventualmente, tosse por irritação das vias aéreas superiores. A ocorrência desses efeitos parece diminuir com o hábito de lavar a boca após a aplicação, com o uso de espaçadores (no caso dos aerossois dosimetrados) e com o uso de pró-drogas (ex. ciclesonida).Uma fração do CI inalado é absorvida e, assim, pode determinar efeitos adversos sistêmicos, os quais, entretanto, não são tão frequentes ou intensos, determinando uma relação risco-benefício amplamente favorável para o tratamento. Os possíveis efeitos colaterais em adultos, para os quais se deve estar atento são:
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45 – Quais são os efeitos colaterais dos beta-2 agonistas de ação prolongada (LABA)? |
Os LABA, sobretudo quando usados por via inalatória, são muito bem tolerados. Os principais efeitos colaterais descritos com esta classe de medicação são: taquicardia, tremor e hipopotassemia. Especula-se que o uso repetido do LABA pode levar a refratariedade dos receptores. Alguns estudos associaram o uso isolado de LABA, sem corticoide inalatório (especificamente o salmeterol), a maior risco de óbito. Assim, não se pode usar o LABA como tratamento isolado de controle da asma. |
46 – Quais são os efeitos colaterais dos antileucotrienos? |
Os antileucotrienos são muito bem tolerados. Toxicidade hepática foi descrita com o zileuton, justificando a monitoração das enzimas no caso de uso prolongado deste medicamento. Existem descrições de associação entre uso de antileucotrieno e surgimento de Churg-Strauss. Trata-se de um evento raro e, por muitos, atribuídos à redução ou suspensão do corticóide após a introdução do antileucotrieno, o que levaria à manifestação da doença previamente existente. Entretanto, não se pode afastar uma possível relação de causa-efeito entre a medicação e a doença. |
47 – Quais são os efeitos colaterais das xantinas? |
As xantinas associam-se a um grande número de efeitos colaterais, tais como: náuseas, vômitos, diarreia, tremor, cefaleia, irritabilidade, insônia, convulsões, encefalopatia tóxica, arritmias cardíacas. |
48 – Quais são as principais interações medicamentosas das xantinas e quais são as condições clínicas que interferem em seus níveis séricos? |
Uma das grandes dificuldades do uso das xantinas é que tanto seus efeitos clínicos quanto os eventos adversos correlacionam-se com os níveis séricos, que, por sua vez, sofrem influência de variados fatores, como co-morbidades, dieta, tabagismo e uma série de medicamentos. A tabela 9 lista os principais medicamentos e condições clínicas que interferem com os níveis séricos das xantinas. |
49 – Qual o papel dos inibidores de IgE no tratamento da asma? |
O único agente anti-IgE disponível atualmente é o omalizumabe, um anticorpo monoclonal humanizado. O seu uso está recomendado para pacientes maiores de 6 anos (acima de 12 anos em alguns países), com asma persistente grave, não controlada com uso adequado de corticóide inalado em doses altas associado a beta-2 agonista de ação prolongada por pelo menos 90 dias, e que tenham asma alérgica caracterizada clinicamente, ou por teste cutâneo ou pesquisa de IgE específica, e que apresentem nível sérico de IgE total entre 30 e 700 UI/ml. Maiores informações sobre o tratamento da asma com anti-IgE estão disponíveis no capítulo de asma de difícil controle. |
50 – Qual o papel da imunoterapia no tratamento da asma? |
A imunoterapia consiste em administrar repetidamente (geralmente por via subcutânea) extratos de alérgenos específicos com o objetivo de induzir no paciente proteção contra os sintomas alérgicos desencadeados pelos mesmos. O seu maior benefício tem sido demonstrado no tratamento da rinite alérgica, sendo bem mais limitado na asma.Em relação à asma, revisão recente da literatura realizada pelo grupo Cochrane demonstrou algum benefício da imunoterapia, precisando, para isso, estabelecer um único alérgeno clinicamente relevante a ser dessensibilizado.Em função dos efeitos limitados da imunoterapia em comparação com o tratamento medicamentoso, eles devem ser pesados em relação aos possíveis eventos adversos e ao incômodo de um tratamento prolongado com injeções. Os efeitos colaterais podem ser locais, como dor ou reação alérgica no local da punção, ou sistêmicos, como a anafilaxia (evento raro). |
1 – Qual a definição de crise de asma? |
Crise de asma, também conhecida como exacerbação da asma ou asma aguda, refere-se ao aumento progressivo de dispneia, sibilância, tosse ou aperto no peito, ou de qualquer combinação desses sintomas. Funcionalmente a crise de asma pode ser caracterizada por reduções do pico de fluxo expiratório (PFE, ou “peak flow”) e do volume expiratório forçado do primeiro segundo VEF1. |
2 – Quais são os principais fatores desencadeantes das crises de asma? |
São eles:
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3 – O paciente pode ter o tratamento da crise de asma iniciado no domicílio? |
Sim, o início do tratamento da crise no domicílio é até recomendado, pois evita atraso e reduz o risco de intensificação da gravidade, além de criar comprometimento do paciente e seus familiares com o controle da doença. A orientação sobre o tipo de crise que pode ser tratada em casa, ou seja, até que nível de intensidade, deve ser estabelecida com o médico e o paciente (ou familiar), considerando-se o nível de entendimento da doença, os recursos disponíveis e a facilidade de acesso ao sistema de saúde. Idealmente estas orientações devem fazer parte de um plano escrito de manejo da asma fornecido pelo médico ao paciente ou familiar, que deve conter, em relação às crises:
Pacientes com fatores de risco para má evolução das crises, os quais serão discutidos adiante, devem procurar rapidamente atendimento médico e, portanto, não conduzirem o tratamento em casa. |
4 – Como deve ser o tratamento da crise de asma no domicílio? |
Ao surgimento de sintomas de asma ou redução do pico de fluxo expiratório (PFE) em mais de 20% do seu melhor valor, o paciente deverá usar sua medicação de resgate, que pode ser um beta-2 agonista de curta ação (4-6 jatos de 100 mcg ou nebulização com 2,5 mg) ou a própria associação budesonida-formoterol (6/200 ou 12/400 mcg), caso esta seja a medicação de manutenção. Essas doses podem ser repetidas por mais duas vezes, a cada 20 minutos, caso não haja melhora inicial. A continuação do tratamento dependerá da resposta a esta medida.Boa resposta Os sintomas melhoram e o PFE encontra-se acima de 80% do melhor valor do paciente. Pode-se repetir o beta-2 agonista de curta ação a cada 4 horas por 24-48 horas. O médico assistente deve ser informado sobre o ocorrido para eventuais ajustes no tratamento: aumento do tratamento de manutenção, eventualmente um curto curso de corticoide oral. Deve-se atentar para a presença de algum fator desencadeante, afastando-o se possível.Resposta parcial Apesar de haver melhora dos sintomas, ela é parcial e o PFE encontra-se entre 50% e 79% do melhor valor do paciente. Deve-se manter o beta-2 agonista de curta ação e iniciar corticoide oral (40 mg/dia de prednisona). O médico deve ser contatado com urgência para ser informado sobre o caso e dar as orientações cabíveis.Má resposta Não há melhora ou há até piora dos sintomas e o PFE encontra-se abaixo de 50% do melhor valor do paciente. Deve-se procurar um atendimento de urgência para tratamento da crise; até que isso ocorra, pode-se repetir o beta-2 agonista de curta ação e usar corticoide oral (prednisona 40 mg). |
5 – Quais são os pacientes com maior risco de crise grave de asma e, consequentemente, de óbito pela doença? |
Alguns pacientes têm maior risco de apresentarem crises graves de asma e devem ser orientados a procurarem rapidamente atendimento médico na vigência de sintomas de crise. São os que apresentam uma ou mais das seguintes características:
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6 – Que parâmetros são usados para determinar a gravidade da crise de asma? |
Os parâmetros usados para determinar a gravidade da crise de asma são:
A partir destes parâmetros, a crise de asma pode ser classificada em leve, moderada ou grave, conforme discutido a seguir. |
7 – Como é classificada a gravidade da crise de asma? |
Tabela 1. |
8 – A radiografia de tórax deve ser sempre realizada na crise de asma? |
Não, pois ela é frequentemente normal ou mostra apenas sinais de hiperinsuflação. Ela deve ser solicitada nas seguintes situações:
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9 – Que outros exames complementares podem ser úteis na crise de asma? |
Na maioria das vezes, exames complementares são desnecessários, mas em algumas condições particulares eles podem trazer alguma ajuda:
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10 – Qual é a base do tratamento medicamentoso da crise de asma? |
O tratamento medicamentoso da crise de asma baseia-se na administração de duas classes de medicamentos:
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11 – Quais são os broncodilatadores disponíveis para o tratamento da crise de asma? |
Os broncodilatadores de escolha para o tratamento da crise de asma são os beta-2 agonistas de curta ação administrados por via inalatória, sob a forma de nebulização ou aerossol dosimetrado com espaçador (nebulímetro ou “bombinha”). Não há evidências que mostrem superioridade da administração desses medicamentos por via endovenosa ou subcutânea, em comparação com a inalatória. Na condução domiciliar das crises, pacientes que já estejam em uso de formoterol como medicação e manutenção podem usá-lo como medicação de alívio dos sintomas, inclusive em associação com a budesonida, visto que ele tem rápido início de ação.O brometo de ipratrópio tem menor potência broncodilatadora na crise de asma, mas como tem mecanismo de ação diferente e pode gerar efeito adicional aos beta-2 agonistas, ele pode ser adicionado ao tratamento, sobretudo nas crises mais graves e naquelas que não responderam ao tratamento inicial. As xantinas e o sulfato de magnésio, outras medicações broncodilatadoras, não devem ser rotineiramente empregadas no tratamento da crise de asma, mas apenas em situações especiais.As particularidades de cada uma dessas classes de broncodilatadores serão discutidas separadamente mais adiante. |
12 – Como devem ser empregados os beta-2 agonistas no tratamento da crise de asma? |
Os beta-2 agonistas de curta ação são a primeira opção de tratamento broncodilatador da crise de asma. Podem ser administrados tanto sob a forma de nebulização quanto por aerossol dosimetrado (nebulímetro ou “bombinha”) com resultados equivalentes. Na primeira hora de tratamento as doses recomendadas devem ser repetidas a cada 15-20 minutos. Posteriormente, os intervalos serão ditados pela evolução do paciente em relação à melhora dos sintomas e ao surgimento de efeitos colaterais (taquicardia superior a 140 bpm, tremores grosseiros, extra-sístoles freqüentes), podendo variar de 1 a 6 horas. A Tabela 2 ilustra as posologias dos beta-2 agonistas de curta duração.Se por algum motivo a via inalatória não puder ser utilizada, a terbutalina e a epinefrina podem ser administradas por via subcutânea, embora, como já dito, sem vantagens e com maior potencial de efeitos colaterais. As posologias são:
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13 – Quando e como usar o brometo de ipratrópio no tratamento da crise de asma? |
O brometo de ipratrópio tem menor potência broncodilatadora do que os beta-2 agonistas de curta ação, mas como tem mecanismo de ação diferente e é uma medicação muito segura, pode ser usado em associação a estes medicamentos. O brometo de ipratrópio deve ser associado ao beta-2 agonista de curta ação já no início do tratamento das crises moderadas e graves ou nos casos em que não há boa resposta às primeiras nebulizações.As doses recomendadas de brometo de ipratrópio na crise de asma são:
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14 – Qual o papel dos corticoides sistêmicos no tratamento da crise de asma? |
Os corticoides são fundamentais no tratamento da asma e devem ser administrados a praticamente todos os pacientes com crise de asma no pronto socorro, associando-se a melhora mais rápida na obstrução ao fluxo aéreo e redução na necessidade de internação. Aqueles com crises leves, que respondem prontamente à administração de beta-2 agonistas, podem não receber corticoide sistêmico no atendimento de urgência, mas eles deverão ser prescritos para uso domiciliar durante um período mínimo de 7 dias. Essa conduta é fundamental para se reduzir as taxas de recaída e de necessidade de retorno aos serviços de urgência.Os corticoides podem ser administrados por via oral ou endovenosa, sem diferenças em relação à eficácia. Em 1988, em artigo publicado no JAMA, Ratto e colaboradores compararam o uso de metilprednisolona por via oral (160 ou 320 mg/dia) ou por via endovenosa (500 ou 1000 mg/dia), em 75 pacientes internados com crise de asma. Não houve diferenças significativas em relação à evolução do VEF1 ao longo dos dias, em relação à duração da internação ou à ocorrência de efeitos adversos. Outros artigos já foram publicados com resultados semelhantes, mas a maior parte deles avaliando apenas crianças. Em pacientes com vômitos, com distúrbios de absorção gastrintestinal ou que já vão receber outras medicações endovenosas, a via endovenosa é preferível.Ainda há controvérsias sobre a dose de corticosteroide necessária para o tratamento da crise de asma. Doses muito elevadas, como 125 mg de metilprednisolona a cada 6 horas, já foram recomendadas, mas parecem não serem necessárias. As principais diretrizes de manejo da asma sugerem as seguintes doses:
As doses listadas são doses médias, recomendadas de uma maneira geral. Em casos individualizados, com pacientes mais graves, doses mais altas podem ser tentadas. |
15 – Quais são as opções medicamentosas não convencionais para o tratamento da crise de asma? |
São elas:
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16 – Qual o papel das xantinas no tratamento da crise de asma? |
As xantinas não são indicadas no tratamento, pelo menos inicial, da crise de asma, pois vários estudos já demonstraram que sua adição não traz benefícios significativos, além de aumentar o risco de efeitos colaterais. Em 1994, Rodrigo e Rodrigo avaliaram a adição da aminofilina ao tratamento de crises de asma moderadas ou graves com salbutamol e hidrocortisona. A administração de aminofilina, em relação ao placebo, não promoveu melhor resolução da obstrução brônquica, não reduziu as taxas de internação e nem a duração do tratamento no pronto atendimento. Esses resultados foram mantidos mesmo quando foram analisados apenas os pacientes mais graves.Uma metanálise conduzida por Parameswaren em 2003 avaliou 15 estudos que compararam a adição de aminofilina ou placebo ao tratamento da crise de asma em adultos. Observou-se que não há benefícios da adição da aminofilina, independente da gravidade da crise, ao mesmo tempo em que houve maior ocorrência de vômitos e de arritmias cardíacas. Em função das evidências da literatura, constitui-se erro grave priorizar a aminofilina no tratamento da crise de asma.Em casos individualizados, em geral em pacientes que não estão respondendo satisfatoriamente ao tratamento e estão evoluindo para insuficiência respiratória aguda, apesar do tratamento correto e intensivo com beta-2 agonistas, brometo de ipratrópio e corticoide sistêmico, a aminofilina pode ser tentada. As doses recomendadas são:
Idealmente os níveis séricos da aminofilina devem ser monitorados e mantidos entre 10-15 mcg/ml, sendo que níveis acima de 20 mcg/ml são tóxicos. A medida deve ser feita após 6 horas do início da infusão da dose de manutenção. Os principais efeitos adversos que a administração aguda de xantinas pode provocar são: náuseas, vômitos, diarreia, cefaleia, irritabilidade, insônia, convulsões, encefalopatia tóxica e arritmias cardíacas. |
17 – Qual o papel do sulfato de magnésio no tratamento da crise de asma? |
Vários estudos têm sido publicados nas últimas décadas avaliando os efeitos do sulfato de magnésio no tratamento da crise de asma. Uma revisão sistemática da literatura produzida pelo grupo Cochrane (atualizada em 2011) reuniu os estudos clínicos, prospectivos, controlados e randômicos publicados até então (7 estudo com um total de 665 pacientes) e observou que o sulfato de magnésio venoso não adiciona benefícios em relação ao tratamento convencional da crise de asma, quando todos os pacientes são avaliados. Entretanto, entre os pacientes com crise grave, ele determina melhora mais intensa no VEF1 e no pico de fluxo expiratório e reduz a necessidade de internação. Ao mesmo tempo esta medicação não aumenta a ocorrência de eventos adversos.Atualmente, recomenda-se a administração de sulfato de magnésio (dose única de 2 g, intravenoso) para os pacientes que chegam ao PS com crise grave ou que não melhoram após 1 hora com o tratamento convencional. |
18 – O sulfato de magnésio pode ser administrado por via inalatória no tratamento da crise de asma? |
Alguns poucos estudos compararam a administração de beta-2 agonista por nebulização com diluição do medicamento em sulfato de magnésio ou solução fisiológica. A adição do sulfato de magnésio ao tratamento associou a melhora na função pulmonar, mas de relevância clínica discutível e sem impacto sobre desfechos mais importantes, como a necessidade de internação. Desta forma, embora possível, a nebulização com beta-2 agonista mais sulfato de magnésio, em comparação com beta-2 agonista isolado, não é recomendada de forma rotineira para o tratamento da asma. Como discutido anteriormente, optando-se por esta medicação broncodilatadora, o que já é feito apenas em situações especiais, ela deve ser administrada por via venosa. |
19 – Qual o papel dos corticoides inalatórios no tratamento da crise de asma? |
Embora altas doses de corticoide inalatório possam ser usadas no tratamento da crise de asma na emergência, não há evidências suficientes para que esta conduta seja recomendada rotineiramente, nem em substituição ao corticoide sistêmico, nem em associação com o mesmo.Rodrigo e colaboradores demonstraram, em 1998, que o uso do corticoide inalatório (flunisolida) na crise de asma, associado ao salbutamol, foi significativamente melhor do que o uso isolado do broncodilatador, com resposta clínica mais intensa, menores taxas de internação e efeitos colaterais mínimos. As doses de corticoide inalatório (CI) não foram as habitualmente empregadas no controle da asma. No tratamento da crise, as doses utilizadas de flunisolida foram de 6 mg/h, durante um período de protocolo de três horas. O resultado obtido foi atribuído ao efeito direto do CI, provocando vasoconstrição e, consequentemente, diminuindo a depuração dos beta-2 agonistas, o que permitiria um efeito broncodilatador mais eficaz e mais precoce do que o verificado com o corticoide sistêmico. O mesmo autor comparou fluticasona (3 mg/h) por três horas, com hidrocortisona (500 mg por via endovenosa) em 106 pacientes com crise de asma aguda, mostrando resposta broncodilatadora mais eficaz, menos recidivas e menos efeitos colaterais com o corticoide inalatório. Esses resultados foram mais expressivos naqueles pacientes que apresentavam VEF1 (volume expiratório forçado no primeiro segundo) menor do que 1 L.Apesar desses resultados, ainda não se recomenda de forma rotineira a utilização dos corticoides inalatórios no tratamento da crise de asma, aguardando-se mais estudos que esclareçam o real papel destes medicamentos. |
20 – O que é e qual o papel do heliox no tratamento da crise de asma? |
Como o próprio nome diz trata-se de uma mistura de hélio e oxigênio, portanto diferente da mistura normal de nitrogênio e oxigênio. Como o hélio tem menor densidade, esta mistura gera menor resistência à passagem de ar pelas vias aéreas obstruídas, determinando menor trabalho respiratório. Apesar dos benefícios teóricos, os resultados até hoje obtidos são heterogêneos e não permitem recomendar o uso rotineiro desta estratégia de tratamento. Em centros com experiência no método, ele pode ser empregado em casos selecionados, em pacientes que não estão respondendo ao tratamento convencional, com o objetivo de reduzir o risco de intubação traqueal. |
21 – Como pode ser resumida a abordagem da crise de asma no atendimento de urgência? |
A figura 3 resume de forma esquemática a abordagem da crise de asma no atendimento de urgência. Os detalhes sobre critérios de gravidade, de melhora ou piora clínica e sobre as medicações já foram abordados em perguntas específicas.Figura 3. |
22 – Que medidas eventualmente implementadas não são recomendadas no tratamento da crise de asma? |
Não se recomenda no tratamento da crise de asma:
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23 – Que critérios devem ser observados para se liberar um paciente atendido no pronto-socorro com crise de asma? |
Embora as diferentes diretrizes sobre asma valorizem o pico de fluxo expiratório (PFE) como critério objetivo para liberação ou internação de pacientes atendidos em crise, seu emprego nos atendimentos de urgência não vem sendo comum. Acreditamos que a combinação do PFE com a avaliação clínica seja a melhor estratégia para esta tomada de decisão. Assim temos:
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24 – Qual deve ser o tratamento medicamentoso do paciente que é liberado após tratamento de crise de asma? |
O paciente que é liberado após atendimento de emergência por crise de asma deve usar corticoide oral (prednisona 40 mg/dia ou equivalente) por pelo menos 7 dias. O corticoide inalatório deve ser retomado ou iniciado nos casos em que não vinha sendo usado. Exceto quando se identifica um fator específico para a crise e o mesmo será removido, deve-se aumentar o tratamento de manutenção que vinha em curso, ou com aumento do corticoide inalatório ou com início de beta-2 agonista de ação prolongada. Estes ajustes estão detalhados no capítulo sobre tratamento de manutenção da asma. O paciente deve ser orientado ainda a usar, para alívio de sintomas, um beta-2 agonista de curta ação ou a associação budesonida-formoterol. |
25 – Que orientações deve receber o paciente liberado do pronto-socorro após atendimento por crise de asma? |
Todo atendimento médico em pacientes com doença crônica deve ser encarado como uma oportunidade de educação do paciente e/ou familiares sobre a mesma. Em atendimento de urgência isso se torna particularmente importante, pois ele normalmente indica que a doença não está controlada e, portanto, que ajustes são necessários.Algumas das orientações pertinentes neste momento são:
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26 – Quais as indicações de internação do paciente em crise de asma em UTI? |
As principais indicações são:
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27 – A ventilação não-invasiva (VNI) pode ser empregada na crise de asma? |
Ao contrário do que ocorre em relação à exacerbação da DPOC, a VNI não tem sido muito estudada na crise de asma. A maioria dos estudos incluem séries de casos que mostram reduções de dispneia e taquipneia e melhora gasométrica, mas sem grupo controle e sem avaliação de desfechos mais importantes, como necessidade de intubação, duração da internação e mortalidade. Ela pode ser aplicada na crise de asma, desde que reconhecidas as limitações, por equipe experiente e com intensa monitoração do paciente. Em crises mais graves, o paciente deve ser preferencialmente intubado. Maiores detalhes podem ser obtidos em perguntas específicas no tema ventilação não-invasiva. |
28 – Quando intubar um paciente em crise de asma? |
O III Consenso Brasileiro de Ventilação Mecânica propõe as seguintes indicações de intubação traqueal na crise de asma:
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29 – Como deve ser ajustada a ventilação mecânica na crise de asma? |
A ventilação mecânica na asma deve visar a redução da hiperinsuflação pulmonar, o que pode ser obtido com redução de volume corrente e prolongamento do tempo expiratório. Os principais parâmetros a serem ajustados são:
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30 – Como deve ser feita a monitoração da ventilação mecânica na crise de asma? |
Os principais parâmetros de mecânica pulmonar a serem monitorados são:
Do ponto de vista gasométrico a oxigenação deve ser mantida em níveis adequados (PaO2 acima de 60 mmHg e SaO2ao redor de 95%), o que habitualmente é fácil de se obter, mesmo com baixas FIO2. Como os parâmetros ajustados frequentemente determinam hipoventilação, é comum o surgimento de hipercapnia, a qual pode ser tolerada até níveis de PaCO2 de 80-90 mmHg e de pH de 7,20, estratégia denominada de hipercapnia permissiva. |
31 – As crises de asma são frequentes da gestação? |
Trabalhos recentes mostram que o número de asmáticas entre as mulheres grávidas aumentou nas últimas décadas, assim como os atendimentos por crises. Schatz e colaboradores, por exemplo, acompanharam prospectivamente 1.739 gestantes que apresentavam diagnóstico prévio de asma e identificaram que aproximadamente 20% delas apresentaram exacerbação com necessidade de algum tipo de intervenção médica para seu tratamento. A gravidade da asma parece ser o principal fator de risco para a ocorrência de agudizações durante a gravidez. No estudo de Schatz, a frequência das exacerbações variou de acordo com a classificação da gravidade da asma: asma leve (12,6%), asma moderada (25,7%) e asma grave (51,9%). A ausência de tratamento apropriado, ou seja, o não emprego de corticoide inalatório também foi identificado como fator que contribui para a ocorrência de agudizações.Embora as crises possam surgir em qualquer momento da gestação, estudos mostram que a maioria ocorre entre 17 e 24 semanas, não sendo comum o desenvolvimento de crises asmáticas durante o trabalho de parto. Há dados que indicam que é relativamente frequente a melhora da asma durante o último trimestre da gravidez. |
32 – Como deve ser o tratamento da crise de asma na gravidez? |
Há uma série de receios que envolvem o tratamento da asma durante a gestação, sendo o principal deles o emprego dos corticóides. Trabalho desenvolvido nos EUA revelou que as chances das gestantes asmáticas atendidas em serviço de emergência por exacerbação receberem prescrição de corticóide oral no momento da alta eram estatisticamente menores do que as das não gestantes. O mesmo estudo demonstrou que as asmáticas grávidas apresentavam três vezes mais chances de recaídas após a alta, quando comparadas com as não gestantes. Tais dados servem para enfatizar o fato de que é frequente o subtratamento das asmáticas na gravidez, incluindo durante as exacerbações da doença. É importante destacar que uma crise asmática grave representa riscos maiores para o feto do que o uso das medicações para a asma, reforçando a necessidade de que o tratamento durante as exacerbações seja otimizado.O NAEPP (National Asthma Education and Prevention Program) e o Consenso Britânico em Asma, em suas recomendações, deixam clara a importância de se tratar adequadamente a crise de asma na gravidez e chamam a atenção para o fato de que isso nem sempre acontece, geralmente por receio infundado de efeitos colaterais sobre o feto.As medicações empregadas no tratamento da crise de asma são seguras em todas as fases da gestação, fazendo com que ele seja o mesmo recomendado nas demais situações, ou seja:
Sulfato de magnésio, corticoide inalatório e xantinas podem ser usados na gestação e suas indicações seguem as mesmas ressalvas já comentadas em relação aos demais pacientes. |
1 – Qual a definição de controle da asma? |
O foco principal das atuais diretrizes da GINA e da SBPT é o controle da asma. Assim, as diretrizes ressaltam que o objetivo do tratamento da asma é atingir e manter o adequado controle de todas as manifestações clínicas da doença por meio de estratégias terapêuticas adequadas. Neste sentido, as diretrizes reconhecem como essencial que o início do tratamento em pacientes com sintomas persistentes tenham como base o nível atual de controle da asma (asma controlada, parcialmente controlada ou não controlada) (Quadro 1). |
2 – Qual a definição de asma de difícil controle? |
Asma insuficientemente controlada apesar de uma estratégia terapêutica apropriada e ajustada ao nível de gravidade clínica (> Nível 4, GINA) indicada por especialista e ao menos durante 6 meses. (Quadro 2) |
3 – Por que dividir a asma em fenótipos? |
Estima-se que 300 milhões de pessoas sejam portadoras do que se convencionou chamar de asma. Por definição, estes indivíduos são caracterizados por hiper-reatividade brônquica, inflamação de vias aéreas e obstrução brônquica reversível, espontaneamente ou ao tratamento. Classificar a asma sempre foi difícil e esta dificuldade é inerente ao fato de que sob esta designação distribuem-se pacientes com diferentes predisposições, patologias, fatores desencadeantes, gravidade e respostas ao tratamento. Este pano de fundo provocou, particularmente na última década, a procura da resposta às questões: será a asma uma doença única ou várias doenças que podem ser separadas entre si? Neste contexto, múltiplas publicações originais e artigos de revisão referem-se, nos últimos anos, a fenótipos de asma. Entendendo “fenótipos” como “as características visíveis de organismos resultante da interação entre o seu padrão genético e o ambiente”, a expectativa é de que esta estratégia permita definir grupos de pacientes com mecanismos de doença particulares, cujas características sejam responsivas a tratamentos específicos. |
4 – Como caracterizar a asma de acordo com a idade de início de sintomas? |
Asma na infância Têm sido descritos quatro comportamentos distintos nesta faixa etária. Uma parcela considerável das crianças chia precocemente. A maioria deixa de manifestar sintomas aos três anos de idade (“chiadores” transitórios); outras continuam a apresentar episódios de broncoespasmo após esta idade, desencadeados geralmente por infecções virais. Nos outros dois grupos encontram-se as crianças com manifestações duradouras, em que se incluem os casos de difícil controle. Os “chiadores” persistentes correspondem àqueles com início precoce, que mantêm sintomatologia persistente após os seis anos; enquanto o grupo de asma de início tardio na infância compreende pacientes com início de sintomas durante ou após a puberdade. As crianças com asma persistente tendem a ser do sexo feminino, mais atópicas, de pais asmáticos, costumam apresentar eczema, maior grau de hiper-reatividade brônquica e tendência à redução da função pulmonar. Recentemente foi sugerido que redução precoce do volume expiratório forçado no primeiro segundo, nível sérico alto de IgE e tosse produtiva persistente na infância fossem fatores preditores importantes de asma moderada a grave na idade adulta. |
Asma de início na idade adulta
Uma parcela dos pacientes portadores de asma, denominada de início na idade adulta, intrínseca ou não atópica, manifestam os sintomas tardiamente. Embora com menor duração da doença em relação aos de início precoce, tendem a apresentar doença de maior gravidade. Há predominância de mulheres, associação com polipose nasal, tabagismo, rinossinusopatia crônica. Estudos recentes demonstram que os asmáticos com início tardio tenham a capacidade vital forçada inferior aos de início precoce, sugerindo remodelamento ou inflamação persistente que acomete a porção distal das vias aéreas.
Alguns subtipos clínicos são reconhecidos, tendo em comum a tendência à dificuldade de controle e a presença de fatores desencadeantes bem estabelecidos: asma induzida por aspirina, desencadeada por infecção respiratória grave e ocupacional.
A asma induzida por aspirina é uma síndrome que tipicamente se inicia na idade adulta, caracterizada pela associação de rinossinusite hiperplástica crônica, polipose nasal e asma desencadeada pela ingestão de aspirina ou antiinflamatórios não hormonais.
Um subgrupo de pacientes relata o início dos sintomas após uma infecção respiratória grave. Chlamydia pneumoniae eMycoplasma pneumoniae têm sido associados a este tipo de asma.
A asma ocupacional ou desencadeada no ambiente de trabalho é uma manifestação comum, frequentemente subdiagnosticada. Alguns estudos estimam que até 20% dos pacientes com asma na idade adulta pertençam a este subgrupo, que compreende alguns dos pacientes de controle mais difícil em nossa experiência.5 – Asma de difícil controle pode ser caracterizada por exacerbações frequentes?Aproximadamente 40% dos pacientes caracterizados como de difícil controle estão predispostos a exacerbações frequentes, por vezes fatais ou quase fatais. Raça negra, menor nível socioeconômico, rinossinusite crônica, refluxo gastroesofágico, apneia obstrutiva do sono, distúrbios psicoemocionais (ansiedade e/ou depressão), volume expiratório forçado no primeiro segundo reduzido, atopia, sensibilidade à aspirina, asma associada ao período menstrual e inflamação eosinofílica não controlada são fatores associados a exacerbações de repetição.
A literatura mais antiga propõe que pacientes com exacerbações graves e frequentes constituem a asma lábil, caracterizada por dois fenótipos. No tipo I encontram-se os pacientes mal controlados no dia a dia, sintomáticos frequentes, utilizando altas doses de medicação de resgate. O tipo II, raro, compreende indivíduos com doença controlada que apresentam exacerbações súbitas, potencialmente fatais.
Alguns estudos sugerem que parte dos asmáticos de difícil controle tenha uma reduzida percepção do grau de dispneia, tendendo a retardar a procura de atendimento médico e predispondo-os a maior risco de exacerbações graves.6 – Asma de difícil controle pode apresentar limitação crônica ao fluxo aéreo como na DPOC?Em contraste aos que sofrem exacerbações frequentes, há pacientes que mantêm uma perda funcional contínua, apesar de menos sintomáticos. A maioria dos pesquisadores atribui este fenótipo a uma inflamação eosinofílica persistente, não tratada adequadamente ou não responsiva ao tratamento. Este padrão é mais preponderante em asma de início na idade adulta, mas também é observado em crianças. Nestas, predominam meninos, não atópicos. Nos adultos sugere-se que aqueles com infecções respiratórias crônicas ou de repetição seriam particularmente sujeitos a este fenótipo. Em contraponto à tendência dominante de atribuir este comportamento a inflamação eosinofílica persistente, há autores que admitem que o padrão inflamatório neutrofílico caracterize este subgrupo de pacientes. Os advogados desta teoria enfatizam que a asma alérgica é eosinofílica, responsiva a corticóides, desde que convenientemente tratada. Por outro lado, a asma intrínseca teria uma característica neutrofílica, não responsiva. Nas duas situações o processo inflamatório persistente produziria remodelamento, com resultado final comum de limitação crônica persistente.7 – A resistência aos corticosteróides pode estar presente na ADC?É senso comum que a asma é por definição controlável com corticóides; entretanto, nos últimos anos observa-se que esta é uma verdade parcial. Alguns pacientes somente mantêm a asma sob controle com doses altas de corticóides inalatórios, outros necessitam de medicação por via sistêmica constante e alguns, não exclusivamente portadores de asma grave, são resistentes a corticóides. Os mecanismos envolvidos são parcialmente conhecidos. Pertenceriam a este fenótipo, entre outros, asmáticos com inflamação neutrofílica predominante ou pauci-inflamatória e tabagistas.8 – Como pode ser descrito o padrão inflamatório da asma?A asma é classicamente descrita como uma doença inflamatória crônica da imunidade adaptativa associada à produção de anticorpos IgE, citocinas Th2 e eosinófilos que resultam na ativação e recrutamento de diversos elementos celulares para os pulmões e na produção de um complexo conjunto de mediadores pró-inflamatórios. Uma série de outros elementos celulares como mastócitos, neutrófilos, macrófagos e linfócitos também estão presentes nas vias aéreas de pacientes com asma.9 – Qual o papel do eosinófilo na asma?O eosinófilo é uma célula chave na patogênese da asma, e estudos mostram que há associação entre o número de eosinófilos nos compartimentos pulmonares com a gravidade da doença, obstrução das vias aéreas e aumento da hiperreatividade. A correlação entre a eosinofilia das vias aéreas e o número de exacerbações em pacientes com asma eosinofílica refratária ao tratamento já foi realçada em vários estudos.10 – O eosinófilo está sempre presente na Asma?Estudos em pacientes com asma grave refratária mostraram que nem todos os pacientes apresentam asma do tipo eosinofílica. Os trabalhos pioneiros com biópsias em asma grave mostraram que apesar do tratamento com altas doses de glicocorticóides, os pacientes apresentavam persistência da inflamação em lavado broncoalveolar e biópsias, e curiosamente, com um número maior de neutrófilos. Já foi demonstrado que existem diferentes fenótipos inflamatórios na asma grave: eosinofílico, neutrofílico ou o pauciinflamatório.11 – Qual o papel do neutrófilo na ADC?Os neutrófilos também estariam envolvidos nos episódios de exacerbações graves, quase-fatais, de asma. Alguns autores acreditam que a presença de infiltrado neutrofílico seja resultante de infecção respiratória viral como fator precipitante da crise de asma. Os vírus podem induzir macrófagos e células epiteliais a secretar IL-8, quimioatractante de neutrófilo.12 – Qual o papel do mastócito na ADC?Muita atenção é dada à razão neutrófilos/eosinófilos na asma grave, pois a presença destas células nas vias aéreas é capaz de identificar fenótipos clínicos, predizer pacientes mais propensos a exacerbações, além de potencialmente poder guiar tratamento antiinflamatório personalizado. No entanto, outras células reguladoras e efetoras do sistema imune têm possivelmente papel de igual importância na patogenia da asma grave, como o mastócito.
Os mastócitos são importantes células efetoras em doenças de cunho alérgico como a asma, sendo ativados pelo cross-linking do receptor de alta afinidade de IgE, o FceRI. Após a ativação, os mastócitos liberam mediadores previamente sintetizados e sintetizados de novo, como histaminas, leucotrienos, diversas citocinas como IL-4, IL-5, IL-13, TNF-α e quimiocinas. Os mediadores causam rápido extravasamento de plasma, vasodilatação e broncoconstrição. As citocinas liberadas agem na fase de reação tardia da doença com o recrutamento de linfócitos e eosinófilos. Mastócitos ainda participam de uma série de fenômenos não alérgicos como nas respostas inatas a vários microorganismos, recrutamento leucocitário e remodelamento, através da liberação de proteases.
Estudos como o European Network For Understanding Mechanisms Of Severe Asthma (ENFUMOSA) mostraram que cerca de 60% dos pacientes com asma grave são atópicos. Em um subgrupo de pacientes com asma grave alérgica, o uso de omazulimabe, um anticorpo humanizado anti-IgE, tem se mostrado eficaz em diminuir as exacerbações, a dose de corticosteróides e melhorar a qualidade de vida. Este medicamento, apesar de não interferir na densidade de mastócitos nas vias aéreas (em asma leve), diminui a expressão do receptor de IgE de alta afinidade e da IgE ligada aos mastócitos no tecido pulmonar.13 – Qual o papel do remodelamento na ADC?Em pacientes com doença grave pode haver a perda do caráter reversível de obstrução das vias aéreas, aproximando-se a doença clínica e fenotipicamente da DPOC. Acredita-se que as alterações estruturais das vias aéreas (espessamento), através do descrito em estudos de modelagem matemática e do observado em estudos de autópsia, contribuam para tais fenômenos. De fato, alguns estudos identificaram relação entre gravidade da asma e alterações estruturais específicas nas vias aéreas. Estudos de autópsia mostram que os diversos componentes das vias aéreas encontram-se mais espessos em pacientes que morreram de asma do que aqueles que tinham asma leve.14 – Como pode ser feito o diagnóstico da ADC baseado em critérios?
O Workshop sobre asma de difícil controle promovido pela ATS em 2004 e as IV Diretrizes Brasileiras para o manejo da Asma , estabeleceram que a definição dessa condição deva atender a um critério maior entre “uso de corticóide oral em mais de 50% dos dias do ano” e “necessidade de dose máxima de corticosteróide inalatório”, além de dois critérios menores quais sejam: necessidade de associação de segunda ou terceira droga como antagonistas de leucotrienos, xantinas ou citostáticos; necessidade diária de beta2 de curta duração; obstrução persistente (VEF1 < de 80% do previsto e variabilidade do pico de fluxo expiratório acima de 20%); mais de uma crise por ano com necessidade de ida ao serviço de emergência; necessidade de uso de mais de três cursos de corticosteróide oral por ano; piora do quadro quando se reduz menos do que 25% do corticóide oral em utilização e crise quase fatal no passado. Na utilização desses critérios deve-se considerar que o diagnóstico de asma está corretamente estabelecido, que os medicamentos de manutenção como os corticosteróide inalatórios e beta 2 de ação prolongada são utilizados adequadamente, que não há exposição ambiental agressiva e que o paciente não está utilizando medicamentos que podem provocar broncoespasmo, como beta-bloqueadores por exemplo. (Quadro 3)
Combinação dos critérios ATS 2000 e ERS 1999.
*Para definição de ADC são necessários pelo menos um critério maior e dois menores, acompanhamento mínimo de seis meses, exclusão de outros diagnósticos, avaliação e tratamento de fatores agravantes e certificar-se que há boa adesão ao tratamento.
15 – Quais as estratégias para o diagnóstico da asma de difícil controle?O diagnóstico da Asma de Difícil Controle deve ser feito preferencialmente por especialistas com avaliação criteriosa ,quando se vai estabelecer o diagnóstico de certeza de asma, excluir diagnósticos diferenciais, pesquisar, controlar ou excluir fatores exacerbantes e saber se esta havendo inadequação do tratamento. O Consenso Latinoamericano de ADC, em sua atualização de 2008 propõe o algoritmo destacado na figura 1.16 – Como pode ser confirmada a resistência aos corticosteróides?A confirmação da resistência aos corticosteróides pode ser feita pelo teste de Brompton. Consiste na administração a pacientes com prova broncodilatadora positiva, de um ciclo de 40 mg diários de corticosteróides orais, por duas semanas, duplicando-se a dose mais duas semanas caso não se tenha resposta terapêutica inicial. Caso o paciente não apresente melhora clinica e funcional, considera-se que o teste é positivo para a presença de resistência ao corticosteróide.17 – Quais os outros fatores podem colaborar para a ADC?Remodelamento de vias aéreas:
Pode ser definido como um conjunto de alterações estruturais das vias aéreas e interstício pulmonar que acarretam em distúrbios funcionais de gravidade proporcional. Esse fenômeno decorre do processo inflamatório crônico e tem aspecto fenotípico variável entre os asmáticos, com diferentes padrões de intensidade e rapidez de desenvolvimento. Sabe-se que quanto mais intenso e rápido, maior a gravidade e a dificuldade de controle da asma. Algumas alterações já são conhecidas e consagradas como resultados do processo de remodelamento na asma. Entre elas destacam-se: hiperplasia e hipertrofia da musculatura lisa; desnudamento do epitélio brônquico com exposição de neuro-receptores que estimulam o broncoespasmo; infiltrado celular da adventícia; espessamento da porção reticular da membrana basal; perda das dobraduras do epitélio brônquico; elastólise do interstício peribronquiolar com perda da sustentação elástica dos bronquíolos; hiperplasia glandular com hiperprodução de muco; espessamento da lâmina própria da musculatura brônquica. Todas essas alterações vão acarretar nos seguintes fenômenos: aumento da hiper-reatividade brônquica; aumento da obstrução; diminuição da reversibilidade; redução da resposta dos receptores beta 2 às substâncias broncodilatadoras endógenas e exógenas.
Existe evidente proporcionalidade entre o remodelamento, gravidade da asma e dificuldade de controle. O fenômeno de elastólise no interstício peribronquiolar tem como repercussão a hiperinsuflação pulmonar persistente, devido ao fechamento precoce das pequenas vias aéreas durante a expiração. A redução da Capacidade Vital e Capacidade Inspiratória observada na espirometria simples no período inter-crítico não deixa de ser marcador indireto de gravidade da asma. Estudos realizados em asmáticos portadores de asma quase fatal mostram que elevação do volume residual e redução da capacidade vital são marcadores indiretos de elevação de mortalidade pela asma.
Acometimento das pequenas vias aéreas:
As alterações estruturais decorrentes do processo inflamatório da asma nas vias aéreas menores do que dois milímetros têm sido cada vez mais considerados na fisiopatologia da asma de difícil controle.18 – Qual o tratamento da ADC?O paciente deve estar em acompanhamento por especialista por seis meses, na etapa 4 de tratamento de acordo com o GINA e as Diretrizes Brasileiras para o manejo da Asma (quadro 2). Os fatores descontroladores da Asma devem ser eliminados ou amenizados (uso inadequado dos medicamentos inalatórios, medicamentos concomitantes, disfunção de cordas vocais, rinossinusites, refluxo gastro-esofágico, exposição ambiental e ocupacional, tabagismo, ansiedade e depressão). Se ainda assim o paciente não obtiver o controle está indicada, de acordo com as Diretrizes Nacionais e Internacionais, o uso de Omalizumabe.19 – O que é o Omalizumabe?É um anticorpo monoclonal recombinante humanizado que se liga à imunoglobulina E (IgE) livre e impede as respostas por ela mediadas. O omalizumabe reconhece somente a IgE e se liga a todas as formas circulantes, não importando a especificidade do alérgeno. Esta anti-IgE inibe as respostas induzidas pelo alérgeno, independentemente da especificidade deste. Não se liga à IgE que já está na superfície das células e elimina a IgE circulante formando trímeros ou hexâmeros através do sistema reticuloendotelial.20 – Qual a indicação do Omalizumabe?O omalizumabe está indicado para asma de difícil controle em pacientes acima de 12 anos que apresentem um componente de atopia demonstrado preferencialmente por testes cutâneos positivos (prick test) ou reatividade in vitro(rast) a alérgenos inaláveis comuns. Em situações excepcionais, pode-se aceitar a história médica pregressa como definidora do componente atópico. Os pacientes precisam também apresentar níveis de IgE total sérica entre 30 e 700UI/mL.21 – Como o Omalizumabe deve ser utilizado?O omalizumabe é prescrito por via subcutânea a cada duas ou quatro semanas (14 ou 28 dias), de acordo com níveis sérico de IgE total e peso, na dose de 0,016mg/kg/IgE, por meio de tabela customizada (Quadro 4). Aplicação deve ser em ambiente hospitalar, em local equipado para atendimento de urgência (carrinho de parada, material de entubação, oxigênio). Observação obrigatória por 2 horas na primeira vez e uma hora nas subsequentes. Não é indicado para tratar estado de mal asmático. Não se deve suspender ou diminuir abruptamente o corticóide inalatório ou oral.22 – Qual o preditor específico de resposta ao Omalizumabe?Não existe um fator preditor de resposta como também não existe um desfecho determinante de eficácia da medicação. O que se faz hoje é prescrever por um período mínimo de 16 semanas, observando melhora nos seguintes desfechos: qualidade de vida, função pulmonar, despertar noturno, sintomas diários, exacerbações, uso da medicação de resgate, uso de corticóides sistêmicos, visitas não agendadas a consultórios médicos, idas aos serviços de emergências e hospitalizações.23 – O nível de IgE sérico deve ser monitorizado com o uso do Omalizumabe?Não existe indicação para solicitação dos níveis séricos da IgE total ao longo do tratamento para eventual reavaliação. Os bkits comerciais disponíveis em laboratórios de análises clínicas dosam a IgE total e não a livre (dosada apenas em protocolos de pesquisa em função do custo elevado). Portanto, ao pedir a dosagem durante o tratamento, os níveis deverão estar elevados (até 10 vezes), pois refletirão a IgE livre mais a conjugada nos complexos omalizumabe/IgE. Caso fosse possível dosar a IgE livre, seus níveis estariam próximos de zero.24 – Como titular a dose de Omalizumabe no decorrer do tratamento?A única hipótese para reavaliação da dose prescrita da anti-IgE é em casos de perda ponderal >10% em curto espaço de tempo.25 – Existe a possibilidade de Omalizumabe vir a ser utilizado em crianças abaixo de 12 anos?Já existem estudos avaliando a eficácia e segurança do omalizumabe em crianças de 6 a 11 anos, mas as agências reguladoras ainda não liberaram a utilização para esta população aqui no Brasil.26 – Quais os eventos adversos conhecidos do Omalizumabe?Alguns eventos adversos chamaram a atenção e vêm sendo acompanhados:
anafilaxia: incidência de 0,1%. 40% das vezes em que ocorreu foi após a primeira dose. Alguns casos aconteceram até 24 horas após a aplicação. Poucos casos após dois anos de uso;
reações locais: equimose, eritema, calor local, queimação, dor em ferroada, prurido, formação urticariforme, dor, enduração, tumoração e inflamação. Ocorrem, em sua maioria, dentro de uma hora após a injeção, duram menos de oito dias e geralmente diminuem de frequência nas aplicações subsequentes;
neoplasias: tipos celulares e órgãos de origem heterogêneos, sem casos considerados relacionados à droga por um painel de oncologistas independentes em condições cegas, revisão da literatura sem uma clara ligação entre a IgE elevada na asma e o risco de câncer. Os dados clínicos não sugerem uma relação causal entre o omalizumabe e o câncer até o momento.
aumento do risco de infestações por helmintos: único estudo a avaliar essa relação não mostrou significância estatística.
cardiotoxicidade: análise interina de segurança dos dados do estudo EXCELS – avaliação da eficácia clínica e segurança em longo prazo em pacientes com asma moderada a severa, realizada pelo FDA, sugere aumento desproporcional de doença cardíaca isquêmica, arritmias, cardiomiopatia e insuficiência cardíaca, hipertensão pulmonar, desordens cerebrovasculares, eventos embólicos, trombóticos e tromboflebíticos em pacientes tratados com omalizumabe. O FDA não está recomendando qualquer alteração nas informações de prescrição desta medicação nem advertindo aos pacientes que suspendam o tratamento neste momento.27 – Existem outros medicamentos que podem ou poderão ser utilizados no tratamento da ADC?Estudos tem avaliado a utilização de macrolídeos, anti-TNF, Anti-IL5, Roflumilast e termoplastia brônquica.28 – Qual a ação dos macrolídeos no tratamento da ADC?Antibióticos macrolídeos, como a claritromicina, têm propriedades antibióticas e antiinflamatórias separadas e distintas. Têm sido amplamente utilizados no tratamento de infecções causadas por Chlamydia pneumoniae e Mycoplasma pneumoniae. Há extensa evidência in vitro e crescente evidência in vivo da atividade antiinflamatória dos macrolídeos, como redução no número de neutrófilos e interleucina 8 (IL-8) em outras doenças
Um estudo bem-desenhado comparou 46 pacientes com asma refratária recebendo ou não claritromicina na dose de 500mg duas vezes ao dia por oito semanas. Houve redução significativa dos níveis de IL-8 e do número de neutrófilos, bem como melhora da qualidade de vida. Outro estudo com telitromicina, na dose de 800mg/dia por 10 dias, comparou a melhora da função pulmonar e dos sintomas em asmáticos com crise aguda de exacerbação, sem diferenciação de gravidade. Houve significância estatística na pontuação dos sintomas, mas sem relevância clínica, do grupo que usou a telitromicina em relação ao placebo.29 – O Anti-IL5 (mepoloizumabe) tem sido pesquisado como alternativa para o tratamento da ADC?Recentemente, dois trabalhos encontraram respostas distintas. O primeiro avaliou o uso do mepolizumabe em um subgrupo de asmáticos de difícil controle que apresentavam eosinofilia no escarro e sintomas apesar do tratamento continuado com prednisona e altas doses de corticóides inalatórios. Apesar de ser um estudo pequeno (20 pacientes), apresentou desenho adequado, acompanhando os asmáticos por 26 semanas. A infusão da anti-IL5 era realizada por via venosa, a cada quatro semanas, na dose fixa de 750mg. Seu objetivo foi demonstrar a redução das exacerbações e a diminuição da dose de corticóide oral, tendo alcançado significância estatística.
O segundo estudo, também duplo-cego, randômico, controlado por placebo, com grupo controle, avaliou 61 asmáticos com eosinofilia refratária e história de exacerbações severas recorrentes. A infusão do mepolizumabe foi feita da mesma maneira, mas ao longo de 50 semanas. Houve redução significativa das exacerbações durante o tratamento, porém sem diferença em relação a sintomas ou função pulmonar. Ambas as pesquisas não observaram eventos adversos sérios relacionados à droga.30 – Quais os efeitos do Anti – TNF (etarnecept, infliximabe) na ADC?Os inibidores de TNFα atualmente disponíveis são anticorpos monoclonais contra TNFα (infliximab e adalimumab) ou o receptor de TNF solúvel fundido com IgG humana (etarnecept). Estudos mostraram que a adição do etarnecept aos corticóides inalatórios em pacientes com asma grave resultou em melhor controle dos sintomas, da função pulmonar e da hiperresponsividade brônquica à metacolina.31 – Qual o papel do Roflumilast no tratamento da ADC?Roflumilast é um inibidor da PDE-4 na forma oral que pode ser administrado uma vez ao dia. Pequeno estudo observou a melhora da resposta asmática tardia em asmáticos leves quando em uso desta medicação comparados com o braço placebo. Outro estudo avaliando sua eficácia, em diversas dosagens, na função pulmonar de asmáticos moderados mostrou melhora, sobretudo na dose de 500mcg.
Quando comparado com beclometasona em asmáticos moderados, obteve o mesmo efeito na melhora da função pulmonar.
Ainda faltam mais pesquisas determinando sua importância no manejo da asma de difícil controle.32 – Qual o papel dos sais de ouro, metotrexato, ciclosporina, azatioprina e imunoglobulinas venosas no tratamento da ADC?Os resultados dos estudos realizados com estas medicações, levando em consideração cada perfil risco-benefício, não indicam seu uso rotineiro em pacientes com asma de difícil controle. O Consenso Latinoamericano de ADC os coloca como evidência B como poupadores de corticosteróides.33 – O que é termoplastia brônquica?Este procedimento endoscópico visa reduzir a massa de musculatura lisa brônquica através da introdução de um cateter que libera energia térmica controlada, queimando as fibras musculares e melhorando a broncoconstrição.
A musculatura lisa do asmático apresenta hiperplasia, hipertrofia, secreta citocinas e encontra-se infiltrada por mastócitos. Geralmente essas características são mais exuberantes na asma de difícil controle. O racional para o tratamento com a radiofrequência é a redução da gravidade e intensidade das crises, controlando melhor a doença.
São realizadas três sessões distintas (lobo superior direito, lobo superior esquerdo e lobos inferiores), com intervalo de 3 semanas entre cada uma. O cateter introduzido tem uma cesta expansível na ponta que, ao ser aberta dentro da via aérea, toca a parede brônquica. Os eletrodos contidos na cesta emitem radiofrequência que resulta no adelgaçamento das fibras musculares lisas.
Essa parece ser uma opção interessante para o tratamento da ADC.34 – Como deve ser o manejo da crise de asma na sala de emergência?O manejo da asma aguda concentra etapas fundamentais que podem alterar favoravelmente a evolução clínica da doença. Tais etapas incluem o diagnóstico, a avaliação da gravidade, o tratamento, o rastreamento de complicações, a definição do local onde se realizará a complementação terapêutica e a orientação por ocasião da liberação da emergência. O manejo do paciente com doença de difícil controle segue essa mesma rotina, porém ressaltando a importância da identificação desse fenótipo como maior risco de recidiva da crise e de evolução para insuficiência respiratória aguda.35 – Como deve ser o processo de diagnóstico da asma na sala de emergência?Em geral, o diagnóstico da crise de asma aguda na sala de emergência se constitui em um processo clínico rápido e fácil. O paciente apresenta-se com algum grau de dispneia, desconforto torácico e sibilância, às vezes acompanhados de tosse e expectoração. Os sintomas apresentam duração variável de horas a dias, porém com exacerbação nas últimas horas, o que motivou sua vinda à emergência. Frequentemente há o relato de episódios semelhantes previamente, podendo haver identificação de fatores desencadeantes e descrição de resposta sintomática favorável a medicações broncodilatadoras. Embora o diagnóstico diferencial seja relativamente simples, sua importância não deve ser subestimada. Por outro lado, deve-se ressaltar que a exacerbação asmática grave pode ocorrer sem a presença de sibilos, situação que pode não ser diagnosticada ou ter sua gravidade subestimada.36 – Como deve ser estabelecida a gravidade da asma aguda ou crise asmática?A avaliação da gravidade da crise asmática visa identificar o paciente de maior risco que requer monitorização e tratamento mais agressivo para evitar a insuficiência respiratória e morte.
Pode ser dividida em duas etapas:
Identificação da gravidade da doença com base em dados da história clínica pregressa:
Os dados da história pregressa que identificam o paciente com uma doença com maior risco para uma evolução fatal incluem: entubação e ventilação mecânica prévias, acidose respiratória sem necessidade de entubação, duas ou mais hospitalizações por asma no último ano, hospitalização no último mês, tratamento crônico com corticóide no último ano, suspensão recente da corticoterapia, tratamento médico inadequado, má aderência ao tratamento e problemas psicológicos ou psicossociais O fator isolado que se associa com maior risco para um desfecho fatal da crise é a necessidade prévia de entubação e ventilação mecânica. Embora a história positiva para fatores de risco de mau prognóstico possa contribuir significativamente na identificação do mau prognóstico da crise asmática e de sua evolução para um estado de mal asmático, ela está presente em apenas 36% dos casos de asma fatal e em 6% dos casos de estado de mal asmático. Assim, devemos salientar que a ausência desses fatores não contribui na avaliação de risco da crise.
Identificação da gravidade da crise atual com base em dados da história atual, exame clínico e avaliação funcional pulmonar:
Os dados da história da crise atual que denotam gravidade incluem duração prolongada dos sintomas, demora em buscar auxílio médico, exacerbação em vigência de corticoterapia e tratamento broncodilatador adequados, recidiva dos sintomas após horas ou poucos dias de atendimento de emergência e presença de comorbidades. No exame clínico, a aparência geral do paciente fornece o indicador mais rápido de gravidade: postura em pé, com incapacidade de assumir a posição supina. Os seguintes sinais denotam a gravidade da limitação do fluxo aéreo: frequência cardíaca maior que 120 batimentos/minuto, frequência respiratória maior que 30 movimentos/minuto, pulso paradoxal maior que 12mm Hg, incapacidade de falar, fala monossilábica, uso da musculatura acessória da respiração, sudorese, tórax silencioso, cianose e alteração do sensório. O clássico achado da sibilância associa-se pouco com o grau de limitação do fluxo aéreo. Entretanto, o médico não deve confiar apenas nos parâmetros clínicos para a avaliação da gravidade da exacerbação da asma, pois a estimativa clínica tende a subestimar o grau de limitação do fluxo aéreo. Além disso, os sintomas e sinais que expressam gravidade na asma aguda desaparecem frente a pequenos aumentos no VEF1 e os pacientes podem ser julgados clinicamente bem na vigência de importante limitação do fluxo aéreo. Dessa forma, se faz necessária uma determinação objetiva da gravidade da obstrução do fluxo aéreo na asma aguda. Ela pode ser realizada pela medida do PFE ou pela espirometria. Na prática, a medida do PFE é mais fácil de ser realizada e o aparelho é bem mais barato. A medida da limitação do fluxo aéreo por meio da determinação do VEF1 pela espirometria ou do PFE pelo aparelho de PFE fornecem dados objetivos para avaliar a gravidade da crise, quantificar a resposta ao tratamento e decidir sobre a internação hospitalar. Esta avaliação funcional deve ser associada à medida da saturação do oxigênio pela oximetria de pulso (SpO2). No momento de admissão, o paciente é identificado como tendo risco de evolução para insuficiência respiratória quando apresentar PFE menor que 33% do previsto associado a SpO2 menor que 92%. Pelo contrário, quando o paciente tiver PFE maior que 33% do previsto e SpO2 maior que 92%, o risco de evoluir para insuficiência respiratória é mínimo. Além disso, a avaliação objetiva repetida ao longo do tratamento é muito útil na identificação dos pacientes que falham em apresentar resposta funcional pulmonar ao tratamento broncodilatador com o β2-agonista de curta ação inalatório. Cerca de 1/3 a 1/5 dos pacientes asmáticos atendidos na emergência apresentam uma resposta precária ao broncodilatador inalatório, falhando em atingir um VEF1 ou PFE de 45% do previsto na primeira hora de manejo. Esses pacientes também constituem um grupo de risco para evolução para insuficiência respiratória, sendo fundamental que sejam prontamente identificados. A gasometria arterial estará indicada quando a SpO2 for menor que 92% na avaliação inicial em ar ambiente, quando ocorrer deterioração clínica a despeito do tratamento broncodilatador pleno ou na iminência de entubação e ventilação mecânica.37 – Quais os princípios gerais no tratamento da asma aguda?As metas do tratamento da asma aguda grave são:
Manter adequada saturação de oxigênio arterial por meio da suplementação de oxigênio.
Aliviar a obstrução do fluxo aéreo por meio de repetidas administrações de broncodilatadores.
Reduzir a inflamação das vias aéreas.
Prevenir futuras recidivas com a administração de corticosteróides sistêmicos.38 – Qual o papel dos beta agonistas adrenérgicos no tratamento da asma aguda ?Os broncodilatadores β2-agonistas de curta ação se constituem na terapêutica de primeira linha para o tratamento da crise asmática e a administração inalatória é a via de eleição.
A administração das medicações β2-agonistas pela via inalatória pode ser feita através de aerossol dosimetrado (spray)ou de nebulizador a fluxo contínuo de ar comprimido. A administraçãopor spray acoplado a espaçador produz broncodilataçãotão eficiente quanto a obtida com a administração pornebulizador a fluxo contínuo.39 – Os anticolinérgicos estão indicados na asma aguda?Os anticolinérgicos são broncodilatadores menos potentes e com início de ação mais lento do que os β2-agonistas de curta ação. O seu uso, combinado aos β2-agonistas, tem sido preconizado na asma aguda grave na emergência em crianças e adultos com VEF1 menor que 50% do previsto.40 – Qual o papel dos corticóides sistêmicos no tratamento da asma aguda?Os corticosteróides sistêmicos se constituem em componente essencial no tratamento da crise asmática atendida na emergência. O atraso no uso de corticosteróides ou a não administração é citado como fator de risco para a morte durante a exacerbação da asma. É a única medicação que evita a recidiva dos sintomas e reduz a taxa de hospitalização. Não há evidências que demonstrem benefício da via intravenosa sobre a oral, de forma que a via oral seria a primeira escolha. Entretanto, como os estudos não incluíram pacientes de muita gravidade, parece razoável reservar a via intravenosa para aqueles pacientes no extremo da gravidade. As doses preconizadas são: prednisona 1 mg/kg via oral até 6/6 h, hidrocortisona 2–3 mg/kg intravenosa até 4/4 h e metilprednisolona 60–125mg intravenosa até 6/6 h.
1 – Qual é a prevalência da asma em grávidas? |
A asma é uma das condições clínicas mais comuns durante a gravidez, estando presente em 3% a 8% das mulheres grávidas. |
2 – Quais são as alterações da função respiratória durante a gravidez? |
Existem alterações funcionais pulmonares durante a gravidez, com redução do volume residual (VR) e da capacidade residual funcional (CRF) pela elevação diafragmática em decorrência do aumento do útero gravídico, sobretudo no último trimestre. Essas alterações podem determinar discreta redução da capacidade pulmonar total (CPT), mas habitualmente com pouco ou nenhum impacto sobre os parâmetros da espirometria (VEF1, CVF, VEF1/CVF e pico do fluxo expiratório). Nesse sentido, o padrão espirométrico da asma na gravidez é o mesmo do que fora deste período, ou seja, com distúrbio ventilatório obstrutivo e prova broncodilatadora positiva. Como os testes de broncoprovocação geralmente não são realizados durante a gravidez, não há dados concretos sobre a hiper-reatividade brônquica na gestação.A gravidez normal está associada a aumento do volume minuto em função da estimulação do centro respiratório pelos níveis elevados de progesterona e pela elevação de 20% a 25% do consumo de oxigênio. Essa hiperventilação provoca aumento na tensão arterial do oxigênio (PaO2), queda na do dióxido de carbono (PaCO2) e diminuição sérica compensatória do bicarbonato, com discreta alcalose respiratória. Cerca de 75% das grávidas apresentam uma sensação subjetiva de falta de ar, possivelmente devido à percepção dessa hiperventilação fisiológica, o que ocorre com mais frequência durante o terceiro mês da gestação.No final da gravidez, observa-se uma diminuição da capacidade residual funcional devido à elevação do diafragma pela compressão do útero aumentado. Contudo, as incursões diafragmáticas permanecem normais, mantendo a capacidade vital inalterada. Os fluxos aéreos não apresentam alterações durante toda a gestação. |
3 – Como a gravidez pode alterar a evolução da asma? |
De acordo com estudos realizados, em torno de 35% das asmáticas pioram durante a gestação, 33% permanecem estáveis, 28% melhoram e 4% não sabem referir sobre alterações. De uma maneira mais prática, pode ser utilizada a “regra do terço”, considerando que 1/3 das pacientes melhoram, em outro terço os sintomas se agravam e em uma mesma proporção a asma continua estável. Os mecanismos envolvidos com estas alterações ainda são pouco conhecidos, porém, a melhora das crises tem sido relacionada especialmente com os níveis de progesterona, cortisol livre, prostaglandina E2, dentre outros. Das condições que pioram os sintomas, destacam-se os níveis de prostaglandina F2 e outras situações que ocorrem em asmáticas não-grávidas, tais como, estresse, doença do refluxo gastroesofágico, infecções viróticas, rinite, sinusite etc.Outro dado interessante é que a evolução da asma tende a ser semelhante em gestações sucessivas, sendo que 60% das grávidas tendem a apresentar o mesmo padrão da gestação anterior. Cerca de 73% das pacientes que apresentaram alteração de sua asma durante a gestação retornam ao estado anterior ao da gravidez, após três meses da realização do parto. |
4 – Qual a frequência das crises de asma na gravidez? |
As crises de asma ocorrem em 20% a 36% das gestantes asmáticas. As crises são mais frequentes entre a 14ª e a 24ª semana, segundo alguns estudos, ou entre a 25ª e a 32ª, segundo outros. A principal razão apontada para a ocorrência das crises é a suspensão do tratamento, especialmente do corticoide inalatório, após o conhecimento da gravidez. |
5 – Quais são os efeitos da asma sobre a gestação? |
A asma associa-se a maior risco de complicações durante a gravidez, um aumento pequeno, embora estatisticamente significativo. As complicações são mais frequentes nas formas mais graves e são minimizadas pelo tratamento e controle adequado da doença.As complicações já comprovadas em estudos clínicos são:
Os fatores aventados para a ocorrência dessas complicações são:
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6 – Quais são as manifestações clínicas apresentadas pela grávida asmática durante os períodos de exacerbação da doença? |
Os sintomas são semelhantes àqueles apresentados por asmáticas não-grávidas: piora progressiva da dispneia, tosse persistente, sibilância, sensação de aperto no peito. Também, entre as gestantes as manifestações são mais frequentes à noite ou cedo pela manhã. |
7 – O que deve ser considerado no diagnóstico diferencial da dispneia apresentada pela grávida? |
A dispneia, em algumas gestantes asmáticas, pode estar associada às alterações verificadas no formato da parede torácica, na posição do diafragma e na sensação de desconforto devido ao aumento da hiperventilação pulmonar. É importante considerar outras causas de dispneia, como insuficiência cardíaca, tromboembolismo pulmonar, pneumotórax, pneumonia, etc. A gestante asmática pode, ainda, apresentar doenças cardíacas ou hematológicas que cursam com dispneia, como aquelas que ocorrem nas mulheres fora da gravidez. |
8 – Como a espirometria e a medida do pico de fluxo expiratório podem auxiliar no controle da evolução de pacientes grávidas portadoras de asma? |
A espirometria é o exame ideal de monitorização da função pulmonar em asmáticos, incluindo as gestantes. Após o diagnóstico firmado, a periodicidade de sua realização depende da evolução da doença, sendo dispensável se esta estiver clinicamente controlada. Uma opção também efetiva é o controle da função pulmonar pelo pico do fluxo expiratório forçado (PFE), medido por aparelhos portáteis pelo menos duas vezes ao dia, pela manhã ao acordar e 12 horas depois. Muitas vezes o PFE altera-se antes da percepção de sintomas pela paciente e pode auxiliar no ajuste do tratamento. |
9 – A radiografia de tórax pode ser solicitada durante a gravidez? |
Em primeiro lugar é importante ressaltar que a radiografia de tórax é normal na grande maioria dos asmáticos, sendo dispensável para seu diagnóstico, a menos que outras hipóteses precisem ser descartadas. Nas crises de asma, a radiografia só deve ser solicitada se houver suspeita de complicações (ex. pneumotórax, pneumonia), ou na suspeita de outros diagnósticos (ex. embolia pulmonar, edema agudo de pulmão).Os riscos para o feto são pequenos, desde que a dose cumulativa de radiação ionizante durante a gestação não ultrapasse 5 rad, sendo que nenhum dos exames radiológicos mais utilizados em pneumologia ultrapassa este limite (o radiograma de tórax em duas posições, realizado durante a gestação, expõe o feto a 0,00007 rad; a tomografia computadorizada dos pulmões, a menos de 0,100 rad). Os maiores riscos, ainda que pequenos, ocorrem no primeiro trimestre e entre a 10ª e a 17ª semana de gestação, com possibilidade de malformação no sistema nervoso fetal, discreto aumento na incidência da leucemia na infância e de mutações genéticas afetando futuras gerações. Recomenda-se, durante a realização destes exames, o uso de proteção abdominal de chumbo na gestante para resguardar o feto. |
10 – Como pode ser classificada a asma nas pacientes gestantes? |
A classificação da asma durante a gestação deve ser a mesma feita nas demais situações. Durante muitos anos classificou-se a asma como intermitente ou persistente, sendo esta ainda dividida em leve, moderada ou grave, com base na frequência dos sintomas e na função pulmonar. Entretanto, esta classificação não levava em conta as medicações necessárias para manter o controle da asma, gerando distorções, como pacientes assintomáticos e com função pulmonar normal, mas necessitando de tratamento intensivo para manter este quadro (neste caso, como classificá-lo quanto à gravidade?). Em função desta dificuldade, esta classificação foi abandonada, passando a ser usada outra, com base no controle ou não da doença: asma controlada, parcialmente controlada e descontrolada. Esses níveis determinarão a necessidade de aumento da medicação ou a possibilidade de sua redução. Eles estão descritos na tabela 1. |
11 – Quais são os objetivos do tratamento da paciente asmática durante a gravidez? |
O tratamento visa manter um controle adequado da asma, assegurando uma boa qualidade de vida para a gestante, bem como, o desenvolvimento adequado do feto. O controle adequado da asma está relacionado com:
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12 – Quais são os componentes do tratamento da grávida asmática? |
São eles:
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13 – O que deve ser observado durante as consultas da gestante asmática? |
Em função da possibilidade de piora clínica durante a gestação, recomenda-se que a paciente seja avaliada pelo menos uma vez ao mês em relação à asma. Nessas consultas o médico deve estar atento para dados que sugiram o descontrole clínico, tais como a presença de dispneia, limitações para atividade física, sintomas ou despertares noturnos por asma, uso de broncodilatador para alívio dos sintomas. Como já comentado anteriormente, a espirometria deve ser realizada na avaliação inicial, podendo o controle funcional subsequente ser realizado pela medida do pico do fluxo expiratório forçado (PFE), que pode ser, inclusive, monitorizado diariamente pela própria paciente.O obstetra deve estar atento ao desenvolvimento fetal e, pelo maior risco de prematuridade e menor ritmo de crescimento, ultra-sons periódicos estão indicados, sobretudo para gestantes com asma descontrolada, formas moderadas ou graves e após recuperação de crises de asma. Outras avaliações podem ser necessárias conforme julgamento do obstetra. |
14 – Como deve ser feito o controle dos fatores que contribuem para a exacerbação da asma? |
A asma nitidamente piora com a exposição a uma série de fatores denominados gatilhos, que incluem alérgenos, irritantes, infecção viral, ar frio e medicamentos. A redução da exposição a alguns desses fatores comprovadamente facilita o controle da asma, com destaque para:
Em relação a outras exposições, não estão totalmente estabelecidos os benefícios de evitá-las em condições habituais, mas em função das implicações da piora da asma na gravidez e por ser um período limitado, justifica-se a tentativa de controle:
Alguns trabalhos têm indicado uma maior possibilidade da gestante adquirir infecções virais e bacterianas do que a não-grávida, portanto situações que possam provocar o contágio devem ser evitadas. |
15 – Qual a importância de um programa de educação em asma para a gestante? |
A educação é muito importante no controle da asma. Ela deve desenvolver na paciente as habilidades necessárias para monitorar a doença e reconhecer a piora dos sintomas, bem como usar corretamente os inaladores. A elaboração de um plano de ação individual e de comum acordo com a paciente é fundamental, para que condutas adequadas possam ser adotadas na presença dos sinais e sintomas de exacerbação, inclusive com a indicação precisa de quando procurar um serviço de emergência.Em muitas das vezes a gestante asmática deixa de utilizar a medicação prescrita, ou diminui sua dosagem, por receio de danos ao feto. O médico deve esclarecer que a falta de controle da doença ocasiona mais problemas para o feto do que os fármacos usados e que os medicamentos prescritos são seguros. |
16 – Como apoiar a paciente do ponto de vista psicológico? |
Os contatos mensais com a paciente pelo seu médico são muito importantes, pois essa simples conduta reduz o estresse emocional da gestante. Durante essas consultas, as dúvidas devem sempre ser esclarecidas, especialmente aquelas relacionadas à evolução de sua gravidez, aos resultados dos exames realizados e à medicação utilizada. A participação do psiquiatra no tratamento estará indicada quando for verificada grave alteração do humor ou na presença de distúrbio do comportamento da paciente. |
17 – Em linhas gerais, qual a segurança dos medicamentos usados no tratamento da asma durante a gravidez? |
Sabe-se que os medicamentos para o tratamento da asma ocupam o quinto lugar no receituário médico para grávidas dos Estados Unidos. As vitaminas, antibióticos, analgésicos e os de uso dermatológico são os mais prescritos durante a gestação. É importante que o médico esteja ciente da segurança destes medicamentos e oriente as pacientes neste sentido, pois a interrupção do tratamento é uma das causas mais importantes para a piora clínica da asma na gravidez.A agência Food and Drug Administration (FDA), nos Estados Unidos, classifica os medicamentos para uso na gestação conforme o risco de danos para o feto da seguinte forma:
A tabela 2 mostra a lista dos medicamentos mais utilizados no tratamento da asma e as respectivas classificações de risco na gravidez. |
18 – Qual a segurança dos beta-2 agonistas durante a gravidez? |
Os beta-2 agonistas de curta ação parecem ser seguros durante a gestação, não havendo evidência clara de teratogenicidade em humanos. A terbutalina é classificada em nível B de risco e o salbutamol em nível C, segundo os critérios do FDA. As experiências com os beta-2 de ação prolongada são menores e, embora estudos em animais não tenham mostrado efeito teratogênico, experiências em humanos são limitadas. Tanto o salmeterol quanto o formoterol são classificados em nível C pelos critérios do FDA.A epinefrina só deve ser usada na gravidez em casos de anafilaxia, não sendo indicada na asma. Nos raros casos em que um beta-2 agonista sistêmico esteja indicado em uma gestante, deve-se optar pela terbutalina subcutânea. |
19 – Qual a segurança do brometo de ipratrópio durante a gravidez? |
O ipratrópio é seguro na gravidez (nível B pelo FDA). Entretanto seu uso é limitado, em função da menor potência broncodilatadora quando comparado com os beta-2 agonistas. Está indicado nas crises graves, em associação com os beta-2 agonistas. |
20 – Qual a segurança dos corticoides inalatórios durante a gravidez? |
Os corticoides inalatórios constituem a primeira escolha de tratamento de manutenção para o controle da asma na gestação. Dados obtidos em diversas pesquisas, quando esta medicação foi usada, não registraram aumento de casos de malformações congênitas, prematuridade, baixo peso ao nascer ou outros problemas ocorridos durante o parto. A maioria dos trabalhos utilizou a budesonida para o tratamento da asma durante a gravidez, considerada como o medicamento de preferência nessa situação (nível B pelo FDA). Entretanto, outros corticoides inalatórios, como beclometasona, ciclesonida, fluticasona e mometasona (todos nível C pelo FDA), poderão ser mantidos caso a paciente já esteja em uso antes da gestação. |
21 – Qual a segurança dos corticoides sistêmicos durante a gravidez? |
Não há consenso sobre a segurança dos corticoides sistêmicos, sobretudo quando usados em doses elevadas no primeiro trimestre da gestação, situação já relacionada a maior risco de ocorrência de lábio leporino e fenda palatina. Outras complicações já associadas ao uso de corticoide sistêmico são: pré-eclâmpsia, hipertensão, diabetes gestacional, prematuridade e baixo peso ao nascer. Em todos esses casos é difícil separar a ação negativa dos corticoides da evolução desfavorável em decorrência da gravidade da asmaEm resumo, pelos riscos da asma grave e descontrolada sobre a mãe e o feto, os corticoides sistêmicos podem ser prescritos para o manejo das crises. Vale ainda ressaltar que a forma mais eficaz de evitar sua necessidade é o tratamento adequado da asma, sobretudo com o emprego dos corticoides inalatórios. Dentre os corticoides sistêmicos, alguns autores recomendam o uso da prednisolona, pois ela é extensamente metabolizada por enzimas placentárias e apenas 10% chega ao feto. |
22 – Qual a segurança das xantinas (teofilina e aminofilina) durante a gravidez? |
As xantinas têm sido cada vez menos usadas na asma de maneira geral e o mesmo ocorre entre as gestantes, embora as mesmas não sejam associadas a risco aumentado de eventos teratogênicos (risco C pelo FDA).Além dos eventos adversos habituais, tais como náuseas, vômitos, diarreia, insônia, irritabilidade, arritmias, cardíacas, hipotensão arterial, convulsões, dentre outros, a ligação às proteínas plasmáticas está reduzida e o metabolismo alterado na gravidez, levando à necessidade de monitorização do nível plasmático, o que inviabiliza o uso na prática clínica. |
23 – Qual a segurança dos antileucotrienos durante a gravidez? |
Até o momento, os antileucotrienos mostraram-se seguros na gestação, sendo que a experiência clínica com os mesmos é limitada, sendo maior com o montelucaste. Sua indicação de uso seria a adição ao tratamento com corticoide inalatório, quando necessário, particularmente em pacientes que já apresentaram boa resposta com esta medicação anteriormente. A dosagem diária é a mesma prescrita para adultos com esta doença. |
24 – Qual a segurança do cromoglicato durante a gravidez? |
A utilização do cromoglicato durante a gravidez é segura e com raros efeitos colaterais, quando usado nas dosagens indicadas para adultos. Porém, tem as desvantagens de uma ação inferior a dos corticosteroides inalatórios e de ser administrada quatro vezes ao dia. |
25 – Qual a segurança do omalizumabe durante a gravidez? |
Estudos em animais não mostraram efeitos teratogênicos, mas estudos clínicos ainda são limitados. Dessa forma, o omalizumabe só deve ser prescrito na gravidez se estritamente necessário, embora sua classificação de risco pelo FDA seja B. |
26 – Como deve ser o tratamento medicamentoso da asma durante a gravidez? |
As bases do tratamento medicamentoso da asma durante a gravidez são as mesmas do tratamento nas condições habituais, ou seja, ele deve ser escalonado para se obter o controle da doença, conforme ilustrado na figura 1. |
27 – Como deve ser o tratamento da crise de asma na gestante? |
Os princípios do tratamento são similares ao manejo das crises de asma em pacientes fora do estado de gestação e estão resumidos no fluxograma abaixo (figura 2). |
28 – Quais são os cuidados a serem observados durante o parto? |
As medicações de controle da asma devem ser mantidas durante o trabalho de parto. Se a paciente fez uso de corticoide sistêmico dentro das 4 semanas anteriores ao parto, recomenda-se o uso de hidrocortisona (100 mg a cada 8 horas) até 24 horas após o parto, para evitar falência de supra-renal.Ocitocina é considerado o medicamento de escolha para indução e controle da hemorragia pós-parto. Não devem ser usados análogos da prostaglandina F2, da metilergonovina ou ergonovina, devido ao risco de provocarem broncoespasmo na paciente. A morfina e a meperidina também não devem ser utilizadas, pois induzem a liberação de histamina, provocando broncoconstricção em asmáticos. Em alguns casos, os anti-inflamatórios não hormonais são usados para o alivio da dor, após uma cesariana. O médico, antes de prescrevês-lo, deve investigar se a asmática é alérgica a este medicamento ou a outro, sobretudo aspirina, situações em que o anti-inflamatório deve ser evitado. |
29 – Como a rinite pode alterar o curso da asma na gestante? |
A rinite pode ocorrer em 20% das mulheres durante a gravidez e sabe-se que o controle dos sintomas desta doença está associado a uma melhora do quadro clínico da asma destas pacientes.Os corticoides intranasais, quando usados nas doses recomendadas, são considerados os medicamentos de escolha para o tratamento da rinite alérgica, com baixo risco de efeitos sistêmicos. Já a loratadina e a cetirizina são os anti-histamínicos de segunda geração mais recomendados para uso em grávidas.Vários autores recomendam evitar a prescrição de descongestionantes nasais durante o primeiro trimestre da gestação, especialmente a pseudoefedrina, que aumenta o risco de gastroquiese, que se caracteriza como uma anormalidade congênita da parede abdominal anterior com herniação das vísceras abdominais. O uso tópico nasal de solução salina pode aliviar a gestante, principalmente antes das refeições e de dormir. |
30 – Qual a relação entre doença do refluxo gastroesofágico com o agravamento das crises de asma durante a gravidez? |
Cerca de dois terços das gestantes queixam-se de pirose ou de outras manifestações digestivas altas relacionadas com refluxo gastroesofágico, sintomas que agravam a asma apresentada pela paciente. Recomendações dietéticas, correção da postura no leito e o uso de inibidores da bomba de prótons constituem medidas importantes para a melhora das queixas digestivas e, por conseguinte, das manifestações respiratórias apresentadas. Os medicamentos inibidores da bomba de próton utilizados nas dosagens recomendadas não ocasionaram maiores riscos de teratogênese. Entretanto, o uso do lansoprazol é preferido, devido aos resultados obtidos em experimentos animais e dos relatos em humanos. |
31 – Quem deve participar do atendimento à gestante portadora de asma? |
Um trabalho conjunto entre o pneumologista e o obstetra é fundamental para evitar exacerbações da asma, resultando em menor número de atendimentos nos serviços de emergências e de internações, consequentemente reduzindo os índices de morbidade e de mortalidade da mãe e do feto. |
1 – Como se define asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Segundo as IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma, ela pode ser definida como doença inflamatória crônica caracterizada por hiper-responsividade das vias aéreas inferiores e por limitação variável ao fluxo aéreo, reversível espontaneamente ou com tratamento, manifestando-se clinicamente por episódios recorrentes de sibilância, dispnéia, aperto no peito e tosse, particularmente à noite e pela manhã ao despertar. Resulta de uma interação entre genética, exposição ambiental e outros fatores específicos que levam ao desenvolvimento e manutenção dos sintomas. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
2 – Qual o impacto da asma em termos epidemiológicos? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Estima-se que a incidência de asma venha aumentando nos países em desenvolvimento. No Brasil, nos últimos anos, registra-se a ocorrência cerca de 230.000 hospitalizações por ano devido a essa doença, sendo causa importante de gastos com saúde, absenteísmo escolar, baixo rendimento físico e impacto psicossocial.Nos países em desenvolvimento, a mortalidade por asma vem aumentando nos últimos anos, correspondendo a 5% a 10% das mortes por causa respiratória, com elevada proporção de óbitos domiciliares.O estudo multicêntrico (International Study for Asthma and Alergies in Childhood – ISAAC), realizado em 56 países, mostrou uma variabilidade de asma ativa na infância de 1,6% a 36,8%, estando o Brasil em oitavo lugar, com prevalência média de 20%. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
3 – Quais são as características fisiopatológicas da asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A fisiopatologia da asma compõe-se de três características principais:Obstrução Decorrente de diversas anormalidades patogênicas, como hipertrofia do músculo liso brônquico, presença de células inflamatórias que secretam mediadores que atuam na descamação epitelial, aumentando a permeabilidade vascular, com consequente edema da mucosa e hipersecreção de muco. O remodelamento epitelial, embora menos estudado em crianças, também pode atuar como mecanismo obstrutivo das vias aéreas.Hiper-responsividade brônquica Diante de diferentes estímulos como poeira, ácaros, fungos, polens, alérgenos animais, ar frio e seco, exercício físico, poluentes, infecções virais, soluções hipo e hipertônicas, pacientes asmáticos podem apresentar uma resposta brônquica exagerada.Inflamação Caracteriza-se por infiltração eosinofílica, degranulação de mastócitos, ativação de linfócitos Th2, que produzem citocinas como as interleucinas 4, 5 e 13, que promovem o recrutamento celular para as vias aéreas (mastócitos, eosinófilos, macrófagos e neutrófilos). Essas células liberam mediadores inflamatórios que causam lesões e alterações na integridade epitelial, anormalidade no controle neural autonômico no tônus da via aérea, alteração na permeabilidade vascular, hipersecreção de muco, alteração na função ciliar e aumento da reatividade do músculo liso. |
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4 – O que é a teoria da higiene na fisiopatologia da asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A teoria da higiene vem sendo defendida por diversos pesquisadores nos últimos anos. A hipótese é que uma menor exposição à sujeira e aos agentes infecciosos no início da vida, característica das populações civilizadas, liberaria o sistema imunológico para ativar mais linfócitos Th2, em contraposição à produção de Th1, envolvidos no combate a infecções, promovendo um estado de alergia exacerbado. Enquanto explica muitas das relações epidemiológicas encontradas, a teoria ainda não esclarece todas as inter-relações entre os fatores mencionados, com alguns resultados ainda controversos, indicando certamente a necessidade de pesquisas adicionais. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
5 – O que é remodelamento de vias aéreas e qual sua relação com a asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Alguns pacientes com asma persistente apresentam padrões obstrutivos permanentes das vias aéreas, mesmo após cursos de corticoterapia oral e uso continuado de corticóides inalatórios preventivamente, associados ou não com beta-2 agonistas de longa ação. Estudos sugerem o desenvolvimento ou reorganização nas estruturas do interstício pulmonar e das vias aéreas, comprometendo significativamente as funções respiratórias. Histologicamente, acontece um espessamento da lâmina reticular da membrana basal epitelial. A este fenômeno chama-se remodelamento.A relação precisa entre remodelamento de vias aéreas e patogêneses da asma ainda não está bem estabelecida, mas já existem evidências que o remodelamento de vias aéreas ocorre precocemente, tão cedo como já no primeiro ano de vida e, em alguns casos, precede o início dos sintomas de asma. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
6 – Qual a relação entre infecção viral do trato respiratório e asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Existe uma estreita inter-relação entre infecção viral do trato respiratório e asma, como se pode observar em crianças que apresentam sibilância com infecção viral, na exacerbação de asma em crianças e adultos, em alterações induzidas na fisiologia das vias aéreas como aumento da hiper-responsividade, anormalidades no fluxo aéreo e alteração nos volumes pulmonares. Atualmente, acredita-se que os três primeiros anos de vida sejam muito importantes no que diz respeito ao dano imposto à via aérea. Essa etapa do desenvolvimento funcionaria como uma janela de oportunidade para o desenvolvimento de asma, etapa em que os vírus respiratórios têm papel fundamental.Em recente estudo, foi demonstrado que o vírus sincicial respiratório (VSR) é um fator de risco independente para sibilância subsequente na primeira década de vida, porém o risco diminui gradativamente com a idade e não é significativo aos 13 anos de idade. Observações epidemiológicas têm demonstrado que infecções por outros vírus na infância (parainfluenza, influenza A e rinovírus) também estão associadas com sintomas crônicos do trato respiratório inferior, incluindo asma. Ainda não está totalmente elucidado se o VSR seria um indutor dessas alterações ou se uma predisposição pessoal em algumas crianças torná-las-ia mais susceptíveis a sibilarem, quando expostas aos vírus. Na verdade, estudos mais recentes têm observado uma mais forte associação entre rinovírus e sibilância recorrente do que aquela com RSV, especialmente em crianças com predisposição para atopia. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
7 – Qual a relação entre infecções parasitárias e asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Estudos populacionais têm observado um efeito protetor da infestação parasitária por ancilostomídeos sobre o surgimento de asma. Uma hipótese para esse efeito seria um mecanismo antiinflamatório dos parasitas que envolveriam efeitos nas células T reguladoras. Outros estudos têm demonstrado aumento dos sintomas de asma em pacientes infestados por Ascaris lumbrocoides. Uma explicação para essa resposta paradoxal seria a idade mais precoce de infestação por Ascaris e o exuberante ciclo pulmonar desse parasita, com consequente incremento dos sintomas de asma. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
8 – Qual a relação entre rinite alérgica e asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Durante muitos anos suspeitou-se que o controle das crises de asma estaria relacionado a um bom manejo da rinite alérgica. Baseado nessas informações, asma e rinite alérgica deixaram de ser entendidas como entidades distintas, mas como manifestações de um mesmo processo inflamatório.Vários são os mecanismos propostos para explicar a relação das duas doenças, entre eles podemos citar:
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9 – Quais os fenótipos de asma na infância? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Renato T. Stein e Fernando D. Martinez, a partir dos dados de seguimento da coorte de Tucson, Arizona, avaliada desde o nascimento, propõem a presença de três fenótipos de asma bem estabelecidos:Sibilantes transitórios precoces Apresentam sintomas até três a cinco anos de vida. Não há associação com história familiar de asma ou atopia. O fator de risco primário seria a redução da função pulmonar, antes mesmo que alguma infecção de vias aéreas inferiores tenha ocorrido. Prematuridade, frequentar creches ou contato com outras crianças no domicílio, fumo materno durante a gestação e exposição ao tabaco após o nascimento são fatores de risco para sibilância transitória.Sibilantes não atópicos Crianças com sibilância transitória associada a infecções virais na primeira década de vida. Pacientes que tiveram infecção respiratória por vírus sincicial respiratório nos primeiros três anos de vida têm risco aumentado de sibilância recorrente nos primeiros dez anos de vida, independente de outros fatores de risco conhecidos para asma, como história familiar e atopia. Entretanto, o risco diminui com a idade e já não é significativo aos 13 anos.Sibilantes atópicos – asma Mais da metade dos casos de asma começa precocemente, a maioria antes dos seis anos de idade. Em diferentes estudos, a presença de atopia e o aumento da responsividade das vias aéreas são os maiores fatores de risco para sibilância persistente. Para os sibilantes persistentes a sensibilização alérgica precoce aumenta a prevalência dos sintomas respiratórios, a inflamação crônica das vias aéreas e o risco de declínio da função pulmonar. Estudos têm demonstrado que a asma está fortemente associada com elevados níveis séricos de Ig E. Este fenótipo é o que mais se assemelha ao quadro apresentado pelos adultos. |
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10 – Como pode ser classificada a asma segundo sua gravidade na avaliação inicial? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Diferentes classificações de gravidade já foram propostas. Elas se destinam a um estadiamento da doença, com vistas ao planejamento terapêutico, uma vez que os estudos que se propõem a avaliar medicações estabelecem o grau de comprometimento que estão avaliando. Apresentamos aqui a classificação da gravidade da asma segundo IV Diretrizes brasileiras para o manejo da asma (tabela 1) e a da Global Intiative for Asthma (tabela 2). Como se pode observar, ambas levam em consideração achados clínicos e funcionais, estes últimos muitas vezes indisponíveis para crianças pequenas, na maioria dos centros. Nesses casos, o clínico deve seguir os dados de história e de exame físico para planejamento de conduta. Importante ressaltar que crianças com quadros graves de asma, muitas vezes têm função pulmonar menos comprometida, quando comparadas com adultos da mesma gravidade.
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11 – Como se apresentam as provas de função pulmonar na asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Quando o paciente se encontra no período intercrise, as provas espirométricas podem variar de valores normais para o previsto até diferentes graus de obstrução. Os parâmetros que se encontram diminuídos e traduzem obstrução aos fluxos aéreos são VEF1 (volume expiratório forçado no 1o segundo), VEF1/CVF (relação entre VEF1 e capacidade forçada) e FEF25-75 (fluxo expiratório médio entre 25 e 75% da CVF). A medida do pico de fluxo expiratório (PFE) pode substituir o VEF1, nos casos em que não haja equipamento disponível.Na asma persistente leve ou na intermitente usualmente encontram-se valores de VEF1/PFE acima de 80% do previsto; já a asma persistente moderada apresenta valores de VEF1/PFE entre 60% e 80% do previsto e na grave os valores de VEF1/PFE podem encontrar-se abaixo de 60% do previsto. Durante a crise asmática, pode-se usar o PFE ou o VEF1 para avaliação inicial da crise e resposta ao tratamento empregado.Interessante notar que o seguimento de lactentes até a vida adulta (Tucson Children’s Respiratory Study) demonstrou que crianças pequenas que apresentavam características obstrutivas nos primeiros meses de vida, permaneciam com índices de VEF1/CVF mais baixos na vida adulta do que controles. A coorte de Melbourne demonstrou resultados semelhantes, encontrando um déficit na relação VEF1/CVF nos pacientes sintomáticos, déficit esse que se manteve estável ao longo da vida. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
12 – Qual o tratamento preventivo da asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O tratamento de manutenção visa preservar a função pulmonar no longo prazo, melhorar a qualidade de vida dos pacientes, evitar visitas à emergência e uso de uso de medicações para alívio dos sintomas e prevenir remodelamento de vias aéreas. Deve ser baseado na classificação da gravidade da asma. Caso haja dúvida nessa classificação, deve-se iniciar sempre por uma etapa mais elevada.A tabela 3 apresenta as propostas de tratamento de manutenção inicial conforme a gravidade da asma. Uma vez iniciado, o tratamento deve ser ajustado segundo o grau de controle da asma. (Tabela 4)
CI. corticóide inalatório; LABA. Beta-2 agonista de ação prolongada
* – presença de exacerbação em uma semana qualquer faz da mesma uma semana com a doença descontrolada. Adaptado do GINA, 2008. Uma vez atingido o controle da asma, o tratamento deve ser mantido por pelo menos três meses. Redução gradual da terapia de manutenção deve ser iniciada para identificar a terapia mínima capaz de controlar a doença. No caso de não estar o paciente parcialmente controlado, deve-se considerar aumentar a etapa de controle, e no caso de estar não controlado, torna-se mandatório aumentar a etapa. Paralelamente ao uso de medicação pulmonar, é imperativo avaliar as vias aéreas superiores e quando da presença de alterações compatíveis tratar a rinite alérgica. O tratamento de primeira linha baseia-se na aplicação tópica de corticóides intranasais. Alternativamente, ele pode ser feito com a inalação nasal do corticóide inalatório prescrito para a asma. Dois estudos nacionais empregaram essa abordagem com bons resultados, que tem ainda a vantagem de reduzir o custo do tratamento e, potencialmente, elevar a taxa de adesão. Para crianças menores de 5 anos de idade , GINA publicou recomendações em separado para determinar o nível de controle da doença.
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13 – Qual a vantagem em associar um beta-2 agonista de longa ação para os pacientes já em uso de profilaxia com corticóide inalatório? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os resultados dos estudos comparando o acréscimo de beta-2 agonista de longa ação para pacientes já em uso de corticóide inalatório com o aumento da dose deste medicamento favorecem a associação. Este benefício já está comprovado em crianças com mais de cinco anos de idade.Bisgaard e Nielsend demonstraram o potencial uso dos beta-2 agonistas de longa ação na faixa etária dos dois aos cinco anos de idade, com efeitos broncodilatadores e broncoprotetores por até oito horas. Até o presente momento, entretanto, necessitam-se mais estudos com relação ao uso destes fármacos em pré-escolares, especialmente naqueles menores de 4 anos. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
14 – Quais as principais técnicas de uso dos dispositivos inalatórios em pediatria? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Existem quatro técnicas principais:
O aerossol dosimetrado aclopado a espaçador com máscara facial (máscara deve ter tamanho e flexibilidade adequados a uma correta adaptação sem escapes) e os nebulizadores com máscaras faciais são os dispositivos indicados para lactentes e crianças pequenas. A partir dos quatro anos de idade, a criança já se encontra apta para coordenar o mecanismo que envolve inspiração e pausa pós-inspiratória e o aerossol dosimetrado passa a proporcionar maiores taxas de deposição pulmonar. Nessa fase, uso do espaçador visa diminuir as perdas da medicação com a técnica, pois diminui a deposição em orofaringe (impactação inercial) e melhora a deposição de partículas da medicação no parênquima pulmonar (sedimentação gravitacional). Os inaladores de pó necessitam de um fluxo inspiratório adequado às vezes de 60 L/min e, na maioria das vezes, indica-se para crianças maiores de cinco anos. Os nebulizadores permanecem úteis em pacientes com crises graves hipoxêmicos ou quando não se adaptam às técnicas anteriores. Espaçador-spray é mais adequado que nebulização nas exacerbações; facilita inclusive adoção e prescrição de planos de auto-manejo das crises no domicílio, evitando deslocamentos desnecessários a serviços de urgência. |
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15 – Alguns pacientes asmáticos não evoluem de forma adequada, apesar da terapêutica ótima instituída. Como avaliar crianças que se encaixam nesse perfil e não respondem bem a altas doses de corticóides inalatórios? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Primeiramente deve-se avaliar a adesão do paciente ao tratamento. Se o paciente faz uso da medicação regularmente, deve-se observar se a técnica e o tipo de dispositivo utilizado para inalação estão adequados. O terceiro passo consiste em avaliar a possibilidade de outros diagnósticos, entre eles rinite não controlada, refluxo gastroesofágico e aspergilose broncopulmonar alérgica, e em verificar o envolvimento de fatores ambientais e psicológicos.Pacientes que tiverem usado (prescrição médica ou automedicação) ou fazem uso de prednisona 40mg/dia por um período de 14 dias, com aderência checada através da dosagem do nível sérico de prednisolona e nível de cortisol, sem apresentar melhora da função pulmonar, merecem passar por uma investigação mais detalhada. Deve-se considerar a realização de fibrobroncoscopia flexível com lavado broncoalveolar e biópsia de vias aéreas. Após esta avaliação, deve-se rever a fisiopatologia da asma. Nem toda asma é eosinofílica e há pequena possibilidade que o paciente tenha uma asma neutrofílica, que não responde bem a corticóide. Essa situação vem sendo descrita na faixa etária pediátrica. Nesses pacientes poderiam ser tentados antibióticos macrolídeos, que têm ação antiinflamatória, ou teofilina, que atua acelerando a apoptose neutrofílica.Alguns pacientes apresentam obstrução fixa de vias aéreas, sendo considerada uma “sequela” da inflamação crônica. Outros podem apresentar inflamação eosinofílica resistente aos corticóides, devendo ser considerado o tratamento com ciclosporina. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
16 – Como se classificam as exacerbações asmáticas e suas gravidades? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A tabela 6 mostra o comportamento de parâmetros clínicos e funcionais na crise de asma.
Neste documento os autores relacionam ainda achados que sugerem que a parada respiratória está iminente:
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17 – Quais exames devem ser solicitados num paciente em crise asmática? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A decisão de solicitar exames complementares adicionais vai depender da suspeita de co-morbidade associada agravando o quadro inicial. Suspeita de pneumonia, atelectasias, pneumotórax, história prévia de cardiopatia são exemplos. Não há nenhum benefício em solicitar-se radiografia de tórax ou gasometria arterial em crises usuais de asma. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
18 – Como proceder na vigência de exacerbação da asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O manejo inicial da crise leve pode ser feito no próprio domicílio do paciente. A resposta ao tratamento instituído deverá ser observada com rigor, pois indicará o próximo passo a ser tomado. A figura 1 mostra um fluxograma para a condução do paciente nessa situação. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
19 – Como abordar a gravidade da crise de asma no serviço de emergência? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Na emergência, a gravidade da crise será diagnosticada juntamente com a avaliação de fatores de risco para maior morbidade e mortalidade em pacientes pediátricos. São eles:
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20 – Qual o tratamento inicial da crise de asma no pronto socorro? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O manejo inicial inclui três doses de beta-2 agonista por via inalatória, podendo ser empregados nebulização ou nebulímetro pressurizado com espaçador. A avaliação da gravidade da crise se faz de maneira mais adequada avaliando-se a criança após essa terapêutica inicial. Essa avaliação posterior ao manejo inicial guarda melhor relação com os desfechos de internação e gravidade de crise.Corticóide sistêmico deve ser empregado em todas as crises, talvez excetuando-se aquelas mais leves, prontamente revertidas com as doses iniciais do broncodilatador. O corticóide pode ser empregado pela via oral, não havendo indicação de acesso venoso, excetuando-se aqueles casos em que houver contra-indicação daquela via. A dose usual é de 1 mg/kg de prednisona ou prednisolona, não havendo benefício adicional em doses maiores.Não há lugar para as xantinas nas crises leves a moderadas, havendo alguma evidência de benefício de seu emprego em crises graves, não responsivas inicialmente aos beta-2 agonistas e ipratrópio. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
21 – Quais as opções medicamentosas em pacientes que não respondem ao tratamento inicial da crise de asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A base do tratamento broncodilatador é a repetição de inalações de beta-2 agonistas com brometo de ipratrópio. A associação de brometo de ipratrópio traz benefícios no manejo inicial da asma grave em pacientes pediátricos, principalmente em idade escolar. As doses podem ser repetidas, de início, a cada hora, aumentando-se o intervalo à medida em que o paciente melhora.Meta-análise recente demonstrou benefício de se adicionar 15 mcg/kg de salbutamol IV em asma aguda grave, não responsiva ao tratamento inicial com três doses de broncodilatador inalado. O emprego de beta-2 agonistas pela via endovenosa está restrito àquelas crises graves, nas quais não se pode assegurar a chegada da droga pela via inalatória à via aérea periférica. Essa via é escolhida, portanto, na situação de não resposta à terapêutica inalatória.O corticóide sistêmico, nessas formas graves habitualmente administrado por via venosa, deve ser mantido a cada seis horas. A aminofilina venosa pode se considerada e o sulfato de magnésio é certamente superior ao placebo nas crises de asma, mas ainda não está bem definido o seu papel junto às drogas convencionais em pediatria. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
22 – Como se decidir pela internação ou liberação do paciente com crise de asma atendido no setor de emergência? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Essa decisão leva em conta dados objetivos, como a evolução de parâmetros clínicos e funcionais com o tratamento, mas também dados subjetivos, como aspectos socioeconômicos e a impressão do médico sobre o paciente. Entre os dados que podem nortear essa decisão destacam-se:
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23 – Quais os cuidados a serem tomados com os pacientes liberados do setor de emergência ou na alta, após internação por crise de asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Nos dois casos o paciente deverá receber um curso de corticóide sistêmico, prednisona ou prednisolona por via oral, habitualmente de 1 mg/kg por aproximadamente sete dias. A medicação broncodilatadora deve ser mantida. Nesse período ele deve ser encaminhado ao serviço médico que fará o acompanhamento da asma, o qual avaliará:
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24 – Existe diferença entre usar a nebulização ou aerossol dosimetrado no tratamento da crise de asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O correto aproveitamento na oferta da medicação dependerá principalmente do dispositivo usado e de fatores do próprio paciente. Em nosso meio, os nebulizadores a jato encontram-se muito difundidos, têm como principal desvantagem o custo da compra do compressor, oferta variável da medicação (marcas ineficientes) e a necessidade de manutenção e limpeza. Já os aerossóis dosimetrados são mais compactos e portáteis, permitem o uso com múltiplas doses, porém têm técnica mais difícil e contêm CFC, que causa danos ambientais (isso mudará com a substituição para HFC). Apresentam ainda alta deposição da medicação na orofaringe e na boca, quando usado sem espaçador. A maioria dos estudos pediátricos que comparou essas duas modalidades de administração de fármacos na crise evidenciou igualdade de ambas ou superioridade da segunda, havendo uma tendência atual a um aumento de seu uso pelos pediatras, em função da praticidade e da aceitação por parte das crianças. |
Capítulo 1 – Definição e epidemiologia |
1 – O que é bronquiectasia? |
A definição de bronquiectasia é basicamente anatômica e refere-se a dilatação e distorção irreversível dos brônquios, em decorrência da destruição dos componentes elástico e muscular de sua parede. |
2 – O que é pseudobronquiectasia? |
A pseudobronquiectasia é a dilatação brônquica que surge em decorrência de processos inflamatórios agudos, mas, no entanto, é reversível. É geralmente cilíndrica e tem sua resolução após um período que varia de três meses a um ano. O conhecimento dessa situação é importante, pois evita investigações diagnósticas precoces e até mesmo a realização de procedimentos cirúrgicos desnecessários. |
3 – Qual a prevalência da bronquiectasia? |
Infelizmente, não há números precisos a respeito da prevalência de bronquiectasia. Isso ocorre em função de ser uma entidade freqüentemente sub-diagnosticada. Porém, sabe-se que a prevalência varia significativamente entre os países, sendo maior naqueles em que doenças infecciosas pulmonares, como a tuberculose, por exemplo, são mais comunsNúmeros extraídos de banco de dados dos Estados Unidos, entre 1999 e 2001 mostram as seguintes estimativas para esse país:
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Capítulo 2 – Fisiopatogenia, etiologia e classificação |
4 – Como se formam as bronquiectasias? |
Na patogenia da bronquiectasia há necessidade da presença de dois elementos:
Assim, quanto maior a virulência do agente agressor e quanto pior as condições de defesas locais e sistêmicas, maior a possibilidade de desenvolvimento de bronquiectasias. Isso, associado à resposta imune do próprio hospedeiro, promove a perpetuação do processo inflamatório local, com posterior destruição da parede brônquica. |
5 – O que é a teoria do círculo vicioso na patogênese da bronquiectasia? |
A teoria do círculo vicioso, proposta por Cole e Wilson, pressupõe que um evento inicial, que pode ser, por exemplo,uma infecção ou uma condição genética primária, compromete o mecanismo mucociliar de depuração. Isso faz com que o muco e as bactérias permaneçam por um maior tempo na árvore brônquica, levando a seleção natural das cepas mais virulentas, que lesam o epitélio ciliar. Posteriormente, surge um processo inflamatório crônico que reduz ainda mais a depuração brônquica, facilitando as infecções recorrentes e o aparecimento das bronquiectasias, que, por sua vez, predispõem a novas infecções, fechando o círculo vicioso (figura 1). |
6 – Quais são as principais etiologias das bronquiectasias? |
O desenvolvimento de bronquiectasia está relacionado a comprometimento do sistema de depuração muco-ciliar e agressão infecciosa. Na era pré-antibiótico e antes das campanhas vacinais, as infecções eram as principais causas de bronquiectasias. Atualmente, em indivíduos adultos, as formas idiopáticas são as mais comuns, sobretudo em países desenvolvidos. Em um estudo recente, 103 pacientes adultos com bronquiectasias foram investigados e 74% apresentavam a forma idiopática.Entre as crianças, a fibrose cística e os quadros pós-infecciosos são as causas mais comuns. Estudo realizado por Eastham e colaboradores avaliou 93 crianças com bronquiectasias não relacionadas à fibrose cística. Os resultados mostraram que as etiologias mais freqüentes foram: pós-pneumonia (30%), imunodeficiência (21%), idiopática (18%) e associada com bronquiolite obliterante (9%). Interessante nesse estudo foi que cerca de metade dos pacientes, antes da investigação, tinham, como diagnóstico, asma de difícil controle.Convém destacar que a tuberculose, independente da idade do paciente, é uma causa freqüente de bronquiectasia nas regiões em que essa infecção é endêmica. Veja na tabela 1 as possíveis etiologias das bronquiectasias. |
7 – O que é a discinesia ciliar primária? |
A discinesia ciliar primária é uma doença hereditária, que afeta 1 em cada 30.000 indivíduos, sendo caracterizada pela imobilidade ou disfunção dos cílios do epitélio que reveste a cavidade nasal, os seios paranasais, o ouvido médio, o trato respiratório inferior, os ventrículos cerebrais e as tubas uterinas. É comum estar associada a consangüinidade.No trato respiratório, o batimento ciliar é fundamental para a depuração das secreções brônquicas, bactérias e células fagocitadas. Como conseqüência da discinesia, o indivíduo apresenta repetidas infecções respiratórias com conseqüentes bronquiectasias difusas. Associadamente há o comprometimento da motilidade dos espermatozóides, levando com freqüência à esterilidade no homem. A associação de situs inversus totalis, bronquiectasias e sinusite recorrente ou polipose nasal recebe o nome de síndrome de Kartagener.Uma das maiores séries de pacientes com discinesia ciliar primária foi publicada por Noone e colaboradores e seus resultados estão na tabela 2. |
8 – O que é fibrose cística? |
A fibrose cística é uma doença hereditária, autossômica recessiva, caracterizada pelo acometimento multissistêmico de órgãos epiteliais. A doença provoca disfunção do transporte de cloro e um incremento da reabsorção de sódio, levando a um aumento na diferença de potencial elétrico transepitelial. De um modo simplificado, essas alterações comprometem o transporte de água, determinando a produção de secreções espessadas, que ocasionam as alterações clínicas nos diversos órgãos envolvidos. A doença não se manifesta de maneira homogênea em todos os pacientes, acometendo principalmente os pulmões, vias aéreas superiores, pâncreas, glândulas sudoríparas, trato biliar, intestinos e aparelho reprodutor.No pulmão, a secreção brônquica espessa provoca a obstrução das vias aéreas e subseqüentes infecções de repetição, com o aparecimento de bronquiectasias. As bronquiectasias localizam-se, inicialmente, no lobo superior direito e, com o progredir da doença, tornam-se difusas. São, geralmente, identificadas nas duas primeiras décadas de vida. Crianças com quadros infecciosos pulmonares recorrentes devem ter a fibrose cística entre as hipóteses diagnósticas. |
9 – Quais os agentes infecciosos mais relacionados ao desenvolvimento de bronquiectasias? |
Outrora, o sarampo e a coqueluche eram causas freqüentes de bronquiectasias, porém, com a extensa imunização, a importância dessas doenças entre as causas de bronquiectasias diminuiu. As infecções por vírus, principalmente adenovírus, têm potencial para gerar bronquiectasias. Estudos brasileiros mostraram que, na população pediátrica, a ocorrência de bronquiectasia após quadro de bronquiolite viral é relativamente comum. Uma série publicada por Santos e colaboradores revelou que entre 48 crianças que apresentaram bronquiolite obliterante infecciosa, 54% tiveram bronquiectasia como complicação pós-infecciosa.As infecções por bactérias provocadoras de processos necrotizantes, entre elas, o Staphylococcus aureus, a Klebsiella pneumoniae, a Pseudomonas aeruginosa, o Mycoplasma pneumoniae, os anaeróbios e o Mycobacterium tuberculosistambém são causas de bronquiectasias.A tuberculose, em nosso meio, ainda é uma doença infecciosa bastante comum. A infecção pelo BK pode gerar bronquiectasias pelo processo infeccioso brônquico em atividade ou por cicatrizes pulmonares de infecções prévias ou, ainda, por compressão brônquica por adenopatia hilar.Os fungos também contribuem para o surgimento de bronquiectasias, principalmente o Aspergillus fumigatus e oHistoplasma capsulatum. |
10 – O que é a aspergilose broncopulmonar alérgica? |
A aspergilose broncopulmonar alérgica (ABPA) é uma entidade clínica resultante de um estado de hiperimunidade, desencadeado pela presença do Aspergillus fumigatus nas vias aéreas inferiores. Deve ser suspeitada em pacientes asmáticos refratários à terapêutica. Classicamente a tosse associada à ABPA é descrita como produtiva e com expectoração de coloração marrom, eliminada sob a forma de moldes brônquicos, embora não é sempre que esta característica está presente.Na propedêutica encontram-se eosinofilia no sangue periférico, níveis elevados de IgE sérica e presença de anticorpos específicos contra o fungo. A ABPA leva ao desenvolvimento de bronquiectasias caracterizadas por sua localização central, fato pouco comum em bronquiectasias de outras etiologias. |
11 – O que é o seqüestro pulmonar? |
O seqüestro pulmonar é uma alteração congênita caracterizada por uma porção mal desenvolvida e não funcionante do tecido pulmonar, que apresenta comunicação normal com a árvore traqueobrônquica, porém com irrigação sanguínea proveniente da circulação sistêmica. Essa porção do tecido pulmonar freqüentemente contém dilatação brônquica, propiciando a ocorrência de infecções e o desenvolvimento de bronquiectasias. |
12 – Quais são as principais localizações das bronquiectasias? |
As bronquiectasias ocorrem, preferencialmente, nos lobos pulmonares com maior dificuldade de drenagem das secreções brônquicas. Assim, o lobo inferior esquerdo é o mais acometido, pois o brônquio esquerdo forma um ângulo mais agudo com a traquéia e seu diâmetro é mais estreito, em razão do cavalgamento que sofre da artéria pulmonar e da aorta.Todavia, a localização também depende da sua etiologia; desta forma, as bronquiectasias restritas a determinado segmento pulmonar geralmente estão relacionadas à aspiração de corpo estranho, à obstrução por tumores ou adenopatias ou à tuberculose, entre outras causas. Aquelas com envolvimento difuso do parênquima pulmonar tendem a estar relacionadas às causas sistêmicas, como imunodeficiência, fibrose cística, discinesia ciliar, entre outras. |
13 – Como podem ser classificadas as bronquiectasias? |
As bronquiectasias podem ser classificadas de acordo com:
Embora a classificação morfológica seja a mais comumente citada na literatura, sua aplicação prática é pequena, pois não há diferença clínica, fisiopatológica e epidemiológica entre as formas cilíndricas, císticas e varicosas. Por outro lado, a localização e a distribuição das bronquiectasias podem ser úteis na determinação da etiologia: lesões difusas sugerem processo sistêmico, enquanto bronquiectasias localizadas falam a favor de alterações locais. |
Capítulo 3 – Quadro clínico |
14 – Como é o típico paciente portador de bronquiectasia? |
O típico paciente portador de bronquiectasia é aquele indivíduo que apresenta, persistentemente, tosse produtiva, com expectoração mucopurulenta, em grande quantidade, principalmente pela manhã. A evolução da doença é crônica, meses a anos, e é intercalada por períodos de acentuação dos sintomas, com necessidade de uso freqüente de antibióticos. Assim, todo paciente com quadro crônico de tosse, principalmente produtiva, deve ter a bronquiectasia entre os diagnósticos diferenciais. Com o avançar da doença, há maior extensão do acometimento pulmonar, de tal forma que a dispnéia, acompanhada ou não de sibilância, passa ser uma queixa freqüente. Episódios de hemoptise de gravidade variável podem eventualmente acontecer. |
15 – Quais são os principais sintomas da bronquiectasia? |
King e colaboradores avaliaram retrospectivamente 103 indivíduos adultos portadores de bronquiectasias atendidos em um centro de referência. A tabela 3 lista os principais sintomas encontrados pelos autores.Entre os pacientes avaliados, o volume médio diário de escarro era de aproximadamente 40 ml e a persistência de tosse produtiva era o motivo inicial mais freqüente para buscar atenção médica especializada. |
16 – Quais são os principais achados do exame físico do paciente com bronquiectasias? |
Os achados no exame físico do paciente com bronquiectasias não são sensíveis e tão pouco específicos para essa entidade. Além disso, podem variar de acordo com o estágio em que se encontra a doença e a sua etiologia. A tabela 4mostra os achados de exame físico encontrados nos pacientes descritos por King e colaboradores.A evidência de perda de peso é um sinal comum na doença avançada, sendo que o IMC (índice de massa corpórea) é um dado importante a ser obtido no acompanhamento desses pacientes. |
17 – O que é bronquiectasia seca? |
Bronquiectasia seca é aquela que se manifesta por meio de episódios de hemoptise e com quase nenhuma produção de escarro. Geralmente, surge em decorrência de lesões de tuberculose, curadas e cicatrizadas, nos ápices pulmonares. Não há acúmulo de secreções em função da drenagem contínua promovida pela ação da gravidade. |
18 – Quais são as complicações relacionadas à bronquiectasia? |
A mais freqüente intercorrência clínica no paciente com bronquiectasia são as exacerbações infecciosas. Essas podem ser resultado de infecção restrita aos brônquios ou de uma pneumonia. Além disso, o paciente pode desenvolver, em menor freqüência, empiema, abscesso pulmonar, hemoptise volumosa e pneumotórax. Nas fases avançadas da doença pode surgir o cor pulmonale. |
19 – Como reconhecer uma exacerbação infecciosa de bronquiectasia? |
Na exacerbação infecciosa de bronquiectasia, tal qual na DPOC, o paciente apresenta aumento do volume e da purulência do escarro em relação ao habitual, bem como surgimento ou aumento (no caso dessa ser previamente existente) da dispnéia. Associadamente podem surgir sibilância, hemoptise e adinamia. Febre e calafrios são incomuns. A radiografia do tórax pode mostrar imagens alveolares nas regiões comprometidas por bronquiectasias. |
20 – Quais são os agentes infecciosos relacionados às exacerbações de bronquiectasia? |
A flora bacteriana, durante as exacerbações de pacientes com bronquiectasia, é bastante semelhante a dos pacientes com DPOC. Na fase inicial da doença, há um predomínio de infecções por Streptococcus pneumoniae e HaemophIius influenzae. Entretanto, com o evoluir da patologia e, principalmente, nos pacientes com fibrose cística, as bactérias multirresistentes, entre elas, a Pseudomonas aeruginosa e o Staphylococcus aureus, passam a colonizar as vias aéreas, exercendo um papel importante nas agudizações. |
Capítulo 4 – Diagnóstico |
21 – Como deve ser feita a avaliação diagnóstica das bronquiectasias? |
Como a bronquiectasia consiste em uma alteração anatômica, a confirmação de sua presença requer um exame de imagem: radiografia simples do tórax, tomografia computadorizada de alta resolução do tórax ou broncografia.Após o diagnóstico da bronquiectasia, os próximos passos são identificar a possível etiologia, direcionada de acordo com a apresentação clínica, e avaliar o estado funcional do paciente, ou seja, o impacto da doença sobre o seu estado de saúde. Importante destacar que em menos de 50% dos casos, mesmo após extensa investigação, a etiologia é definida. |
22 – Quais são as possíveis alterações na radiografia simples de tórax nos pacientes com bronquiectasias? |
A radiografia de tórax é um método de baixa sensibilidade e especificidade no diagnóstico de bronquiectasias, 88% e 74%, respectivamente, segundo alguns autores. No passado, em função do grande número de casos avançados, as radiografias geralmente eram anormais. Com a diminuição do número de pacientes com doença grave, pelo menos nos países desenvolvidos, e com a disponibilidade da tomografia computadorizada de alta resolução (TCAR) para identificar precocemente os casos leves de bronquiectasias, trabalhos mais recentes mostraram que a radiografia freqüentemente é normal ou evidencia achados inespecíficos.As alterações na radiografia de tórax de pacientes com bronquiectasias podem ser caracterizadas em:Sinais diretos
Sinais indiretos
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23 – Qual o papel da tomografia computadorizada de tórax no diagnóstico das bronquiectasias? |
A tomografia computadorizada de alta resolução (TCAR) tornou-se o método diagnóstico de escolha na suspeita de bronquiectasias, alcançando uma sensibilidade de 97%, bem superior à da radiografia de tórax. A figura 5 exemplifica um caso em que a radiografia apresenta alterações discretas, que poderiam passar despercebidas, enquanto a TC não deixa dúvidas sobre a existência de bronquiectasias no lobo médio.A TCAR permite também identificar ou afastar outras doenças, bem como orientar a terapêutica cirúrgica. É importante destacar que ela caracteriza-se pela reconstrução espacial da imagem e pela realização de cortes finos (1 a 3 mm), visualizando, assim, as vias áreas distais. |
24 – Quais as alterações na tomografia de tórax de pacientes com bronquiectasias? |
As alterações na tomografia de tórax sugestivas de bronquiectasias são:
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25 – O que é bronquiectasia de tração? |
Bronquiectasia de tração é um termo utilizado para descrever a dilatação brônquica que surge em função da retração do parênquima, provocada por fibrose pulmonar. É tipicamente um achado de imagem e na maior parte dos casos não apresenta as características clínicas das bronquiectasias propriamente ditas. |
26 – Qual o papel da broncografia no diagnóstico das bronquiectasias? |
A broncografia é um exame radiológico da árvore brônquica que utiliza a aplicação de contraste iodado nos brônquios por meio de um cateter ou por broncoscopia, permitindo a identificação adequada das bronquiectasias. Atualmente, no entanto, é raramente realizada, pois é um exame invasivo, não isento de complicações, apresenta dificuldades técnicas na sua realização e, principalmente, pelo surgimento da tomografia computadorizada de alta resolução. |
27 – Quais são as alterações encontradas na avaliação funcional pulmonar nos pacientes com bronquiectasias? |
Do ponto de vista espirométrico, caracteristicamente, os pacientes com bronquiectasias apresentam distúrbio ventilatório obstrutivo (VEF1 reduzido com redução da relação VEF1/CVF). Nas fases avançadas da doença, porém, a caracterização do distúrbio pela espirometria pode ser dificultada em função da redução concomitante da CVF (capacidade vital forçada). Nestes casos, para a caracterização precisa do distúrbio ventilatório torna-se necessária a avaliação dos volumes pulmonares (volume residual e capacidade pulmonar total).A gasometria, nas fases mais avançadas da doença, pode mostrar hipoxemia e, mais rara e tardiamente, hipercapnia. O comprometimento da membrana alvéolo-capilar, também em fases mais avançadas da doença, pode ser evidenciado pela redução da difusão do monóxido de carbono (DLCO). |
28 – Qual é o papel da broncoscopia nos pacientes com bronquiectasias? |
A broncoscopia não tem valor como exame diagnóstico de bronquiectasia, porém, permite o reconhecimento de uma possível obstrução brônquica (corpo estranho, neoplasia), geradora do processo patogênico. Além disso, contribui na localização de segmento broncopulmonar responsável por hemoptise, sintoma que com freqüência associa-se à bronquiectasia. Assim, a broncoscopia estará sempre indicada na investigação de bronquiectasia localizada e de hemoptise. |
29 – Como é feito o diagnóstico da discinesia ciliar primária? |
O diagnóstico é confirmado pelo estudo, por microscopia, do epitélio ciliar obtido por biópsia ou escovado do tecido brônquico ou nasal. Por meio de método especial de microscopia óptica, é analisada a freqüência dos batimentos ciliares (reduzida ou ausente) e, pela microscopia eletrônica, é avaliada a estrutura dos cílios, que é anormal. O exame não deve ser feito na vigência de infecção respiratória, bacteriana ou viral, pois pode resultar em falso positivo.Na impossibilidade de serem feitos tais estudos microscópicos, frente à suspeita clínica, em homens na idade reprodutiva, pode ser feita a análise da motilidade dos espermatozóides, sendo que a evidência de disfunção da mesma contribuiu para a confirmação diagnóstica da discinesia ciliar. |
30 – Como é confirmado o diagnóstico de fibrose cística? |
Na prática, o diagnóstico de fibrose cística é fornecido, na maioria das vezes, pela análise iônica quantitativa do suor estimulado pela pilocarpina. Valores de sódio e de cloro no suor acima de 60 mEq/l confirmam a doença. A coleta do suor por outras técnicas que não a iontoforese com pilorcapina não tem valor diagnóstico.Segundo consenso da CF Foundation, fundação norte-americana que normatiza o atendimento a esses pacientes nos Estados Unidos e Canadá, o diagnóstico da fibrose cística pode ser firmado pelos seguintes critérios: presença de uma ou mais das características fenotípicas, ou da história de um irmão com a doença ou do teste de triagem neonatal alterado, associados à evidência laboratorial da doença (dosagem de eletrólitos no suor aumentada, identificação de duas mutações que sabidamente causem fibrose cística ou diferença de potencial elétrico nasal aumentada). É importante um alto nível de suspeição e um dos grandes enganos é considerar uma criança com apenas algumas das manifestações, com aparência relativamente saudável, como não sendo portadora da doença.Maiores detalhes sobre fibrose cística podem ser obtidos no capítulo específico sobre a doença. |
31 – Que outros exames podem ser úteis na avaliação do paciente com bronquiectasia? |
De acordo com a suspeita clínica, a investigação complementar será dirigida para tentar identificar a etiologia e possíveis complicações. Desta forma, a dosagem de imunoglobulinas, provas para colagenose, pesquisa de anticorpos contraAspergillus, biópsia do epitélio respiratório, dosagem de sódio e cloro no suor, tomografia de seios da face, cultura de escarro, podem ser úteis durante a propedêutica. A avaliação do estado nutricional também é muito importante. |
Capítulo 5 – Tratamento |
32 – Quais são os objetivos da terapêutica dos pacientes com broquiectasia? |
A terapêutica dos pacientes portadores de bronquiectasias deve ter como objetivos melhorar os sintomas e evitar ou reduzir a progressão da doença. Para isso é importante, sempre que possível:
É interessante ressaltar que a literatura é extremamente pobre em estudos sobre bronquiectasias, o que torna grande parte das condutas utilizadas ainda sem evidência científica suficiente para recomendá-las. |
33 – Por que há preocupação em tratar adequadamente as infecções intercorrentes nos pacientes com bronquiectasia? |
Como foi descrito na fisiopatogenia das bronquiectasias, a infecção exerce papel primordial no desenvolvimento e na perpetuação das lesões de bronquiectasia. Desta forma, ao reduzir ou eliminar a carga bacteriana estamos interferindo de maneira positiva na evolução da doença, pois há redução da inflamação local e o circulo vicioso (infecção → mais bronquiectasia → mais infecção) é, pelo menos temporariamente, interrompido. |
34 – Quais são as opções de antimicrobianos na terapêutica das exacerbações infecciosas de bronquiectasia? |
O esquema antimicrobiano, geralmente empírico, vai ser baseado na gravidade da doença. Nos pacientes que apresentam doença mais leve, os principais agentes das exacerbações são o Streptococcus pneumoniae e Hemophilus influenzae. Desta forma, a associação de betalactâmico com inibidor de betalactamase, cefalosporinas de segunda geração, macrolídeos ou quinolona respiratória (moxifloxacino, gemifloxacino ou levofloxacino) constituem boas opções terapêuticas.Com o avançar da doença, a flora bacteriana brônquica sofre mudanças e bactérias mais virulentas passam a ser responsáveis pelas exacerbações. Assim, nesta fase, a cobertura contra Pseudomonas aeruginosa e Staphylococcus aureus passa a ser uma preocupação, pois o ciprofloxacino constitui-se na única opção para o tratamento por via oral e geralmente após um ou dois ciclos desse antibiótico ocorre o desenvolvimento de resistência bacteriana.Os pacientes com doença grave que não respondem ao tratamento com a quinolona oral ou que apresentam exacerbação de maior intensidade devem ser hospitalizados e receber antibioticoterapia parenteral, com agentes com ação anti-pseudomonas: cefatzidima, cefepime, ticarcilina/clavulanato, piperacilina/tazobactam, aztreonam, imipenem ou meropenem. Quando for identificado o S. aureus, deve-se utilizar a oxacilina ou, de acordo com o antibiograma, a vancomicina.É importante que os indivíduos que apresentam infecções recorrentes ou nos quais há suspeita de colonização bacteriana sejam submetidos à avaliação microbiológica do escarro, que servirá como guia da terapêutica antimicrobiana. Outro dado importante é que na escolha do antibiótico deve-se preferir aqueles com melhor penetração pulmonar, como macrolídeos e quinolonas. |
35 – Em que se baseia a utilização de regimes antimicrobianos preventivos nos pacientes com bronquiectasia? |
Teoricamente, a utilização de regimes de antibióticos, ditos preventivos ou supressivos, promoveria a diminuição da carga bacteriana nas vias aéreas de indivíduos cronicamente colonizados e, assim, reduziria o número de agudizações e a progressão da doença. Três estratégias de profilaxia com antimicrobianos foram descritas:
O uso de regime profilático com antimicrobiano oral por pacientes com bronquiectasia purulenta foi avaliado em meta-análise do grupo Cochrane. Foram identificados seis estudos que incluíram 302 pacientes. Os resultados de cinco estudos foram positivos em relação à redução do volume e da purulência do escarro, porém nenhum efeito foi demonstrado sobre a freqüência de exacerbações, função pulmonar e sobrevida. Por outro lado, estudo recente com 30 pacientes mostrou que os que receberam 500 mg de azitromicina, duas vezes na semana, durante seis meses, apresentaram redução no número de exacerbações, quando comparados com indivíduos que receberam tratamento habitual. Alguns estudos isolados mostraram que, em indivíduos colonizados por Pseudomonas, a utilização de tobramicina inalada reduziu a carga bacteriana e promoveu melhora das condições clínicas dos pacientes. No momento, ainda não existe evidência científica suficiente para se recomendar de forma absoluta o uso de regimes profiláticos. No entanto, em termos práticos, pode-se optar por algum desses regimes em pacientes que, apesar da otimização da terapêutica habitual, apresentam exacerbações freqüentes. A escolha do antimicrobiano deve ser guiada pela cultura do escarro. Uma boa opção é utilizar um macrolídeo por via oral (por exemplo, claritromicina 500 mg/dia), pois além do efeito antimicrobiano, essa classe possui ação antiinflamatória que pode ser benéfica nos pacientes com bronquiectasias. |
36 – Qual o papel da fisioterapia no tratamento de pacientes com bronquiectasia? |
A fisioterapia é parte fundamental no tratamento dos pacientes com bronquiectasias. Por meio de manobras, em especial de drenagem postural (técnica que se utiliza da gravidade para acentuar a drenagem das secreções de determinado segmento pulmonar), promove-se um aumento na depuração das secreções brônquicas. Embora os estudos sobre os benefícios da fisioterapia sejam ainda insuficientes, do ponto de vista prático, ela parece ser benéfica.Para que a drenagem postural tenha eficácia, é necessário que seja feita de maneira regular, pelo menos diariamente e que tenha duração de 15 a 30 minutos por sessão. Manobras adicionais, como a tapotagem e a utilização de “flutter”, parecem eficazes. |
37 – Qual o papel da reabilitação pulmonar para pacientes com bronquiectasias? |
A reabilitação pulmonar é uma intervenção multiprofissional para pacientes com doenças respiratórias crônicas que sejam sintomáticos e freqüentemente tenham diminuição das atividades da vida diária. Faz parte de um programa de reabilitação os seguintes pontos: estabelecimento do diagnóstico preciso da doença principal e outras doenças associadas, tratamento farmacológico, nutricional e fisioterápico, recondicionamento físico, apoio psicossocial e educação.O papel da reabilitação pulmonar no tratamento de pacientes com bronquiectasia foi avaliado em um único ensaio randomizado e controlado. O estudo mostrou que pacientes submetidos a um programa de oito semanas apresentaram melhora na tolerância à atividade física, quando comparados a indivíduos do grupo controle. Com o objetivo de promover melhora no desempenho físico e na qualidade de vida, os pacientes com bronquiectasias que apresentam algum grau de limitação imposta pela doença deveriam ter a oportunidade de participar de um programa de reabilitação pulmonar. |
38 – Qual o papel dos broncodilatadores nos pacientes portadores de bronquiectasias? |
O mecanismo de obstrução ao fluxo aéreo encontrado em pacientes com bronquiectasia não está bem esclarecido. No entanto, algum grau de hiperreatividade das vias aéreas, provavelmente por inflamação da parede brônquica, está geralmente presente. Desta forma, o uso dos broncodilatadores promoveria alívio dos sintomas e, talvez, melhora na drenagem dos brônquios. Porém, não há ainda estudos randômicos e controlados avaliando o efeito desses medicamentos em pacientes com bronquiectasia não relacionada à fibrose cística. Assim, a decisão sobre prescrever broncodilatadores deve ser individualizada e, quando ocorrer, deve ser reavaliada clinicamente. |
39 – Qual o papel do corticóide sistêmico na terapêutica dos pacientes com bronquiectasia? |
O processo inflamatório brônquico é peça chave na patogenia das bronquiectasias, assim, o uso de agentes antiinflamatórios poderia, teoricamente, ser benéfico no seu tratamento. Por outro lado, os corticóides sistêmicos poderiam reduzir a imunidade e, conseqüentemente, aumentar a colonização bacteriana da árvore brônquica, além de todos os outros efeitos colaterais a eles atribuídos.Não há na literatura estudos randômicos e controlados que embasem recomendações sobre o uso de corticóides sistêmicos na exacerbação ou na fase estável da bronquiectasia. Apesar disso, em termos práticos, o corticóide sistêmico poderia ser colocado como uma opção no tratamento adjuvante da exacerbação, sobretudo quando o paciente evolui com dispnéia e sibilos. |
40 – Qual o papel dos corticóides inalados na terapêutica dos pacientes com bronquiectasia? |
Os estudos abordando a corticoterapia inalatória na bronquiectasia ainda são escassos e a grande maioria envolve pacientes portadores de fibrose cística. Meta-análise realizada pelo grupo Cochrane para avaliar o efeito do corticóide inalado em pacientes com fibrose cística identificou apenas 10 estudos randômicos e controlados por placebo, envolvendo um total de 293 pacientes. Os estudos eram heterogêneos e não puderam ser analisados em conjunto. No entanto, quando os ensaios foram analisados individualmente, concluiu-se que a corticoterapia inalatória não foi superior ao placebo na maioria das variáveis de eficácia estudadas (função pulmonar, hospitalização, uso de antibiótico venoso, tolerância ao exercício, estado nutricional e qualidade de vida). Em um único estudo se encontrou pequena, porém significante estatisticamente, melhora da tosse e da dispnéia. Tal fato não foi identificado nos demais estudos. A taxa de sobrevida não foi relatada em nenhum dos trabalhos analisados. Por outro lado a incidência de eventos adversos, nos dois trabalhos que relataram tal desfecho, foi significativamente superior entre os pacientes que utilizaram o corticóide, inclusive com aumento da colonização por Pseudomonas aeruginosa.Em relação ao uso do corticóide inalado em pacientes com bronquiectasia não portadores de fibrose cística, a carência de evidências é ainda maior. Em 2005, Tsang e colaboradores divulgaram o resultado do maior estudo, randômico e controlado por placebo, envolvendo o uso de corticóide inalado nesses pacientes. Os 86 participantes do estudo receberam 1.000 mcg/dia de fluticasona ou placebo por 52 semanas. Os resultados foram decepcionantes e o único dado positivo foi redução no volume do escarro em um subgrupo de doentes. Não foi demonstrado qualquer impacto em relação à exacerbação, purulência do escarro ou função pulmonar.No momento, não há ainda evidência científica que suporte ou refute a indicação de corticóide inalado para os portadores de bronquiectasia, de tal forma que a decisão de se prescrever essa classe de medicamentos deve ser individualizada. |
41 – Quais são as outras opções medicamentosas no tratamento dos pacientes com bronquiectasias? |
A tabela 5 lista algumas opções medicamentosas não convencionais para o tratamento das bronquiectasias. |
42 – Quais vacinas devem ser recomendadas nos pacientes com bronquiectasia? |
Os pacientes com bronquiectasia devem receber as vacinas contra influenza anualmente e pneumococo a cada 5 anos, como parte da profilaxia das agudizações infecciosas. |
43 – Qual o papel da cirurgia na terapêutica dos pacientes com bronquiectasia? |
O tratamento cirúrgico da bronquiectasia é bem indicado nos pacientes com boa reserva funcional pulmonar, em que a doença é localizada e não há melhora dos sintomas com as medidas clínicas e, também, nos pacientes com hemoptises.Naqueles casos em que a doença é difusa, o tratamento é, tradicionalmente, conservador. No entanto, nas situações em que o tratamento clínico não está apresentando boa resposta e o indivíduo apresenta determinado segmento pulmonar com maior comprometimento (maior supuração), discute-se se a ressecção dessa região não reduziria os sintomas. |
44 – Existe indicação para o transplante pulmonar em pacientes com bronquiectasia? |
Pacientes com bronquiectasias difusas, em que há grande comprometimento funcional pulmonar e da qualidade de vida, são potenciais candidatos para realização de transplante pulmonar. A sobrevida dos pacientes com fibrose cística transplantados é de 70% no primeiro ano e 49% após quatro anos. Não há dados disponíveis para os outros tipos de bronquiectasia. |
1 – Qual a definição de bronquiolite obliterante? |
Bronquiolite obliterante (BO) é uma doença que acomete principalmente as vias aéreas de menor calibre (bronquíolos) e que se caracteriza por ser uma condição obstrutiva crônica com diversas etiologias. Nesta revisão vamos enfocar apenas a BO pós-nfecciosa. Em pediatria essa doença geralmente ocorre em lactentes a partir de uma infecção aguda grave, geralmente viral, que determina um quadro que cursa com insuficiência ventilatória. A maioria das crianças necessita de internação em UTI, muitas necessitam de ventilação mecânica. A evolução costuma ser aguda na sua fase inicial e, posteriormente, a criança fica dependendo de oxigênio por várias semanas ou até anos (nos casos mais graves). Os agentes etiológicos mais frequentes são o Adenovirus, o Vírus Respiratório Sincicial, o Influenza, o Parainfluenza e oMicoplasma pneumoniae. |
2 – Como ocorre o quadro ventilatório obstrutivo na bronquiolite obliterante? |
Na fase aguda, após a agressão à via aérea, membranas hialinas, células epiteliais descamadas e células inflamatórias preenchem o lúmen dos bronquíolos, predominantemente, nos bronquíolos terminais. Em associação ao processo de reparo, que segue a inflamação e a lesão do epitélio do bronquíolo, há proliferação de fibroblastos e deposição de colágeno, resultando na formação de fibrose. Formam-se massas polipóides que obliteram o lúmen da via aérea, completa ou parcialmente. Esse processo se dá ao longo do feixe axial da via aérea, diminui a ventilação colateral e causa obstrução ao fluxo aéreo. Devido à obstrução da via aérea, ocorre hiperinsuflação, áreas de atelectasias, diminuição da mobilização das secreções e bronquiectasias. A hipoventilação pulmonar resultante desses eventos causa vasoconstrição reflexa e hipodesenvolvimento dos vasos pulmonares, que estão reduzidos de calibre. Alterações enfisematosas secundárias à obstrução da via aérea também podem estar presentes na porção de pulmão envolvido. |
3 – Quais são os fatores de risco para o desenvolvimento de bronquiolite obliterante? |
Poucos estudos longitudinais conseguiram estabelecer fatores de risco bem precisos para essa doença. Num estudo feito na Argentina, pode-se estabelecer que infecção por adenovirus e necessidade de ventilação mecânica no agravo inicial foram fortemente associados com maior risco de desenvolver BO. Em várias outras séries publicadas em outros centros, fatores como sexo, idades inferiores a 12 meses contribuíram para maior risco de evolução para BO. A possível influência negativa do tabagismo materno durante e após a gestação ainda não pôde ser comprovada, embora seja muito provável. |
4 – Quais são as principais etiologias de bronquiolite obliterante? |
As principais causas de bronquiolite obliterante estão listadas na tabela 1. |
5 – Quais são os dados de história que devem ser colhidos para se estabelecer a hipótese diagnóstica de bronquiolite obliterante? |
Os principais dados sugestivos de bronquiolite obliterante são:
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6 – Quais os achados relevantes de exame físico que podem apontar para o diagnóstico de bronquiolite obliterante? |
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7 – Qual a importância dos exames subsidiários para o diagnóstico de bronquiolite obliterante? |
Na fase aguda é de grande importância a identificação do vírus causador da bronquiolite. Os métodos mais utilizados são a imunofluorescência direta ou indireta e a reação em cadeia de polimerase. O exame cultural viral é demorado e poucos centros o realizam, porém, para se conhecer melhor a epidemiologia de surtos de infecção pelo Adenovirus, seria muito importante saber quais subtipos do vírus encontram-se em circulação causando a bronquiolite obliterante. |
8 – Qual o papel do radiograma de tórax no diagnóstico de bronquiolite obliterante (BO)? |
O radiograma de tórax pode ajudar a excluir outras causas de obstrução aguda ou crônica, mas serve principalmente para identificar complicações como atelectasias ou bronquiectasias. No tema sobre “lactente sibilante” encontram-se detalhes sobre o diagnóstico diferencial através da radiografia de tórax. Um exame com áreas hipoperfundidas, com hiperinsuflação persistente e atelectasias com bronquiectasias pode sugerir bronquiolite obliterante. |
9 – Qual o papel da tomografia computadorizada de tórax de alta resolução (TCAR) no diagnóstico de bronquiolite obliterante (BO)? |
A TCAR é considerada, atualmente, o padrão diagnóstico de BO, quando associada aos achados clínicos típicos, pois permite evidenciar alterações em vias aéreas de pequeno calibre:
As imagens obtidas com o paciente em expiração reforçam a impressão de alçaponamento aéreo nas áreas acometidas. |
10 – Qual a indicação da cintilografia pulmonar perfusional na bronquiolite obliterande (BO)? |
A cintilografia pulmonar pode demonstrar as alterações segmentares na perfusão pulmonar, alterações essas típicas em BO. Entretanto esses achados são os que se identificam na TCAR com maior detalhe. Considerando-se que esse exame aciona radiação sem acrescentar novos elementos diagnósticos, seu uso tem sido limitado. Crianças com suspeita diagnóstica sem condições de realização de TCAR poderiam ser beneficiadas com esse exame. |
11 – Qual o papel da avaliação de função pulmonar de lactentes? |
Um exame recentemente desenvolvido que pode ajudar no melhor entendimento da sibilância em lactentes é a função pulmonar. Ainda é um exame de pouca disponibilidade e sua utilização na prática clínica parece distante. Em centros de referência terciária poderá se tornar um exame útil. A técnica mais utilizada é a da compressão do tórax com jaqueta, com uma máscara facial adaptada a um pneumotacógrafo. Obtêm-se assim curvas fluxo-volume semelhantes àquelas obtidas em espirometria convencional. Esta técnica já é disponível em alguns centros da América Latina (Chile, Argentina) e no Brasil (Porto Alegre, São Paulo). |
12 – A biópsia pulmonar é o padrão-ouro para o diagnóstico de bronquiolite obliterante (BO)? |
O padrão-ouro para o diagnóstico de BO é a biópsia pulmonar. Entretanto, algumas limitações fazem com que sua indicação seja restrita a casos específicos. Uma grande limitação é que é um procedimento de risco em crianças que já estão em situação clínica instável. Além disso, a doença se caracteriza por apresentar alterações focais e áreas próximas sem acometimento, o que pode determinar biópsias em tecido normal o que não resultaria em confirmação diagnóstica. Se realizada a biópsia mostra oclusão parcial ou total do lúmen dos bronquíolos respiratórios e terminais por tecido inflamatório e por fibrose. Considera-se, portanto, a realização de biópsia em casos selecionados onde o diagnóstico não possa ser feito em bases clínicas e por imagem (TCAR). |
13 – Como se faria então o diagnóstico de bronquiolite obliterante pós-infecciosa? |
A história de uma infecção viral aguda grave em lactentes, com quadro de bronquiolite e/ou pneumonia viral, com internação, necessidade de suporte ventilatório, permanência de quadro obstrutivo ventilatório contínuo, com TCAR típica, com exclusão de doenças com padrão semelhante (fibrose cística, asma, doença do refluxo gastroesofágico) permitem definir o diagnóstico de bronquiolite obliterante. Quadros menos graves também ocorrem e não necessariamente excluem o diagnóstico. Pacientes com síndrome de Mac Leod podem ter quadro menos graves e o diagnóstico ser tardio, caracterizando-se por doença pulmonar obstrutiva crônica com função pulmonar mostrando perfil obstrutivo sem melhora significativa com broncodilatador. |
14 – Qual o tratamento da bronquiolite obliterante? |
Acredita-se que a reação inflamatória aguda que ocorre nos 2 primeiros meses de doença poderia responder ao uso de medicação antiinflamatória, havendo relatos desta resposta em número pequeno de casos com corticoides. A segurança dos corticoides inalatórios tem sido muito discutida na faixa etária pediátrica. Os estudos apontam para vantagem de seu uso em crianças asmáticas com crises frequentes, graves e que determinam uso de costicoides orais. Os efeitos colaterais mais temidos são aqueles relacionados com o crescimento. Estudos de longo prazo com uso de esteroides inalados em doses baixas ou moderadas têm mostrado que eles não interferem no crescimento final. Em lactentes não há estudos que possam embasar seu uso com segurança. No entanto, em lactentes com perfil sugestivo de asma, com sintomatologia intensa e necessidade frequente de esteroides orais, o corticoide inalatório pode ser usado com cautela, por períodos limitados, através de espaçadores valvulados e com controle clínico estrito. |
15 – Qual o papel da pulsoterapia em bronquiolite obliterante? |
Como em outras doenças com perfil de inflamação intensa e reação imunológica provável, a pulsoterapia tem sido indicada sem que haja estudos que possam respaldá-la cientificamente. Entretanto, parece que se justificaria naqueles casos em que a doença encontra-se nos primeiros meses, evoluindo do padrão inflamatório proliferativo para o constritivo (onde predomina fibrose). Clinicamente são crianças com evolução grave, dependentes de oxigênio nos primeiros meses de doença.Quando indicada, a pulsoterapia é feita na dose de 10 mg/kg de metilprednisolona por 3 dias, intravenosa, repetindo-se um ciclo por mês por 3 a 6 meses. Nossa prática tem sido tentar até 3 ciclos de 3 dias. Deve-se ter cautela com efeitos colaterais das altas doses de corticóide sistêmico. |
16 – Que outro medicamento poderia ser usado no tratamento da bronquiolite obliterante? |
Recentemente, a partir de estudos com pacientes com panbronquiolite e em BO pós transplante, tem-se considerado o uso de azitromicina como tratamento antiinflamatório, assim como o referido em relação à pulsoterapia. Também não há estudos que possam definir sua indicação. Temos utilizado na dose de 10 mg/kg em dias alternados. Verificamos indicadores clínicos, como redução de sintomas, e de função pulmonar (nos que podem realizar espirometria), para monitorar a resposta. |
17 – Qual o tratamento para as bronquiectasias associadas à bronquiolite obliterante? |
Crianças com bronquiectasias localizadas com colapso pulmonar segmentar ou lobar podem ter benefício acentuado com a remoção cirúrgica. Em nosso serviço, em torno de 20% dos pacientes necessitaram lobectomia. Em dois pacientes com comprometimento total de um pulmão, a pneumonectomia foi necessária. Nos pacientes sem bronquiectasias nas áreas pulmonares remanescentes, o resultado clínico foi evidente. Nos casos em que bronquiectasias difusas são evidentes, só se pode oferecer tratamento paliativo. Fisioterapia respiratória acompanhada de antibiótico nas exacerbações auxilia na estabilização clínica. Infelizmente nesses casos a redução da função pulmonar ocorre, assim como limitações para atividades, o que determina redução da qualidade de vida. Reabilitação pulmonar pode ajudar muitos pacientes a terem melhor desempenho em suas atividades. Estudos longitudinais em nossos pacientes mostram tolerância aceitável aos exercícios em testes cárdio-pulmonares. |
18 – Há indicação de transplante pulmonar na bronquiolite obliterante? |
Pacientes com redução da função ventilatória com incapacidade de realização de atividades físicas mínimas podem ser indicados para transplante pulmonar. Crianças oxigeno-dependentes por mais de 2 anos teriam indicação precoce de transplante. Pode se considerar nesses casos a utilização de transplante intervivos, técnica que impõe considerações éticas, mas permite uma série de vantagens, tais como ausência de tempo de espera, ato cirúrgico programável, menor chance de rejeição). |
19 – Qual a evolução de longo prazo de pacientes com bronquiolite obliterante? |
A evolução de longo prazo em bronquiolite obliterante é um assunto bastante recente, pois os casos iniciais ocorreram em microepidemias no final da década de 80 e no início dos anos 90. Excetuando-se os pacientes com gravidade precoce e que não melhoraram nos dois primeiros anos (oxigenodependentes, óbito), a evolução de longo prazo dos pacientes com famílias colaborativas e com adesão ao tratamento é bastante boa. Atualmente, diversos pacientes estão sendo transferidos para clínica de adultos com aceitável qualidade de vida. Entretanto, ao considerarmos a inexorável perda progressiva de função pulmonar do adulto, pode-se prever piora com o avançar da idade. |
1 – Qual a definição de bronquite aguda? |
Trata-se de uma inflamação autolimitada dos brônquios que ocorre frequentemente após uma infecção viral das vias aéreas superiores. A apresentação habitual é um quadro de tosse, seca ou produtiva, mucoide ou purulenta, que dura mais de 5 dias (tipicamente, uma a três semanas). |
2 – Quais os dados estatísticos disponíveis acerca de sua incidência? |
Nos Estados Unidos, a tosse é o sintoma que mais motiva a procura a assistência médica e a bronquite aguda é o diagnóstico mais realizado. Estima-se que lá aproximadamente 5% dos adultos relatam um episódio de bronquite por ano e até 90% dessas pessoas procuram assistência médica, totalizando mais de 10 milhões de consultas anuais secundárias a um quadro de bronquite aguda. |
3 – Como diferenciá-la de uma simples infecção de vias aéreas superiores? |
Frequentemente, a bronquite aguda não pode ser diferenciada de uma IVAS nos primeiros dias dos sintomas. A suspeita desse diagnóstico deve ser feita com a persistência da tosse após o 5º dia. Tosse acompanhada por sintomas de vias aéreas superiores, como dor de garganta e rinorreia, presentes nas IVAS, são habitualmente usados para caracterizar a tosse associada a essa condição. |
4 – Quais os principais agentes etiológicos envolvidos? |
Os agentes etiológicos mais comuns são os vírus influenzae A e B, parainfluenzae, coronavírus (tipos 1-3), rinovírus e vírus sincicial respiratório. Séries de casos que pesquisaram a etiologia da bronquite aguda em indivíduos sem pneumopatia prévia definiram o agente etiológico em uma minoria dos casos (29-42% em um estudo e 16% de 113 pacientes em outro). Vírus foram os mais identificados em ambos estudos. |
5 – Bactérias podem causar bronquite aguda? |
Sim, embora menos comumente que os vírus. Dados do CDC informam que acima de 90% dos casos não são de origem bacteriana. As bactérias que podem estar envolvidas são Mycoplasma pneumoniae, Chlamydia pneumoniae e Bordetella pertussis. Um estudo que revisou todas as publicações sobre o tema ente 1966 e 1995 mostrou que esses três patógenos foram os únicos agentes bacterianos associados às bronquites agudas de pessoas previamente hígidas. Embora tenha sido sugerido que bactérias causadoras de pneumonia (tais como, Streptococcus pneumoniae, Haemophilus influenzae, Staphylococcus aureus, Moraxella catarrhalis ou bacilos gram-negativos) possam estar envolvidas, não há convincente evidência de suas participações em bronquites agudas em adultos. Exceções seriam os pacientes traqueostomizados, intubados ou aqueles com exacerbação de uma bronquite crônica. |
6 – A coloração do escarro pode diferenciar uma infecção bacteriana de uma viral? |
Não. A presença de secreção purulenta não é um preditor de infecção bacteriana. Escarro purulento está presente em 50% dos casos de bronquite aguda. Ele representa usualmente a mudança das células do epitélio traqueobrônquico em meio ao processo inflamatório. Dessa forma, purulência do escarro não significa infecção bacteriana, ao contrário do que comumente é difundido. Convém ressaltar que não estamos abordando nesse capítulo a exacerbação de uma bronquite crônica, o que é discutido no tema “DPOC: exacerbação”. |
7 – Qual a doença causada pela Bordetella pertussis? |
Bordetella pertussis e Bordetella parapertussis são os agentes etiológicos da coqueluche, pertussis ou tosse convulsiva. É uma doença altamente contagiosa, que foi tradicionalmente considerada uma infecção da infância. No entanto, a incidência em adultos vem aumentando. A despeito do aumento da incidência mundial nos últimos 15 a 20 anos, incluindo os Estados Unidos, Bordetella pertussis é responsável por somente 1% dos casos de bronquite aguda nesse país. Estudo realizado em São Francisco com 153 adultos com tosse persistindo por, no mínimo, duas semanas encontrou que 12% desses pacientes tiveram evidência de coqueluche. No entanto, o diagnóstico não foi especificamente suspeitado em nenhum dos participantes do estudo. |
8 – Qual a apresentação clínica da bronquite aguda? |
Conforme já mencionado, é uma doença respiratória autolimitada, manifestada predominantemente por tosse, com ou sem expectoração, podendo ser essa mucoide ou purulenta, durando habitualmente não mais que 3 semanas, quando então outros diagnósticos diferenciais deveriam ser considerados como, por exemplo, tosse pós-infecciosa, tosse devido à rinossinusite, asma e doença do refluxo gastroesofágico.Muitos pacientes com bronquite aguda também têm traqueíte. Os sintomas de envolvimento da traqueia incluem dor subesternal em queimação associada à respiração e uma forte dor subesternal com tosse. Roncos e crepitações podem ser ouvidos à ausculta do tórax, no entanto, não há sinais de consolidação e radiografia de tórax não mostra opacidade. Sibilos podem ou não estar presentes.Febre é incomum e, quando presente, sugere gripe ou pneumonia. A radiografia de tórax ajudará na diferenciação entre bronquite aguda e pneumonia.Frequentemente, os pacientes apresentam broncoespasmo, evidenciado pela redução do VEF1 ou pela hiperreatividade no teste de broncoprovocação. Essa tipicamente melhora dentro de 5 a 6 semanas.A maioria dos pacientes com bronquite aguda são pessoas saudáveis e são considerados como portadores de bronquite aguda não complicada. Aqueles com doenças pulmonares crônicas, cardiopatas ou imunocomprometidos são considerados de alto risco para complicações de uma bronquite aguda e não estão incluídos nessa discussão. |
9 – Quais são os diagnósticos diferenciais da bronquite aguda? |
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10 – Como diferenciar asma e bronquite aguda? |
Quando o paciente se apresenta no primeiro quadro de tosse e sibilância ou evidência de obstrução de vias aéreas, não é possível fazer a distinção. Em um estudo sobre o tema, 65% dos pacientes que tiveram 2 ou mais episódios de bronquite no período de 5 anos receberam, posteriormente, o diagnóstico de asma leve. Asmáticos frequentemente têm sintomas típicos intermitentes (tosse, sibilos e dispneia) que resolvem quando tratados. No entanto, eles podem ter um quadro de bronquite aguda sobreposto. |
11 – Qual a importância do diagnóstico diferencial entre bronquite aguda e pneumonia? |
A importância é devido ao fato da pneumonia não ser usualmente uma doença autolimitada e ter consideráveis morbidade e mortalidade quando não tratada adequadamente. Na pneumonia, o tratamento antimicrobiano é indispensável, já na bronquite aguda é discutível. |
12 – Como é feito o diagnóstico? |
Na maioria dos pacientes, o diagnóstico é clínico e é estabelecido em um paciente com tosse seca ou produtiva, mucoide ou purulenta, e sem evidência de pneumonia, resfriado, gripe, crise asmática ou exacerbação de DPOC. Uma revisão de 4 estudos prospectivos avaliou a acurácia da história e do exame físico em diagnosticar pneumonia e concluiu que a ausência de anormalidade dos sinais vitais e do exame físico reduz suficientemente a probabilidade de pneumonia. |
13 – Quando está indicada a realização da radiografia de tórax? |
Na presença de sinais que façam suspeitar do diagnóstico de pneumonia. São eles:
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14 – Há necessidade de cultura do escarro para pesquisa de bactérias em pacientes sem alterações radiográficas? |
Essa prática não é recomendada como rotina, uma vez que bactérias dificilmente causam bronquite aguda. Menos de 10% dos pacientes terão uma infecção bacteriana diagnosticada como causa. No entanto, pacientes com tosse paroxística severa, seguida ou não por vômito, devem ser investigados para a possibilidade de coqueluche, independente da história de imunização. Esse diagnóstico é estabelecido pela cultura de material da nasofaringe posterior (swab ou aspirado). |
15 – Qual o papel da procalcitonina na avaliação de pacientes ambulatoriais com queixa de tosse? |
O nível sérico de procalcitonina tem sido avaliado como meio de distinguir pacientes portadores ou não de infecção bacteriana. No entanto, o seu papel em pacientes ambulatoriais com tosse ainda necessita ser esclarecido. Até o momento, seu uso não é recomendado como rotina. |
16 – Quais as drogas estão liberadas para tratar a bronquite aguda? |
A maioria dos pacientes tem sintomas de um resfriado comum e pode se beneficiar do tratamento sintomático dessa condição. |
17 – Qual o papel dos β2-agonistas no tratamento da bronquite aguda? |
Revisão do Cochrane sobre o uso de β2-agonistas no tratamento da bronquite aguda em 5 estudos envolvendo adultos concluiu que seu uso não é recomendado nos casos não complicados. Uma metanálise encontrou que os β2 agonistas não foram eficazes no tratamento da bronquite aguda ou tosse com menos de 4 semanas de duração em crianças e adultos, a menos que obstrução ao fluxo aéreo estivesse presente. Assim, em adultos com diagnóstico de bronquite aguda e que estão sibilando, β2 agonistas podem ser úteis. No entanto, sua prescrição sistemática não está indicada. |
18 – Qual o papel dos antitussígenos no tratamento da bronquite aguda? |
O uso de codeína ou dextrometorfano para reduzir a frequência e a severidade da tosse não têm sido sistematicamente pesquisado em estudos duplo-cegos e placebo-controlados em pacientes com bronquite aguda. Em um estudo, 710 adultos com infecção aguda das vias aéreas superiores e tosse foram randomizados, de forma que um dos grupos recebeu dose única de 30 mg de dextrometorfano e o outro recebeu placebo. A avaliação objetiva da tosse foi conduzida usando gravação contínua da mesma, que foi significativamente reduzida durante o período de 4 horas de observação no grupo que usou a substância ativa. Devido ao fato da causa da tosse em muitos desses participantes ter sido provavelmente uma bronquite aguda, é admissível oferecer um curso empírico de algum antitussígeno para pacientes que apresentem tosse severa durante a doença. Dessa forma, agentes antitussígenos são ocasionalmente úteis e podem ser oferecidos como medicações de alívio da tosse por curto período em alguns pacientes. |
19 – É recomendado o tratamento com mucolíticos e expectorantes? |
Não. Estudos têm mostrado resultados conflitantes. Em consequência dos efeitos favoráveis inconsistentes, seu uso não é recomendado. |
20 – Antibióticos estão indicados como rotina no tratamento da bronquite aguda? |
Não. Diversas revisões publicadas de estudos randomizados e metanálises sobre os efeitos dos antibióticos sobre a duração e a severidade da doença concluíram que o tratamento de rotina com antibióticos não é justificável, uma vez que a bronquite aguda é uma doença primariamente viral.Uma metanálise encontrou uma redução de 0,6 dias na duração da tosse com a antibioticoterapia. No entanto, concluíram que esse pequeno benefício clínico foi compensado pelo risco de potenciais efeitos adversos desses fármacos, que são responsáveis por mais de 19% das consultas em pronto atendimentos consequentes aos efeitos colaterais de drogas.Outro estudo avaliou a melhora da qualidade de vida em 7 dias de 221 pacientes com o diagnóstico clínico de bronquite aguda, não portadores de pneumopatias crônicas. Eles foram randomizados e receberam tratamento com azitromicina ou vitamina C. Todos receberam dextrometorfano e inalação de albuterol. Azitromicina ao foi mais efetiva que a vitamina C em todos os parâmetros estudados.Um modesto benefício dos antibióticos em reduzir a incidência de casos de pneumonia precedida por infecções respiratórias comuns, incluindo bronquite aguda, foi demonstrado em um estudo retrospectivo de 3.360.000 de casos de infecções respiratórias altas. O benefício foi maior em idosos; para pessoas com idade acima de 68 anos, foi necessário tratar 39 para prevenir 1 caso de pneumonia.A despeito dos argumentos acima, muitos estudos têm mostrado que entre 65 a 80% dos pacientes com bronquite aguda recebem prescrição de antibióticos, mesmo com a evidência que, com poucas exceções, eles são ineficazes. A frequência de prescrição de antibióticos nessa condição tem diminuído apenas modestamente e a escolha de fármacos de amplo espectro tem aumentado. |
21 – Quando prescrever antibióticos para o tratamento da bronquite aguda? |
Segundo o consenso do National Institute for Health and Clinical Excellence (NICE), a antibioticoterapia é recomendada apenas nos seguintes casos:
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22 – Há alguma outra recomendação sobre antibioticoterapia na bronquite aguda? |
Sim. Segundo guidelines do American College of Physicians e do Centers for Disease Control and Prevention (CDC), a única indicação para o uso de antimicrobianos na bronquite aguda é na causada pela Bordetella pertussis. Os benefícios clínicos dos antibióticos são vistos somente se iniciados precocemente (dentro da primeira semana) no curso da doença. Entretanto, o tratamento deverá ser instituído mesmo além desse período, com o objetivo de limitar a disseminação, a despeito do mínimo efeito sobre o curso clínico da doença. |
23 – Como tratar a bronquite aguda causada pela Bordetella pertussis? |
As opções de tratamento são:
Devido à alta incidência de efeitos colaterais gastrointestinais e ao raro risco de morte súbita devido ao prolongamento do intervalo QT, adultos deveriam usualmente ser tratados com claritromicina ou azitromicina. |
24 – Qual o papel dos corticoides no tratamento da bronquite aguda? |
Não há dados de ensaios clínicos sobre essa conduta. Na prática, entretanto, um breve curso (ex: 7 dias) de corticoide inalado ou oral pode ser razoável para a tosse incômoda (tosse persistente por mais de 20 dias). |
Capítulo 1 – Epidemiologia |
1 – Qual a epidemiologia do câncer de pulmão? |
De doença rara no passado, o câncer do pulmão transformou-se em doença neoplásica comum, sendo estimados, em 2008, 1.600.000 novos casos diagnosticados e 1.380.000 óbitos em todo o mundo. Nos EUA, em 2012, estima-se a ocorrência de 228.000 novos casos e 159.500 mortes por câncer de pulmão. Atualmente, é a principal causa de morte por neoplasia em todo o mundo. A maioria dos casos se apresenta entre os 50 e 70 anos; sendo bem menos comum antes dos 40 anos.No Brasil, segundo dados do Instituto Nacional do Câncer de 2012, o câncer de pulmão representa 8,8% das neoplasias entre os homens, sendo o segundo mais frequente, atrás do câncer de próstata. Entre as mulheres ele representa 5,3%, sendo o quinto mais comum, atrás do câncer de mama, de colo uterino, de cólon e reto e de tireoide. |
2 – Qual o principal fator de risco para o câncer pulmão? |
O principal fator de risco para câncer de pulmão é o tabagismo. Essa associação foi feita pela primeira vez na Inglaterra, em 1927. Em 1950, o trabalho de Doll e Hill, além de deixar evidente a íntima relação tabaco-câncer do pulmão, demonstrou o efeito dose-resposta entre o aparecimento da neoplasia maligna do pulmão e a quantidade de fumo consumida pelos pacientes. A partir daí, o papel esmagador do tabagismo como principal causa do câncer de pulmão vem sendo exaustivamente demonstrado.O tabagismo é responsável por 90% dos casos de câncer de pulmão, incluindo aí o tabagismo passivo. O risco de desenvolver a neoplasia em uma pessoa que, por exemplo, tenha uma carga tabagística de 40 anos/maço é 20 vezes maior em comparação a um não fumante. Por outro lado, com o abandono do tabagismo, estima-se uma queda progressiva do risco ao longo de 15 anos, com estabilização do mesmo no dobro em relação ao não fumante. Sendo assim, a principal medida preventiva em relação ao câncer de pulmão é evitar que as pessoas comecem a fumar e tratar o tabagismo entre as que já iniciaram (ver mais detalhes no capítulo sobre tabagismo). |
3 – Quais são os outros fatores de risco para o câncer pulmão? |
Os outros fatores de risco relacionados ao câncer de pulmão são:
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Capítulo 2 – Tipos histológicos |
4 – Quais são os tipos histológicos de câncer de pulmão? |
A Organização Mundial de Saúde reconhece 4 tipos histológicos principais:Adenocarcinoma (38%)Constitui o câncer do pulmão mais comum em mulheres e homens. Com frequência manifesta-se na forma de nódulo ou massa periférica. Seus aspectos microscópicos característicos incluem formação glandular, geralmente com produção de mucina.Carcinoma de células escamosas (20%)Exibe a maior correlação observada com o tabagismo. Esse tumores surge, em sua maioria, no hilo ou próximo a ele. Geralmente origina-se em um brônquio central, tem crescimento endobrônquico e, por isso, pode apresentar sintomas clínicos locais, tais como tosse e hemoptise, e tem maior probabilidade de ser diagnosticado nas suas formas iniciais pela citologia do escarro. Geralmente disseminam-se para os linfonodos regionais e, em torno de dez por cento dos casos, apresenta-se com cavitação. Microscopicamente varia desde neoplasia ceratinizante bem diferenciada a tumor anaplásico com diferenciação ceratinizante apenas focal.Carcinoma de pequenas células (13%)É o mais maligno dos cânceres pulmonares e, em geral, manifesta-se na forma de tumor central e hilar e tende a estenosar os brônquios por compressão extrínseca. Está fortemente associado ao hábito de fumar. Os aspectos microscópicos incluem a presença de pequenas células semelhantes aos grãos de aveia, com pequena quantidade de citoplasma, sem diferenciação escamosa ou glandular e com grânulos neurossecretores.Carcinoma de grandes células (5%)Provavelmente representa carcinomas de células escamosas ou adenocarcinomas pouco diferenciados, em certas ocasiões com elementos histológicos peculiares: células gigantes, células claras, células fusiformes.
Outros Outros carcinomas de pequenas células não identificados (18%) e outros carcinomas (6%). |
Capítulo 3 – Quadro clínico |
5 – Quais as apresentações clínicas iniciais mais comuns no câncer de pulmão? |
A maioria dos pacientes com câncer de pulmão apresentam sintomas apenas quando a doença está em estágios mais avançados, o que compromete o diagnóstico. Isso ocorre por diferentes razões, como o fato de alguns sintomas surgirem mais tardiamente e de outros, como por exemplo a tosse, serem inespecíficos e não chamarem necessariamente a atenção para o diagnóstico. O câncer de pulmão pode ainda ser assintomático no momento do diagnóstico, como nos casos de nódulos pulmonares que se constituem em achados radiográficos. A tabela 1 mostra a frequência dos principais sintomas no momento do diagnóstico.Os sintomas do câncer de pulmão decorrem de:
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6 – Quais são as manifestações clínicas relacionadas ao crescimento do tumor primário? |
As lesões endobrônquicas podem determinar tosse, hemoptise, dispneia e sibilo. A tosse, seca ou produtiva, é o sintoma mais comum associado ao câncer do pulmão, presente em até 75% dos casos. Ela pode ser causada por um pequeno tumor agindo como um corpo estranho dentro do brônquio ou pode ser secundária à ulceração da mucosa. É um sintoma comum em todo paciente com câncer do pulmão de qualquer localização; entretanto é mais comumente observada nos portadores de tumores centrais. Por ser um sintoma inespecífico e ocorrer em pacientes com bronquite crônica pelo cigarro ou com DPOC, a tosse pode, inicialmente, não chamar a atenção para o diagnóstico.A hemoptise está presente em um terço dos casos das neoplasias pulmonares. Por isso, toda hemoptise em indivíduo com mais de 40 anos deve ser investigada com radiografia de tórax e broncofibroscopia. Aproximadamente 20% de todos os casos de hemoptise nesta faixa etária resultam do câncer do pulmão.A dispneia usualmente é causada pela obstrução de um brônquio principal ou da traqueia pelo tumor. Os tumores periféricos somente causam dispneia quando são suficientemente grandes para interferir na função pulmonar ou quando associados a disseminação locorregional, como nos derrames pleurais volumosos, ou como consequência de extensa linfangite carcinomatosa.O sibilo é causado pelo estreitamento de um grande brônquio, pela obstrução tumoral ou pela compressão extrínseca, e tem significado quando é unilateral, localizado e de origem recente. O estridor é produzido pela obstrução quase total do brônquio principal ou da traqueia, em sua porção inferior.Febre e os calafrios podem estar presentes nos pacientes com neoplasia pulmonar como manifestações secundárias à pneumonia obstrutiva ou à atelectasia. O abscesso do pulmão resultante da necrose tumoral também pode ser responsável pela febre. |
7 – Quais são as manifestações clínicas relacionadas à disseminação loco-regional do tumor? |
A disseminação intratorácica do câncer do pulmão pode ocorrer por extensão direta do tumor com invasão ou compressão de estruturas vizinhas, por acometimento de gânglios hilares ou mediastinais ou por linfangite carcinomatosa. As principais manifestações clínicas são:
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8 – O que é o tumor de Pancoast e a Síndrome de Horner? |
Os tumores de Pancoast localizam-se posteriormente no ápice dos lobos superiores, junto ao plexo braquial. Comumente causam sintomas e sinais relacionados à infiltração neoplásica das raízes do oitavo nervo cervical e do primeiro e segundo nervos torácicos. São frequentes: dor, alteração na temperatura cutânea e atrofia muscular do ombro e das porções do membro superior secundária ao comprometimento nervoso. No câncer de pulmão, a incidência da síndrome e de seus sintomas é de, aproximadamente, 4% e é comum o atraso no diagnóstico em até um ano, desde o início das queixas dos pacientes.A maioria dos tumores de Pancoast é do tipo escamoso, de crescimento lento e raramente produz metástases a distância. O tumor pode invadir a pleura e a parede torácica, destruindo a primeira e a segunda costelas, causando intensa dor. Pode também invadir e destruir o corpo vertebral. Nesses casos, devido ao acometimento da cadeia simpática e do gânglio estrelado, é comum o aparecimento da síndrome de Horner, que se caracteriza por: enoftalmia unilateral, ptose palpebral, miose e anidrose da face e do membro superior. Figura 1. |
9 – O que é a síndrome da veia cava superior (SVCS)? |
A obstrução da veia cava superior é um processo subagudo ou agudo, na maioria das vezes causada por uma neoplasia maligna intratorácica. Essas podem ser, em até 90% dos casos, o câncer do pulmão, os linfomas ou os tumores mediastinais primários ou metastáticos. O câncer do pulmão é o responsável por 46% a 75% de todos os casos da SVCS. Ela é secundária à compressão, à invasão da veia cava superior e, ocasionalmente, à formação de um trombo intraluminal. Os pacientes com SVCS apresentam edema e pletora facial, do pescoço e das pálpebras, além da dilatação das veias do pescoço, do ombro, da parede anterior do tórax e dos membros superiores. A cianose dos membros superiores e da face é comum. Outros sintomas associados a ela são cefaleia, tonteira, vertigem, visão borrada, tosse, síncope, dispneia, dor torácica e disfagia. A associação da SVCS com a obstrução das vias aéreas superiores e com sinais de edema cerebral é sinal de mau prognóstico. Entre as neoplasias pulmonares, a que mais comumente causa a SVCS é o carcinoma indiferenciado de pequenas células, em 40% das vezes, seguido pelo carcinoma escamoso. |
10 – As neoplasias pulmonares podem envolver a parede torácica? |
A dor torácica é comum nos pacientes com tumores do pulmão e mais da metade deles desenvolvem este sintoma durante o curso de sua doença. Ela é geralmente surda, intermitente, podendo durar alguns minutos ou horas e, em geral, manifesta do mesmo lado do tumor, sem relação com a respiração ou com a tosse. Quando a dor é intensa, persistente, bem localizada, ventilatório-dependente e piora com a tosse, ela está comumente relacionada à invasão neoplásica da pleura parietal e/ou da parede torácica com erosão dos arcos costais. A dor no ombro pode ser secundária ao tumor de Pancoast ou referida, devido a um tumor do lobo inferior que invade a porção central do diafragma inervado pelo frênico. A dor torácica, usualmente associada à tosse e à dispneia, pode ainda ser associada à compressão neoplásica da artéria pulmonar. |
11 – O derrame pleural é frequente no câncer do pulmão? |
O derrame pleural no paciente com câncer do pulmão ocorre em aproximadamente 8-15% dos casos e é assintomático em 25% das vezes. Está associado a mau prognóstico. Geralmente é consequência da invasão neoplásica da pleura visceral e tem por características ser hemorrágico, de grande volume e se refazer rapidamente. Pode, porém, estar associado a obstrução linfática. As principais queixas a ele relacionadas são: dispneia, dor torácica e tosse. Como interfere diretamente com o estadiamento, a definição de malignidade no líquido é obrigatória. A toracocentese com biópsia pleural deve ser o método de escolha para a definição da natureza do derrame pleural. Este procedimento define a etiologia do derrame pleural em aproximadamente 80% dos casos. Maiores detalhes sobre o derrame pleural neoplásico são descritos no capítulo sobre derrame pleural, na seção temas em pneumologia. |
12 – O derrame pericárdico é frequente no câncer do pulmão? |
As metástases para o coração e para o pericárdio ocorrem por migração linfática retrógrada das células tumorais. Outras vias para o implante das células neoplásicas nesses locais incluem a disseminação hematogênica e a invasão tumoral direta. O derrame pericárdico está presente em 15% dos casos e duas das suas mais graves complicações são a arritmia – taquicardia sinusal ou fibrilação atrial – e o tamponamento cardíaco. O derrame pericárdio, que causa o tamponamento, é resultante de pericardite carcinomatosa e coloca em risco a vida do paciente. |
13 – As metástases à distância são comuns nos pacientes com câncer de pulmão? Quais são os sítios mais comuns? |
A frequência das metástases extratorácicas varia de acordo com o tipo celular e a diferenciação histológica do tumor: é maior no carcinoma indiferenciado de pequenas células e no adenocarcinoma e nos tumores pouco diferenciados. A disseminação hematogênica do câncer do pulmão se faz mais frequentemente para o sistema nervoso central (SNC), para os ossos, para o fígado e para as adrenais, nesta ordem. |
14 – Quais são as características das metástases para o sistema nervoso central (SNC)? |
Os compartimentos anatômicos do cérebro mais comumente envolvidos pelas metástases são a calota craniana, as leptomeninges e o parênquima cerebral. O câncer do pulmão é a neoplasia que mais produz metástases para o SNC (40-60%). Dez por cento dos pacientes já as possuem no momento do diagnóstico e outros 15% a 20% as desenvolvem durante o curso da sua doença. Aproximadamente 80% a 85% das metástases para o parênquima cerebral comprometem os lobos frontais e 10% a 15% delas acometem o cerebelo. Mais comumente são secundárias ao carcinoma indiferenciado de pequenas células, ao indiferenciado de grandes células, ao carcinoma escamoso e ao adenocarcinoma, nessa ordem sequencial.Os sinais e sintomas mais comuns são: cefaleia, náusesa, vômitos, alteração do nível de consciência, crise convulsiva, fraqueza e depressão. A cefaleia é o sintoma mais comum, está presente em 50% dos casos e, em geral, está associada a sinais e sintomas de hipertensão intracraniana: letargia, confusão mental e papiledema. Outra complicação das metástases para o SNC diz respeito ao acometimento da medula ao longo de seu eixo. A compressão medular ocorre em 3% dos pacientes com câncer do pulmão, sendo mais comum nos portadores do carcinoma indiferenciado de pequenas células. Figura 2. |
15 – Quais são as características das metástases ósseas no câncer de pulmão? |
Metástases ósseas ocorrem em até 25% dos casos de câncer de pulmão e 80% delas se localizam no esqueleto axial. A coluna, a bacia, as costelas e os fêmures são os locais mais frequentemente afetados. Os sinais e sintomas próprios do envolvimento ósseo são dor, fratura patológica, elevação de fosfatase alcalina, hipercalcemia, déficit neurológico e imobilidade. À radiografia as metástases para os ossos apresentam-se como lesões líticas. O PET e o PET-CT têm maior sensibilidade para identificação de metástases ósseas do que a cintilografia. Figura 3. |
16 – Quais são as características das metástases hepáticas no câncer de pulmão? |
As metástases para o fígado aparecem nos estágios mais avançados da doença, em 1% a 35% dos casos. Inicialmente assintomáticas, podem evoluir com anorexia, dor epigástrica e hepatomegalia multinodular. Icterícia e ascite podem ocorrer em fases avançadas. As enzimas hepáticas geralmente estão elevadas. As lesões são identificadas por TC e com maior sensibilidade ainda por PET e PET-CT. Figura 4. |
17 – Quais são as características das metástases para adrenais no câncer de pulmão? |
O comprometimento das adrenais varia de 2% a 21% e, na maioria das vezes, é assintomático. A tomografia computadorizada do abdome superior tem um bom rendimento na sua identificação e deve ser realizada de rotina em todo paciente com câncer do pulmão. Mesmo assim, na maioria dos casos a lesão é benigna, tratando-se de adenoma, hiperplasia nodular ou cisto hemorrágico. O PET pode auxiliar na distinção entre lesões benignas e malignas nas adrenais. Figura 5. |
18 – O que são síndromes paraneoplásicas? |
As síndromes paraneoplásicas são manifestações patológicas, clínicas ou biológicas associadas a qualquer neoplasia de uma maneira geral, mas que não se relacionam diretamente com o tumor principal. Estão ligadas a mecanismos hormonais, humorais, tóxico-degenerativos e dismetabólicos.As síndromes ou manifestações paraneoplásicas mais comuns no câncer de pulmão são:
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Capítulo 4 – Exames complementares |
19 – Quais são os exames complementares empregados na investigação e na condução do câncer de pulmão? |
Exames complementares são solicitados em diferentes estágios da avaliação do câncer de pulmão: na investigação da suspeita diagnóstica, na definição da presença da neoplasia e do seu tipo histológico, no estadiamento, na investigação de síndromes paraneoplásicas e de complicações, no seguimento do paciente durante e após tratamento.Os principais exames são:
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20 – Qual o papel da radiografia do tórax no câncer do pulmão? |
A radiografia do tórax geralmente é o exame que nos leva a suspeitar da neoplasia pulmonar, devendo ser o primeiro a ser realizado em um paciente com esta hipótese diagnóstica. Apesar de sua importância, a radiografia de tórax realizada rotineiramente para o rastreamento do câncer do pulmão não tem valor. Para este fim, trabalhos recentes têm demonstrado que a tomografia computadorizada helicoidal com baixa dose é de utilidade.Os principais achados radiográficos no câncer de pulmão são:
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21 – Existem características radiológicas que sugiram quais os tipos histológicos do câncer do pulmão? |
A linfoadenomegalia mediastinal grosseira e a invasão mediastinal precoce são observadas com frequência nos carcinomas indiferenciados de pequenas e grandes células. Volumosas massas hilares ou para-hilares são típicas do carcinoma indiferenciado de pequenas células, nos quais são vistas em 78% dos casos. O adenocarcinoma se apresenta como nódulo periférico em 72% dos casos, entretanto também podemos observar grandes massas hilares associadas a linfoadenomegalia mediastinal grosseira. Na maioria dos casos, o carcinoma indiferenciado de grandes células também se revela como um nódulo periférico e o carcinoma escamoso sob a forma de volumosas massas, com escavação central em 22% dos casos. A tabela 2 mostra algumas correlações entre aspectos radiológicos e tipos histológicos. |
22 – Qual o papel da tomografia computadorizada (TC) de tórax no câncer do pulmão? |
Todo paciente com suspeita de câncer de pulmão ou com o diagnóstico já confirmado deverá ser submetido a TC de tórax, a qual pode:
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23 – Que outros exames de imagem podem auxiliar na condução do câncer de pulmão? |
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24 – Qual o papel da citologia do escarro no diagnóstico do câncer do pulmão? |
A citologia do escarro é um método não invasivo de muita utilidade na definição diagnóstica do câncer do pulmão. Seu rendimento depende da existência de expectoração, do tamanho e localização do tumor e da experiência do citopatologista. Sua sensibilidade para os tumores proximais está em torno de 80%. Para os tumores periféricos e menores do que 3 cm, seu rendimento é menor que 20%. Atualmente, devido a maior disponibilidade da broncofibroscopia, o exame de escarro tem sido cada vez menos utilizado, entretanto, trata-se de um exame simples, não invasivo, de baixo custo e alto rendimento. |
25 – Qual o papel da broncofibroscopia no diagnóstico e no estadiamento do câncer do pulmão? |
A broncofibroscopia é comumente utilizada para diagnóstico e estadiamento do câncer de pulmão. As alterações endoscopicamente visíveis devem ser lavadas, escovadas e biopsiadas. Nas lesões visíveis, o rendimento da biópsia brônquica fica em torno de 80%. Lesões submucosas e que causam compressão extrínseca também devem ser biopsiadas. As lesões periféricas podem ser acessadas pela broncofibroscopia por meio da biópsia transbrônquica guiada pela fluoroscopia. Nestes casos, o tamanho da lesão é fator determinante do rendimento da broncofibroscopia: menor que 25% para as lesões menores que 2 cm; entre 60% e 70% para as lesões maiores que 2 cm; em torno de 80% para aquelas lesões maiores que 4 cm. A biópsia transbrônquica também é capaz de diagnosticar a linfangite carcinomatosa.Mais de 70% dos tumores pulmonares são de localização central e a combinação do lavado, do escovado e da biópsia brônquica (3 a 5 fragmentos) estabelece o diagnóstico em mais de 90% dos casos. Quando, ao invés de uma lesão endobrônquica, observamos a infiltração intramural pelo tumor, o rendimento diagnóstico cai para 55%. A biópsia transbrônquica por agulha aumenta esse resultado para 97%. Nas lesões periféricas, o rendimento diagnóstico desse procedimento é baixo (em torno de 60%). O lavado broncoalveolar produz bons resultados no esclarecimento diagnóstico quando se suspeita de carcinoma bronquíolo-alveolar.Com a finalidade do estadiamento da neoplasia pulmonar, a broncofibroscopia pode, ocasionalmente, identificar a presença de lesões sincrônicas, avaliar a extensão proximal do tumor e facilitar o acesso aos linfonodos paratraqueais, subcarinal e hilar por meio da punção aspirativa com agulha. Embora sua utilização continue sendo um desafio, a punção aspirativa transbrônquica por agulha tem sensibilidade de 50% e especificidade de 90% no estadiamento do mediastino nos pacientes portadores de neoplasias pulmonares. |
26 – Quando está indicada a punção aspirativa percutânea com agulha fina e qual o seu rendimento? |
A punção aspirativa percutânea com agulha fina é utilizada na abordagem diagnóstica das lesões pulmonares periféricas, nas lesões pleurais e nas da parede torácica. Pode ser orientada pela fluoroscopia ou pela tomografia computadorizada. Sua positividade está em torno de 90%. O pneumotórax é sua principal complicação e ocorre em, aproximadamente, 30% dos casos, mas somente 15% deles necessitam de drenagem pleural. O implante tumoral no trajeto da agulha é muito raro. A punção aspirativa com agulha fina, guiada pela fluoroscopia, também é útil no diagnóstico das metástases hepáticas, ósseas e adrenais. |
27 – Como se dá o acometimento dos linfonodos no câncer do pulmão? |
Na maioria das vezes, o aumento dos linfonodos hilares ou mediastinais nos pacientes com câncer do pulmão se faz por disseminação linfática. O aumento dos linfonodos, por si só, pode causar sintomas como a compressão do esôfago, da veia cava superior, pressão retroesternal ou dor. Os linfonodos mais comumente vistos à inspeção ou palpados são os supraclaviculares, acometidos em 15-20% dos pacientes, em algum momento, no curso da doença. Na maioria dos casos, a presença desses linfonodos indica que o tumor não é ressecável. |
28 – A correlação entre o tamanho dos linfonodos mediastinais, observado na tomografia de tórax, e seu comprometimento neoplásico é sempre um problema. Como devemos nos posicionar frente a esta situação? |
Geralmente, o único sinal radiológico de comprometimento neoplásico do linfonodo mediastinal é o seu aumento de tamanho. Entretanto a dificuldade em se usar o tamanho como único critério de envolvimento neoplásico dos linfonodos é que muitas outras doenças não neoplásicas são capazes de produzir tal imagem: tuberculose, histoplasmose, pneumoconiose, sarcoidose ou a hiperplasia reacional a um processo inflamatório inespecífico. É sabido que, nos pacientes com câncer do pulmão, até 30% dos linfonodos mediastinais aumentados de tamanho estão livres de neoplasia. Por outro lado, o envolvimento microscópico pelo tumor pode estar presente em linfonodos mediastinais de tamanho normal. A conduta aceita, até o momento, é considerar como normal o linfonodo mediastinal com menos de 10 mm em seu menor eixo.Os pacientes com câncer do pulmão e com tomografia computadorizada do tórax mostrando linfonodos mediastinais maiores do que 10 mm no seu menor eixo devem ser estadiados por meio de mediastinoscopia cervical e/ou de mediastinotomia. |
29 – Qual o papel da mediastinoscopia e da mediastinotomia nos pacientes portadores de câncer do pulmão? |
A mediastinoscopia cervical e a mediastinotomia anterior têm sido utilizadas tradicionalmente para o diagnóstico do câncer do pulmão e, principalmente, para o estadiamento mediastinal. A mediastinoscopia cervical alcança os linfonodos paratraqueais à direita e os subcarinais e, através da mediastinotomia anterior, pode-se biopsiar os linfonodos paratraqueais à esquerda, os supra-aórticos e os da janela aorto-pulmonar. A mediastinoscopia está indicada nos pacientes portadores de carcinoma do pulmão não pequenas células, candidatos à cirurgia, nos quais a tomografia computadorizada do tórax identificou, no mediastino, linfonodos maiores do que 1 cm no seu menor diâmetro. |
30 – Podemos confirmar a invasão do mediastino com tomografia computadorizada ou ressonância magnética? |
Existem alguns sinais, observados na tomografia computadorizada e/ou na ressonância magnética que sugerem a invasão mediastinal pelo tumor. São eles:
Todos são sinais de irressecabilidade. A ressonância magnética é melhor do que a tomografia computadorizada na avaliação do comprometimento vascular. |
31 – Como podemos avaliar a invasão tumoral da parede torácica? |
A princípio, a invasão da parede torácica não contra-indica a cirurgia, embora interfira no prognóstico dos pacientes. O diagnóstico da invasão da parede torácica pela tomografia computadorizada só será possível quando houver destruição óssea ou massa na parede. O simples contato do tumor com a pleura parietal não significa que ela esteja comprometida. A dor torácica contínua é o melhor sintoma que sugere a invasão da parede torácica pelo tumor. Mais recentemente, a ultra-sonografia tem se mostrado um bom método para avaliar o envolvimento da parede torácica pelo tumor, principalmente se pelo menos dois dos seguintes critérios estiverem presentes:
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32 – Quais pesquisas de metástases devem ser feitas rotineiramente em pacientes com câncer do pulmão? Quais métodos são empregados nesta primeira pesquisa? Quais métodos devem ser utilizados após esta primeira avaliação? |
A conduta estabelecida atualmente para a investigação de metástases à distância em pacientes com câncer do pulmão é a seguinte:
No paciente com câncer do pulmão, no momento em que se realiza a tomografia do tórax, deve-se sempre realizar a tomografia do andar superior do abdome – é uma conduta simples para se avaliar o fígado e as adrenais. As adrenais com mais de 3 cm devem ser exploradas com punção aspirativa com agulha fina. |
33 – Como definir o nódulo pulmonar solitário e qual a conduta a ser adotada frente ao mesmo? |
Nódulo pulmonar é definido como uma opacidade pulmonar com diâmetro menor ou igual a 3 cm (acima de 3 cm a imagem é considerada massa) e completamente circundada por tecido pulmonar. Na maioria das vezes o paciente é assintomático, sendo o nódulo um achado radiográfico. Mais informações estão disponíveis no capítulo específico sobrenódulo pulmonar. |
34 – Há indicação para rastreamento do câncer de pulmão? |
Estudos recentes mostram que o rastreamento do câncer de pulmão com TC de baixa dose (LDCT) permite o diagnóstico mais precoce e pode reduzir a mortalidade pela neoplasia. Com isso, diferentes sociedades têm se posicionado a favor do rastreamento, indicado nos seguintes casos:
Pacientes fora desta faixa etária, com menor carga tabagística, que pararam de fumar há mais de 15 anos ou que apresentem co-morbidades que limitam a expectativa de vida ou a possibilidade de tratamento curativo do câncer que venha a ser identificado não devem ser avaliados. (Grau de evidência: 2C). Além das recomendações acima, as seguintes observações são feitas:
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Capítulo 5 – Estadiamento |
35 – Como deve ser estadiado o câncer do pulmão? |
Estadiamento é a avaliação da extensão da doença neoplásica de um paciente, permitindo seu agrupamento com outros pacientes com extensão de doença semelhante e objetivando uniformizar os tratamentos e facilitar a análise de dados epidemiológicos. Baseia-se na avaliação do tamanho, da localização e do grau de invasão do tumor primário, bem como na identificação da possível presença de doença loco-regional ou metastática. O atual sistema de estadiamento do câncer do pulmão se baseia naquele proposto por Denoix, em 1946, em que se avalia o tumor (T), os linfonodos (N) e a presença ou não de metástases a distância (M). A tabela 3 e a tabela 4 ilustram este estadiamento. Este estadiamento não se aplica ao carcinoma de pequenas células. |
36 – Como é feito o estadiamento do carcinoma de pequenas células? |
O carcinoma de pequenas células apresenta um estadiamento diferente, conforme ilustrado na tabela 5. |
Capítulo 6 – Tratamento |
37 – Quais são as bases para a escolha do tratamento do câncer do pulmão? |
A escolha do tratamento do câncer de pulmão baseia-se em:
A decisão sobre o tratamento deve ser tomada em conjunto pelo paciente, sua família e a equipe médica, com opiniões do clínico que está conduzindo o caso (ex. o pneumologista), do cirurgião e do oncologista. |
38 – Qual o tratamento do carcinoma não-pequenas células do pulmão (NSCLC)? |
No NSCLC o tratamento cirúrgico é o método mais eficiente para o controle do tumor, desde que ele seja completamente ressecável e a morbimortalidade do procedimento seja baixa. Para conseguir resultados favoráveis de sobrevida, deve-se obedecer aos seguintes princípios oncológicos:
Assim, a cirurgia é o tratamento preferencial para os pacientes portadores de NSCLC nos estádios I e II, podendo ser complementada por quimio e radioterapia em determinados casos, como veremos adiante. Nos estádios mais avançados a cirurgia é conduta de exceção ou não está indicada, sendo a quimio e radioterapia as opções principais. |
39 – Quais são as propostas terapêuticas recomendadas para o câncer de pulmão não-pequenas células (NSCLC) estádio I? |
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40 – Quais são as propostas terapêuticas recomendadas para o câncer de pulmão não-pequenas células (NSCLC) estádio II? |
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41 – Quais são as propostas terapêuticas recomendadas para o câncer de pulmão não-pequenas células (NSCLC) estádio III? |
Este grupo de estadiamento é muito heterogêneo e as opções de tratamento devem sem individualizadas paras as diferentes situações.
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42 – Quais são as propostas terapêuticas recomendadas para o câncer de pulmão não-pequenas células (NSCLC) estádio IV? |
Nos tumores avançados o tratamento deve ser individualizado, baseando-se na idade, estado funcional, tipo histológico e caracterização molecular. As avaliações moleculares solicitadas são: presença da mutação somática para o receptor do fator de crescimento epidérmico – EGFR (confere sensibilidade aos inibidores da tirosina-quinase EGFR); presença do oncogene ALK (associada a sensibilidade ao crizotinib).A decisão pelo melhor tratamento geralmente é tomada pelo oncologista, que deverá, entretanto, discutir o caso com o clínico responsável pelo paciente (quando houver), com o paciente e seus familiares. Uma proposta frequentemente empregada está ilustrada no fluxograma da figura 7.Nessas fases avançadas, medidas específicas para metástases e medidas paliativas são frequentemente necessárias. |
43 – Quais são as propostas terapêuticas recomendadas para o câncer de pulmão pequenas células? |
O carcinoma indiferenciado de pequenas células é um tumor neuroendócrino, mais comum em fumantes, que se caracteriza por taxa de duplicação e crescimento rápidos e metástases precoces. Geralmente já se encontra em fases avançadas quando diagnóstico e a sobrevida é pequena se nenhum tratamento for instituído. Por outro lado, trata-se de um tumor que responde à quimioterapia e esta associa-se a aumento da sobrevida.Os regimes habitualmente propostos são:Doença limitada
Doença disseminada
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1 – O que é enfisema pulmonar? |
<face=”arial” size=”2″>O enfisema é definido como um alargamento anormal, permanente, dos espaços aéreos distais ao bronquíolo terminal, acompanhado de destruição de suas paredes, sem fibrose óbvia. O enfisema é considerado hoje como umas das anormalidades anátomo-patológicas associadas à doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). |
2 – Como se forma o enfisema pulmonar e quais as suas conseqüências? |
<face=”arial” size=”2″>Admite-se hoje que tais alterações sejam decorrentes de inflamação pulmonar, inflamação essa determinada principalmente pela inalação prolongada de substâncias nocivas, atuando em conjunto com o estresse oxidativo e o desequilíbrio entre proteases e antiproteases no parênquima pulmonar. Tais fatores levam à destruição da parede alveolar e conseqüente perda dos pontos de fixação das vias aéreas terminais aos alvéolos, com colapso expiratório das mesmas, limitação ao fluxo aéreo e hiperinflação pulmonar. A destruição da parede alveolar também reduz a força de recolhimento elástico responsável pela saída de ar dos pulmões. Freqüentemente, a essas alterações se associa uma bronquiolite obstrutiva que colabora com o desenvolvimento de limitação ao fluxo aéreo e hiperinflação pulmonar. <face=”arial” size=”2″>Com a hiperinflação pulmonar, o diafragma rebaixa-se e, em casos avançados, até torna-se invertido e muito pouco móvel. A inspiração fica prejudicada por diminuição da força dos músculos inspiratórios, o que aumenta a dispnéia. Os pulmões hiperinflados podem comprimir átrios e ventrículos e limitam as respectivas diástoles. Pode ocorrer, em casos avançados, diminuição do retorno venoso, da tensão de oxigênio e do débito cardíaco, aumentando a dispnéia. |
3 – Qual a freqüência do enfisema pulmonar? |
<face=”arial” size=”2″>Cerca de 14 milhões de pessoas nos EUA têm DPOC. Desse total, aproximadamente 1,7 milhão apresenta enfisema pulmonar. Entre os enfisematosos, 20% evoluem para doença avançada, com limitação intensa às atividades físicas e piora importante da qualidade de vida. <face=”arial” size=”2″>No Canadá, a DPOC é a sexta causa de morte em homens e a oitava em mulheres. Em 1991, cerca de 660.000 canadenses eram portadores de DPOC, representando 2,4% da população. Ocorreram 1.179 mortes por enfisema pulmonar. No mesmo ano, 10.200 pessoas foram internadas, o que significou 83 milhões de dólares de despesas para tratamento da DPOC. <face=”arial” size=”2″>No Brasil, os dados do DATASUS mostram que as doenças do sistema respiratório correspondem à 4a causa de morte, atrás das doenças cardiovasculares, das causas externas (acidentes, envenenamentos, suicídios, afogamentos) e das neoplasias. Em 1998, as mortes por doenças crônicas do trato respiratório inferior corresponderam a 36,8% do total de óbitos por doenças respiratórias. Neste mesmo ano, foram internados no Brasil 265.000 pacientes com DPOC, com uma despesa de 92 milhões de dólares. Em 1999 foram internados 275.000 pacientes com DPOC. A mortalidade intra-hospitalar para os pacientes com DPOC nestes dois anos foi praticamente a mesma, 10,6% e 10,1%. <face=”arial” size=”2″>A estimativa é que existam no Brasil 7,5 milhões de pacientes com DPOC, considerando que há em torno de 30% de fumantes na população. O único trabalho brasileiro nesse sentido é o de Ana Maria Menezes e colaboradores, que estudaram a cidade de Pelotas e viram que 12,7% da população acima de 40 anos apresentavam bronquite crônica, o que, de certo modo, reflete a freqüência de DPOC nesta população. |
4 – Quais são as alternativas terapêuticas para o enfisema pulmonar avançado? |
<face=”arial” size=”2″>Diversas abordagens clínicas e cirúrgicas têm sido propostas desde o início do século para tratamento do enfisema pulmonar avançado. Entretanto, não há cura para o enfisema pulmonar e os tratamentos, clínicos ou cirúrgicos, visam o alívio dos sintomas e a melhora da qualidade de vida dos doentes. <face=”arial” size=”2″>As alternativas terapêuticas, indicadas em diferentes situações durante a evolução do enfisema pulmonar, são:
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5 – Quais as opções cirúrgicas para o tratamento do enfisema pulmonar avançado? |
<face=”arial” size=”2″>Durante muito tempo, os procedimentos cirúrgicos propostos para o tratamento do enfisema pulmonar avançado não alcançaram sucesso por se mostrarem ineficazes ou apresentarem alta morbi-mortalidade. Somente o transplante pulmonar mostrou-se efetivo em grupos selecionados de doentes, entretanto, com altas taxas de morbidade e mortalidade de 30% em três anos e 50% em cinco anos. <face=”arial” size=”2″>Nos últimos 10 anos, estes doentes, em geral dependentes do uso de oxigênio e intensamente limitados, passaram a ter uma nova esperança terapêutica. Para um grupo selecionado de doentes com enfisema pulmonar grave, que já não obtêm melhora com o tratamento clínico otimizado, que atingem um estágio de doença muito avançado ou, ainda, que não podem ser incluídos em programas de transplante pulmonar, a cirurgia redutora de volume pulmonar passou a ser uma opção de tratamento. |
6 – O que é a cirurgia redutora de volume pulmonar? |
<face=”arial” size=”2″>É uma operação que consiste na ressecção das áreas pulmonares mais intensamente afetadas pelo enfisema, de modo a permitir que áreas remanescentes, também doentes, porém menos comprometidas, possam realizar sua função. |
7 – Quais os mecanismos pelos quais a cirurgia redutora de volume pulmonar modifica a função pulmonar e melhora a qualidade de vida dos doentes? |
<face=”arial” size=”2″>Doentes enfisematosos graves apresentam hiperinflação pulmonar, com ampliação dos diâmetros ântero-posterior e longitudinal da caixa torácica e rebaixamento e retificação das cúpulas diafragmáticas. Essas alterações anatômicas representam a alternativa encontrada pelo organismo para ampliar a caixa torácica e acomodar o pulmão enfisematoso, de maior tamanho. <face=”arial” size=”2″>De acordo com os conceitos de seu idealizador, Brantigan, a redução do volume dos pulmões restaura os princípios fisiológicos comprometidos pela desproporção entre o pulmão enfisematoso hiperinflado e a cavidade torácica de menor tamanho. Pulmões com tamanho proporcional ao espaço intratorácico permitem ao músculo diafragma retornar à sua posição normal e ter sua curvatura restaurada. Desta forma, o diafragma pode, através de sua contração e relaxamento, mobilizar-se normalmente e executar sua função na ventilação, promovendo a entrada e saída de ar dos pulmões. <face=”arial” size=”2″>A redução volumétrica reduz o trabalho respiratório e melhora as trocas gasosas por meio de vários mecanismos:
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8 – Como foram obtidas as evidências clínicas sobre os resultados da cirurgia redutora de volume pulmonar? |
<face=”arial” size=”2″>Os resultados promissores de uma série inicial de Cooper de 1995 e a rápida publicação de trabalhos com centenas de casos desencadearam um interesse mundial pela nova modalidade de tratamento cirúrgico para doentes enfisematosos graves. Resultados observados em renomados centros de cirurgia torácica mudaram rapidamente a perspectiva da cirurgia redutora que, referida inicialmente como alternativa para os doentes que não podiam se submeter a transplante pulmonar, passou a ser colocada como primeira opção para o tratamento do enfisema grave. Para esta mudança de orientação contribuiu a observação de que a cirurgia redutora beneficiava pelo menos 80% dos doentes operados e que não invalidava a indicação ulterior de transplante. Por não depender de doadores, ela está disponível para um número ilimitado de doentes, desde que os critérios de indicação sejam rigorosamente respeitados. <face=”arial” size=”2″>Em meados dos anos 90, a expansão de uso do procedimento, apesar de resultados variáveis, casuísticas de pequeno tamanho, seguimentos incompletos ou de curto prazo e falta de dados sobre riscos e critérios de seleção de doentes, levaram especialistas no tratamento de enfisema a propor uma avaliação sistemática de critérios de seleção dos doentes e de resultados da cirurgia. <face=”arial” size=”2″>O estudo – NETT (National Emphysema Treatment Trial) – foi o primeiro e mais importante estudo clinico multicêntrico para determinar o papel, segurança e efetividade da operação de redução de volume pulmonar bilateral no tratamento de enfisema pulmonar grave. Um objetivo secundário foi desenvolver critérios para identificar os doentes que provavelmente se beneficiariam com o procedimento. O estudo foi apoiado pelo Instituto Nacional do Coração, Pulmão, e Sangue (NHLBI), o Medicare (CMS) e a Agência para Pesquisa de Cuidado Médico e Qualidade (AHRQ) dos Estados Unidos da América. |
9 – Quais os critérios iniciais que os doentes candidatos à cirurgia redutora de volume pulmonar devem preencher? |
<face=”arial” size=”2″>Por ser o NETT o principal estudo prospectivo e randomizado, podemos usar seus critérios de inclusão como base para a seleção inicial dos pacientes candidatos à cirurgia redutora do volume pulmonar. Esses critérios são:
<face=”arial” size=”2″>Antes de serem randomizados, os pacientes eram incluídos em um programa de reabilitação, com duração de seis a dez semanas. |
10 – Quais exames funcionais devem ser realizados? |
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11 – Quais exames de imagem são necessários? |
<face=”arial” size=”2″>Radiografias do tórax nas posições ântero-posterior e perfil, ambas em inspiração máxima e expiração forçada. Os doentes devem apresentar sinais de hiperinflação pulmonar, com cúpulas frênicas rebaixadas, retificadas ou invertidas e pouco móveis. <face=”arial” size=”2″>Tomografia computadorizada de alta resolução do tórax mostrando heterogeneidade da doença no parênquima pulmonar, ou seja, com a presença de áreas centrais menos doentes em meio a áreas periféricas mais comprometidas pelo enfisema (determinação da gravidade), com as lesões predominando nos lobos superiores (determinação da distribuição) e com hiperinflação pulmonar importante. <face=”arial” size=”2″>Cintilografia pulmonar de inalação e perfusão para análise das áreas pulmonares com pior ventilação e perfusão. Lesões de campos pulmonares superiores são as mais adequadas para serem ressecadas. A cintilografia quantitativa de ventilação/perfusão pulmonar é preferível, facilitando a determinação das “áreas-alvo” a serem ressecadas. |
12 – São necessárias outras avaliações, como nutricional e psicológica? |
<face=”arial” size=”2″>Atualmente, deve ser considerada rotina a avaliação do perfil psicológico do doente, sendo excluídos os excessivamente rebeldes, negativistas ou depressivos. A avaliação nutricional é importante, pois pacientes com baixo peso e menor massa muscular têm maior morbidade e mortalidade. |
13 – Os doentes aceitos para cirurgia redutora de volume pulmonar devem submeter-se a algum tipo de tratamento clínico pré-operatório? |
<face=”arial” size=”2″>Sim. O objetivo do período pré-operatório é otimizar o esquema terapêutico, o que inclui broncodilatadores inalatórios, oxigenoterapia e antibioticoterapia, quando necessárias, e suporte nutricional. O paciente deve ser submetido a programa de reabilitação pulmonar com duração mínima de quatro a seis semanas. <face=”arial” size=”2″>A suspensão do tabagismo pelo menos seis meses antes da cirurgia é considerada como ponto fundamental, por ser indicativo de quão comprometido com o programa está o doente, além de ser um fator auxiliador no pós-operatório. |
14 – Quais são os critérios de exclusão para a cirurgia redutora de volume pulmonar? |
<face=”arial” size=”2″>Baseado no que foi proposto pelo estudo NETT, os indivíduos devem ser excluídos da cirurgia redutora caso apresentem:
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15 – Quais acessos operatórios podem ser utilizados para a cirurgia redutora de volume pulmonar? |
A escolha da via de acesso é decisão do cirurgião. Atualmente são utilizadas a esternotomia mediana, a toracotomia bilateral ou a videopleuroscopia, como procedimento menos invasivo.
<face=”arial” size=”2″>Esternotomia mediana <face=”arial” size=”2″>Permite acesso bilateral simultâneo. Suas limitações principais são o tratamento inadequado de aderências pleurais não previstas no pré-operatório e as ressecções de segmentos em lobo inferior esquerdo. Apresenta menor morbidade pós-operatória do que a toracotomia bilateral. <face=”arial” size=”2″>Toracotomia bilateral anterior <face=”arial” size=”2″>Permite acesso bilateral simultâneo. Há boa apresentação das estruturas intratorácicas. A morbidade pós-operatória nas toracotomias é, geralmente, maior que a observada nas esternotomias medianas. Pode ser feita com ou sem secção transversa do esterno (incisão em clam shell). <face=”arial” size=”2″>Videopleuroscopia com operações pouco invasivas <face=”arial” size=”2″>Permite acesso bilateral seqüencial no mesmo ato operatório, através de incisões limitadas e com pequena agressão ao arcabouço osteomuscular. A morbidade operatória é semelhante à verificada nas outras vias de acesso. Entretanto, o tempo de recuperação funcional pulmonar pós-operatória – volumes e fluxos pulmonares – é mais curo, fator este de aspecto fundamental e vantajoso para este grupo de doentes de risco elevado. |
16 – Como é realizada a cirurgia redutora de volume pulmonar? |
<face=”arial” size=”2″>A técnica operatória é fator importante para o sucesso do programa. Os seguintes pontos devem ser observados:
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17 – A cirurgia redutora de volume pulmonar deve ser unilateral ou bilateral? |
<face=”arial” size=”2″>Há evidências clínicas de que a operação deve ser bilateral e simultânea. Em procedimentos unilaterais, o benefício funcional obtido com a redução do volume do pulmão operado é eliminado pelo crescimento compensatório do pulmão não operado contralateral. <face=”arial” size=”2″>Entretanto, há indicações para videopleuroscopia unilateral. Doentes com lesões contralaterais, toracotomias prévias, pleurodese, com doença unilateral predominante (enfisema homogêneo contralateral) ou transplante unilateral podem se beneficiar do procedimento unilateral. Há também alguns doentes nos quais não há indicação da ressecção bilateral: os que tenham indicação de cirurgia estadiada (um lado em cada tempo operatório) e aqueles em que há complicação na primeira operação se evita realizar a redução do outro lado. |
18 – Quais são os cuidados no pós-operatório imediato? |
<face=”arial” size=”2″>A atenção aos doentes no período pós-operatório imediato é muito importante para o sucesso do programa. O pós-operatório imediato é realizado em unidade de terapia intensiva, com analgesia contínua com marcaína peridural, evitando-se o uso de morfina e seus derivados nos primeiros dias. Após esta fase inicial, todos os doentes devem ser idealmente submetidos a analgesia por eles controlada. A oxigenoterapia deve ser liberal no pós-operatório imediato, sob máscara ou cateter, para manutenção de saturação arterial acima de 90%. Progressivamente o uso de O2 pode ser descontinuado, à medida que a PaO2 do doente for melhorando. <face=”arial” size=”2″>Deve-se manter os medicamentos e doses utilizadas no pré-operatório, como broncodilatadores, corticosteróides (apenas doses de manutenção) e antibióticos. Não se recomenda a aspiração pleural contínua, exceto em caso de perda aérea importante ou em caso de grande espaço pleural pós-operatório. Nessas situações, não utilizar pressões de aspiração maiores que 10 mmHg. <face=”arial” size=”2″>Inicia-se a fisioterapia respiratória imediatamente após o doente acordar da anestesia. Esta inclui a mobilização precoce, drenagem postural, mudanças de decúbito, tosse induzida e expansão pulmonar. Há alguns grupos, como o de Cooper, que recomendam o exercício precoce, orientando o doente a andar em esteira já a partir do primeiro dia de pós-operatório. Deve-se manter o programa de reabilitação no pós-operatório tardio, com atenção especial à manutenção do treinamento e dos suportes psicológico e nutricional, a fim de garantir que o peso e a massa muscular sejam mantidos. |
19 – Qual deve ser o seguimento pós-operatório após a alta hospitalar? |
<face=”arial” size=”2″>O seguimento dos doentes após a alta hospitalar deve ser feito no terceiro e sexto meses e, após isto, a cada seis meses. Devem ser reavaliados os questionários de dispnéia e qualidade de vida, as provas de função pulmonar, incluindo pletismografia, espirometria e gasometria arterial, o teste de caminhada de seis minutos, a radiografia simples de tórax (PA e perfil) e a tomografia de tórax de alta resolução. |
20 – Quais são os resultados da cirurgia redutora de volume pulmonar? |
<face=”arial” size=”2″>O estudo NETT revelou dados interessantes em relação ao impacto da cirurgia redutora de volume pulmonar sobre a melhora da qualidade de vida e sobre a mortalidade dos portadores de enfisema pulmonar grave. Os resultados do acompanhamento de todos os doentes que preencheram os critérios de inclusão e exclusão do estudo foram os seguintes:
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21 – Quando se divide os pacientes em sub-grupos de acordo com a localização do enfisema e a capacidade de exercício, quais são os resultados da cirurgia redutora de volume pulmonar? |
<face=”arial” size=”2″>Embora os efeitos da operação de redução de volume pulmonar, juntamente com o tratamento clínico, tenham variado amplamente entre os participantes do estudo, foram identificadas duas características individuais que auxiliam a predizer se um candidato irá se beneficiar da operação de redução pulmonar: a localização do enfisema nos pulmões e a capacidade de exercício. Estas duas características combinadas formaram quatro grupos de participantes que apresentaram riscos e benefícios diferentes da operação de redução de volume pulmonar.
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22 – Com base nas evidências atuais podemos recomendar a cirurgia redutora de volume para quais pacientes? |
<face=”arial” size=”2″>Segundo o estudo NETT, quando se faz análise dos diferentes subgrupos, verifica-se que a cirurgia redutora de volume está indicada para aqueles pacientes com lesões nos ápices e baixa capacidade de exercício, que apresentam melhora significativa na sobrevida e na qualidade de vida, quando é empregado o tratamento cirúrgico. <face=”arial” size=”2″>Está por outro lado contra-indicada, a princípio, nos pacientes sem predomínio da doença nos lobos superiores e com alta capacidade de exercício. Nos outros tipos de apresentação do enfisema, caberia análise individualizada e decisão caso a caso. |
23 – Os resultados da cirurgia redutora de volume pulmonar duram por quanto tempo? |
<face=”arial” size=”2″>Constata-se que a mudança de mecânica pulmonar conseqüente à cirurgia redutora de volume pulmonar tem seu pico de melhora, na função pulmonar, nos primeiros seis meses após a operação. Nesse momento, há grande aumento no recolhimento elástico pulmonar, particularmente no nível da capacidade pulmonar total; aumento do diâmetro da via aérea, com aumento na sua condutância e elevação no fluxo expiratório máximo; diminuição na pressão transmural de segmento colapsável. Tais resultados persistem até os 12 meses de pós-operatório, apesar de serem menos evidentes que os verificados aos seis meses. <face=”arial” size=”2″>As reavaliações clínicas de doentes feitas aos seis, 12, 18, 24, 36 e 48 meses de pós-operatório mostram melhora sintomática em 92% dos doentes aos seis meses. As reavaliações subseqüentes ainda mostram que a melhora persiste, porém em um número progressivamente menor de pacientes. |
24 – Como é a relação custo-benefício da cirurgia redutora de volume pulmonar? |
<face=”arial” size=”2″>A análise de custo-benefício realizada no estudo NETT por três anos demonstrou que, em longo prazo, a cirurgia tem menor custo-benefício do que o tratamento clínico, em parte em razão dos altos custos relacionados ao procedimento. Para a operação de redução de volume pulmonar, os custos médios foram muito altos no primeiro ano devido às despesas relacionadas aos procedimentos cirúrgicos e à internação prolongada, necessária para a maioria dos doentes. <face=”arial” size=”2″>No terceiro ano de seguimento, entretanto, os custos totais dos cuidados médicos eram equivalentes na operação de redução de volume pulmonar e no grupo sob tratamento clínico. <face=”arial” size=”2″>O custo-benefício da operação de redução de volume pulmonar em longo prazo é incerto. O NETT aplicou modelos estatísticos baseados em tendências estimadas de sobrevida, custo e qualidade-de-vida e constatou que, se forem mantidos os benefícios da operação de redução de volume pulmonar, a relação custo-benefício da cirurgia poderia chegar a níveis comparáveis aos de outros tratamentos considerados de bom custo-benefício. Este resultado seria especialmente válido para os portadores de enfisema concentrado nos lobos superiores e baixa capacidade de exercício, que apresentaram sobrevida maior, com melhor ganho funcional após a cirurgia. |
25 – Quais são as principais mensagens sobre a cirurgia redutora de volume pulmonar retiradas do estudo NETT? |
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26 – O doente submetido a cirurgia redutora de volume pulmonar pode ser submetido a transplante pulmonar? |
<face=”arial” size=”2″>Muito se tem falado a respeito da cirurgia redutora de volume pulmonar em doentes que aguardam transplante pulmonar. Estudos têm demonstrado que, apesar do transplante, uni ou bilateral, resultar em função pulmonar superior, a cirurgia redutora de volume pulmonar promove melhora significativa dos sintomas mais incapacitantes, permitindo que o doente recupere certa qualidade de vida, com menor morbi-mortalidade e sem os inconvenientes efeitos colaterais da imunossupressão a que devem se submeter doentes transplantados. A redução volumétrica não impede, entretanto, a realização de transplante pulmonar no futuro. |
1 – Como evoluiu a utilização de medicamentos por via inalatória? |
Há mais de 4 mil anos já se inalava a fumaça da combustão de raízes e folhas de anticolinérgicos naturais, Datura sp, com fins medicinais. O fumo da Datura com finalidade terapêutica em doenças respiratórias foi introduzido na Europa no início do século XVIII e rapidamente tornou-se popular entre leigos e médicos.A via inalatória consolidou-se como a principal via de administração de drogas em doenças obstrutivas há menos de 50 anos, coincidindo com o surgimento dos nebulímetros, ou aerossóis dosimetrados, em 1956. Nas últimas duas décadas houve grandes avanços na eficiência de administração de drogas por via inalatória com o surgimento de espaçadores, nebulizadores de pó seco e, mais recentemente, dos nebulímetros com propelente que não lesam a camada de ozônio.Segue abaixo um breve histórico da utilização da via inalatória:
Em 2012, foi publicado no European Respiratory Journal, pela Força Tarefa da Sociedade Respiratória Europeia, o artigo “O Que o Especialista em Pneumologia Deveria Saber Sobre as Novas Terapias Inalatórias”. Vários conceitos descritos nesta publicação serão anexadaos à revisão deste Tema. |
2 – Quase são as limitações da aerossolterapia? |
Nem todos os dispositivos são apropriados para todos os pacientes. A razão é que os diversos dispositivos funcionam de modos distintos e há necessidade de se avaliar a qual dispositivo o paciente se adapta melhor. Neste aspecto há que se levar em conta a capacidade cognitiva e motora do paciente. A recomendação da Iniciativa Global para a Asma (GINA) é que antes de trocar o dispositivo deve-se checar como está a técnica do paciente e a adesão ao tratamento. Neste aspecto é muito importante sempre perguntar ao paciente a frequência do uso do aerossol, pois um número elevado de uso diário pode ser por necessidade, mas também pode ser porque a técnica está inadequada e para alcançar o efeito desejado o paciente utiliza mais vezes que o necessário. |
3 – Por que o mesmo fármaco pode ter doses diferentes em diferentes países? |
É porque em alguns países a dose descrita na bula é a dose nominal, ou seja, a dose que é a medida, enquanto que em outros a dose descrita é a dose que é liberada pelo dispositivo; mas a dose que os pacientes recebem é a mesma. |
4 – Por que a via inalatória tem melhor relação entre risco e benefício do que as demais? |
Devido à ação direta dos medicamentos sobre a mucosa respiratória, a via inalatória possibilita efeito máximo com pequenas dosagens – 30 vezes menores do que por via oral – e com baixas concentrações séricas. Desta forma, é possível obter-se rápido início de ação dos broncodilatadores e menor incidência de efeitos adversos, especialmente quando são usados corticosteroides inalatórios. |
5 – O que é o aerossol e como se deposita nas vias aéreas? |
O aerossol é uma suspensão de partículas sólidas e gotículas de líquido no ar. Os aerossois terapêuticos têm grande variação de diâmetro (heterodispersos) e são considerados respiráveis quando mais da metade tem entre 1 e 5 micra de diâmetro.A deposição dos aerossois é regulada por leis cinéticas e o diâmetro aerodinâmico é o fator mais importante:
A proporção de partículas com menos de 5 micra é frequentemente referida como fração de partículas finas (FPF). |
6 – O que é a técnica modulite? |
A técnica modulite foi criada pela CHIESI e consiste em desenvolver as partículas dos medicamentos com um diâmetro pré-concebido. No momento, eles lançaram a associação formoterol com beclometasona com partículas com diâmetro médio em torno de 1,3 micra. Partículas com este diâmetro alcançam a periferia dos pulmões, trazendo melhor eficácia ao medicamento.Partículas com diâmetro de 1 micra são conhecidas como extra-finas ou ultra-finas. Algumas das vantagens de inalar partículas extra-finas é que a coordenação acionar-inalar não é tão crítica e a deposição nos pulmões não é tão afetada pelo fluxo inspiratório. Estudos mostram que a deposição pulmonar com estas partículas pode chegar a mais de 50% e a distribuição tende a ser mais homogênea. A deposição destas partículas também se dá nas pequenas vias aéreas, o que, clinicamente, é bastante interessante. |
7 – Como a doença pulmonar pode afetar a deposição de medicação nos pulmões? |
A deposição nas vias aéreas centrais aumenta com o excesso de muco, fluxo de ar turbulento e obstrução das vias aéreas, portanto prejudicando a deposição nas vias aéreas periféricas. |
8 – A inalação pelas narinas é tão eficaz quanto a inalação oral? |
Não, a eficácia não é a mesma. As narinas, devido aos cornetos e à grande área interna, retêm uma alta proporção das partículas inaladas, daí elas serem consideradas melhores filtros do que a boca. Como decorrência disto, a deposição pulmonar de um medicamento é muito maior quando a inalação é realizada pela boca. Este fato passa a ter de ser considerado quando crianças pequenas fazem inalação, pois é difícil para elas inalarem pela boca. |
9 – Quais são os deveres do médico ao prescrever um aerossol? |
O médico deveria sempre rever estes três tópicos em cada visita e fazer com que o paciente utilize a medicação em sua frente para checar se o aerossol está sendo usado do modo certo. O uso correto implica em uma boa coordenação do acionamento do dispositivo e inalação. Se o paciente vai utilizar mais de um medicamento por aerossol, o médico deveria tentar manter o mesmo dispositivo para todos eles. |
10 – Quais os fatores que afetam a deposição do aerossol nas vias aéreas? |
Os fatores mais importantes que afetam a deposição dos aerossois são:
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11 – Quais os tipos de dispositivos inalatórios de que dispomos? |
Existem 5 tipos básicos de dispositivos:
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12 – Quanto de droga os dispositivos de inalação depositam nos pulmões? |
A deposição dos aerossois nos pulmões depende da interação entre dispositivo, medicamento e técnica de uso e varia de 6% a 30%, sendo em média de 10%. As maiores deposições pulmonares ocorrem com o uso de aerossol com HFA ou com CFC associado ao espaçador. Com o inalador de névoa, pode-se chegar a 50% de deposição nos pulmões. |
13 – Como são produzidos os aerossóis em cada tipo de dispositivo? |
Nebulizadores de jato e compressores domiciliares O fluxo de ar ou oxigênio, ao passar através de um pequeno orifício (Venturi), se expande, havendo queda brusca de sua pressão e grande aumento de sua velocidade. Por um efeito Bernoulli, o líquido do reservatório de inalação é sugado e são gerados aerossois. As partículas maiores são retidas em anteparos e se juntam ao restante do líquido do reservatório, para serem renebulizados, enquanto as menores são inaladas. |
Nebulizadores ultra-sônicos
A energia gerada pela vibração de um cristal piezoelétrico é transmitida à superfície da solução de líquido com medicamento, gerando gotículas que são liberadas da crista da onda líquida na forma de aerossois.
Nebulímetros
O medicamento encontra-se misturado com propelente, surfactante e lubrificantes sob regime de alta pressão (400 kPa). Ao sacudir o dispositivo, a solução penetra na câmara doseadora e, ao ser disparado, são liberados aerossois, em alta velocidade, com temperatura 10 a 15 oC inferior à do ambiente e com grande diâmetro, que se reduz à medida que o propelente evapora.
Nebulizadores de pó seco (aerolizer, turbuhaler, diskus, pulvinal)
Dispositivos nos quais os aerossois são gerados pelo próprio paciente. Os aerossois são produzidos quando um alto fluxo inspiratório atinge a dose de pó seco, com medicamento puro ou misturado com lactose.
Respimat®
O medicamento é disperso em água. A névoa é produzida por mecanismo mecânico em função de uma mola. O paciente inala ao mesmo tempo que aciona o mecanismo de liberação.14 – Quais os métodos utilizados para comparar a eficácia dos dispositivos?
Existem vários métodos para avaliação da eficácia dos dispositivos inalatórios e grande controvérsia entre os resultados dos estudos laboratoriais quando comparados com os estudos clínicos/funcionais. Os métodos mais importantes de avaliação dos dispositivos são:
Deposição de aerossol marcado:
- Indireta: possibilita a avaliação da porcentagem de aerossois que são depositados em impactadores, ou moldes de vias aéreas, que simulam a redução progressiva do calibre dos brônquios;
- Direta: avaliação da porcentagem de deposição de aerossol marcado com tecnécio 99, na orofaringe, estômago, esôfago e pulmões. Possibilita a comparação da porcentagem de deposição pulmonar central com a periférica.
Farmacocinético:
- Possibilita a comparação entre a biodisponibilidade pulmonar e total de medicamento. A biodisponibilidade pulmonar pode ser avaliada através da medida da concentração:
- urinária, inferior a 30 minutos após a inalação;
- sérica, inferior a 20 minutos após a inalação da droga;
- sérica após ingestão de carvão ativado, que bloqueia a absorção do medicamento pelo estômago.
Avaliação do efeito clínico/funcional:
- Essencial para comparação com os resultados obtidos em estudos farmacocinéticos ou de deposição dos aerossois. Para reduzir o número de resultados díspares entre os estudos, é fundamental utilizar doses equipotentes de medicamentos, checar a técnica de uso, carga eletrostática, padrão respiratório, tamanho da amostra, grau de obstrução das vias aéreas, critério de avaliação dos resultados e comparar criteriosamente a magnitude estatística com a magnitude clínica.
15 – Quais os aspectos básicos mais importantes sobre os nebulímetros?
Os nebulímetros ainda são os dispositivos mais usados na terapia inalatória. Em seu interior, o medicamento encontra-se misturado a propelente, surfactante e lubrificantes, que eventualmente podem provocar tosse.
O aerossol é liberado do nebulímetro com 40 micra de diâmetro e com velocidade de 30 metros/s. Por isso é importante dispará-lo a 4 cm da boca, para haver tempo de evaporação do propelente, com consequente redução de seu diâmetro e velocidade. Desta forma, haverá menor deposição na orofaringe e maior deposição nas vias aéreas inferiores. Com a técnica de uso otimizada, 80% do aerossol se deposita na orofaringe, 10% nas vias aéreas inferiores, 9% permanece próximo a válvula do nebulímetro e 1% é exalado.
Há uma tendência de queda progressiva de utilização dos nebulímetros nos próximos anos devido à cessação da produção de gases propelentes CFC, aos problemas decorrentes da transição para o uso de propelentes hidrofluoralcano (HFA 134a) e ao surgimento de novos nebulizadores de pó seco, com seus atrativos e custos cada dia mais competitivos.
16 – Quais as vantagens e desvantagens dos nebulímetros?Tabela 1.17 – Qual a técnica ideal de uso dos nebulímetros?
- Retirar a tampa;
- Agitar o dispositivo (não agitar pode reduzir a dose liberada em 36%);
- Posicionar a saída do bocal verticalmente 3 a 5 cm da boca (ou utilizar espaçador). Disparo dentro da boca não é considerado erro, entretanto. Disparo distante da boca reduz deposição na orofaringe, devido maior tempo para evaporação do propelente e redução da velocidade do aerossol;
- Manter a boca aberta, caso o disparo seja distante da boca;
- Antes de disparar, expirar normalmente, pois expiração forçada pode provocar broncoespasmo e reduzir a deposição nas vias aéreas inferiores;
- Disparar no início de inspiração lenta e profunda (< 30 l/m). A redução do turbilionamento do fluxo de ar aumenta a deposição periférica do aerossol;
- Coordenação disparo inspiração: maior empecilho ao uso destes dispositivos;
- Fazer pausa pós-inspiratória de no mínimo 10 s;
- Não é necessário aguardar 30 segundos para novo disparo, isso não aumenta a deposição e pode reduzir a adesão ao tratamento.
18 – Quais os erros de técnica mais comuns cometidos pelos pacientes ao utilizarem os nebulímetros?
A literatura considera que 12% a 89% dos pacientes não utilizam os nebulímetros com técnica correta. Há alguns anos atrás avaliamos a técnica de uso dos nebulímetros de 70 pneumopatas tratados em um ambulatório de pneumologia, e constatamos que:
- 66% dos pacientes cometiam erros de técnica;
- Mais da metade dos pacientes cometiam erros graves como:
- Não expirar antes de acionar;
- Inspirar antes do acionamento;
- Não inspirar profundamente;
- Não fazer pausa inspiratória.
- 40% tinham constrangimento de usar o nebulímetro em público;
- 29% tinham medo de usá-lo devido ao “risco de viciar ou provocar problemas cardíacos”.
Por esses motivos é essencial orientar e checar periodicamente a técnica de uso dos nebulímetros e conversar com o paciente sobre suas dúvidas e receios de utilizá-los.
19 – Por que cessou a produção dos gases CFC-cloro fluor carbono (freon)?
Os gases CFC, também conhecidos como freon, são liberados para a estratosfera e sob ação dos raios ultravioletas, liberam íons cloro. Um átomo de cloro degrada 1 milhão de moléculas de ozônio (O3) e tem meia vida de superior a 100 anos.
Na década de oitenta foi detectado buraco na camada de ozônio da Antártida. A redução desta camada aumenta a incidência de câncer de pele e catarata, interfere no ecossistema aquático etc. Em 1988 foi assinado em Montreal um protocolo, hoje com participação de mais de 160 países, que estipulava eliminar a produção de CFC, inclusive para fins medicinais, como única alternativa de prevenir a progressão do buraco da camada de ozônio.
Este protocolo determinou o período de tempo que deixaria de haver o uso de CFC no mundo, baseado em uma sequência progressiva de eliminação na produção dos produtos que utilizam o CFC: ar condicionado, freezer e geladeira, espumas, spray para ar ambiente e medicamentos. Passados 20 anos, o Brasil fez um trabalho eficiente, eliminando o gás CFC nestes produtos, em cronograma mais rápido do que o estipulado pelo Protocolo, restando somente os medicamentos que ainda usavam CFC. Mas, no dia 31 dezembro de 2011 foi a última data que se pode ainda fabricar algum medicamento com CFC no país. A partir de 2012 ainda poderão ser comercializados, até que se esgotem os estoques, os medicamentos que foram fabricados ainda em 2011.
20 – Quais são as alternativas à retirada dos nebulímetros CFC?Administração de drogas inalatórias via nebulizadores de jato
Descartada devido inúmeras desvantagens, com destaque para a necessidade de fonte de energia, demora para inalação da droga, dificuldade de transporte e necessidade de manutenção e limpeza.
Uso de propelente que não lesa a camada de ozônio como o hidrofluoralcano (HFA 134a)
Este é um gás inerte, não tóxico, com rápida absorção e eliminação dos pulmões, e que não se acumula. Ele é eficaz e seguro para uso de aerossois medicinais. Já há vários broncodilatadores e corticoides inalatórios que utilizam o HFA como gás propelente. No período de transição, os profissionais de saúde e os pacientes foram educados sobre as propriedades e diferenças do novo propelente.
Uso de nebulizadores de pó seco
Não necessitam de propelentes, são mais fáceis de serem usados. Atualmente, em uso crescente e custo decrescente.21 – Quais são as diferenças entre os nebulímetros com propelente HFA vs. CFC?
O processo de fabricação, o material utilizado na câmara doseadora e na válvula, os aditivos e as propriedades aerodinâmicas dos aerossois gerados por nebulímetros que utilizam HFA são diferentes daqueles que usam CFC. Os nebulímetros HFA têm liberação de dose mais consistente, com menor chance de variação no final do uso do dispositivo (“tailing-off”).
A utilização de HFA traz a vantagem do jato de gás ser muito mais lento e as partículas terem menor diâmetro que as do CFC, permitindo que haja maior deposição do medicamento nos pulmões.
Existem diferenças entre o peso do dispositivo e o gosto do aerossol dos nebulímetros CFC quando comparados com os HFA. Entretanto, os mesmos se equivalem quanto à eficácia e segurança para administração de salbutamol, fenoterol, ipratrópio e cromoglicato de sódio. O aerossol HFA de beclometasona tem menor diâmetro do que o CFC e se distribui mais homogeneamente e perifericamente, possibilitando efeito semelhante com metade da dose.
Em resumo, as diferenças do gás HFA em relação ao CFC são:
- partículas menores;
- fluxo diminuído;
- formação de névoa e não de jato;
- temperatura mais elevada;
- não necessidade de uso de espaçador;
- discreto gosto amargo;
- maior deposição de medicamento nos pulmões.
22 – Em relação à camada de ozônio e efeito estufa, qual o papel do HFA?O HFA não tem nenhum efeito sobre a camada de ozônio. Em relação ao efeito estufa, apesar de ser menor do que o do gás CFC, ainda mantém um certo grau de ação.23 – Quando utilizar espaçadores?
Os espaçadores valvulados de grande volume (500 a 750 ml) facilitam a técnica de uso dos nebulímetros por eliminar a necessidade de coordenação entre o disparo e a inspiração. Possibilitam iniciar a inspiração até 2 segundos após o disparo do nebulímetro.
Espaçadores e tubo extensores de pequeno volume podem ser úteis, entretanto, são menos eficientes do que os espaçadores de maior volume, além de não terem técnica de uso padronizada. Poderiam ser superiores a estes quando usados em pacientes com baixo volume inspiratório, como idosos e crianças muito pequenas.
Os espaçadores devem ser inspecionados pelo médico a cada 3 a 6 meses e sempre que houver dúvidas sobre o seu funcionamento.
As principais indicações do uso de espaçadores são:
- Pacientes que não conseguem usar o nebulímetro adequadamente, apesar de reiteradas orientações da técnica, e que não querem, não conseguem utilizar adequadamente ou têm dificuldade para adquirir nebulizadores de pó seco;
- Pacientes com dispneia que dificulte a coordenação ou a pausa pós-inspiratória, como nas crises de asma ou DPOC;
- Efeitos adversos orofaríngeos persistentes devido aos corticosteroides.
24 – Quais são os tipos de espaçadores existentes?
- Formato: pêra, cilíndricos, cone, arredondados;
- Material – plástico, metal, papel;
- Adaptador do nebulímetro – específico para cada medicamento ou universal;
- Volume – 90 a 800 ml;
- Durabilidade – descartáveis ou de longa duração;
- Com ou sem válvula – valvulados são melhores;
- Com ou sem sinalizador de fluxo – facilita o aprendizado do uso em baixos fluxos inspiratórios, apita quando o fluxo inspiratório é muito alto (ex: Ace);
- Fabricação industrial ou caseira – espaçadores, não valvulados, feitos de garrafa plástica de 500 ml, mas não de copo plástico, são eficientes.
25 – Quais as vantagens e desvantagens dos espaçadores?Tabela 2.26 – Qual a técnica de uso dos espaçadores?1. Retirar a tampa do nebulímetro;
2. Agitar o nebulímetro;
3. Acoplar o nebulímetro ao espaçador, posicionando a saída do bocal verticalmente;
4. Expirar normalmente;
5. Colocar o bocal do espaçador na boca ou a máscara sobre a boca e o nariz, no caso de crianças muito pequenas ou idosos com grande dificuldade de uso;
6. Disparar o nebulímero e logo em seguida iniciar inspiração lenta e profunda, pela boca (fluxo inspiratório < 30 l/m), ou fazer 3 a 5 respirações em volume corrente;
7. Fazer pausa pós-inspiratória de no mínimo 10 s;
8. Repetir todas as etapas anteriores para cada disparo do nebulímetro. Disparos múltiplos para a mesma inspiração pode reduzir a dose depositada nos pulmões em até 50%, devido a atração das cargas eletrostáticas dos aerossóis.27 – Crise de asma – usar nebulização de jato ou nebulímetro acoplado ao espaçador?
Vários estudos, bem conduzidos, demonstram não haver diferença entre a resposta ao tratamento inalatório da crise de asma realizado com nebulímetros acoplados a espaçadores de grande volume ou nebulizadores de jato, desde que sejam utilizadas doses equipotentes de broncodilatadores.
A dose de broncodilatadores via nebulímetro acoplado aos espaçadores deve ser 4 a 6 vezes menor do que a utilizada via nebulizadores de jato. Por exemplo: salbutamol ou fenoterol 500 mcg (5 jatos) com espaçador = 2500 m g (10 gotas) via nebulização de jato.
28 – Qual o papel da carga eletrostática nos espaçadores?
As paredes dos espaçadores de plástico têm carga eletrostática que atrai os aerossois produzidos pelos nebulímetros e reduz a quantidade de medicamento que seria liberada para o paciente. A importância clínica desta redução é duvidosa. Em um estudo, foi demonstrado que a carga eletrostática dos espaçadores que foram tratados com detergente caseiro era 4 vezes menor e a deposição pulmonar 4 vezes maior do que a obtida com espaçadores sem tratamento.
A carga eletrostática dos espaçadores:
- Diminui após uso de 20 jatos do nebulímetro;
- Retorna após lavagem com água, especialmente quando são enxugados com tecido ou papel;
- Reduz acentuadamente após o uso de detergente caseiro (cria uma película antiestática). Deve-se mergulhar o espaçador em solução de água com detergente caseiro, neutro (2 gotas/litro de água), retirar após 30 minutos e deixar secar ao ar livre O efeito dura até por 1 mês;
- É eliminada com espaçadores de metal;
- É um dos motivos de discordância entre os resultados de estudos de deposição de aerossois que utilizam espaçadores com e sem camada anti-estática;
- Tem maior impacto em espaçadores de pequeno volume.
29 – Existe espaçadores com material antieletrostático?Sim, existe o modelo Aerochamber que é fabricado com um plástico não-estático. Um outro espaçador, Vortex, é construído com uma fina camada de metal revestindo a sua parte interna.30 – Quais as diferenças básicas entre os nebulizadores de pó seco e os nebulímetros?Tabela 3.31 – Quais são os tipos de nebulizadores de pó seco que dispomos e quais as principais diferenças entre eles?Tabela 4.32 – Quais as diferenças de preparo de dose para ser inalada em cada nebulizador de pó seco?
O preparo da dose varia de acordo com cada dispositivo:
- Aerolizer – colocar uma cápsula no dispositivo e em seguida perfurá-la, comprimindo as garras laterais do dispositivo;
- Diskhaler – colocar um blister com 4 doses no dispositivo, rodá-lo para posicionar uma das doses, perfurar o blister elevando e movimentando para cima e para frente a tampa superior;
- Turbuhaler – retirar a tampa do dispositivo e posicioná-lo na vertical, girar a base colorida no sentido horário e depois no sentido anti-horário até escutar um click;
- Diskus – abrir o dispositivo rodando o disco para no sentido anti-horário, em seguida puxar sua alavanca para trás.
33 – Qual a técnica de uso dos nebulizadores de pó seco, após preparo da dose?1. Expirar normalmente;
2. Colocar o dispositivo na boca;
3. Inspirar o mais rápido e profundo possível (fluxo mínimo de 30 l/min);
4. Fazer pausa pós inspiratória de 10 segundos (talvez não seja necessária com turbuhaler);
5. Em dispositivos de dose única, fazer nova inspiração, mais profunda que a anterior, caso reste pó na cápsula.34 – Na pergunta anterior está dito que a expiração deve ser realizada normalmente. Nas bulas existe a orientação de que a expiração deveria ser realizada totalmente. Qual a orientação a ser seguida?O certo é expirar normalmente, não forçadamente. Este modo correto é baseado na fisiologia respiratória, que nos ensina que ao expirar até o volume residual, os bronquíolos das bases se fecham antes de se alcançar o volume residual. A este volume pulmonar denomina-se volume de fechamento e ele é tão mais precoce alcançado quanto mais doente o brônquio estiver. Com os bronquíolos das bases fechados, a inspiração do aerossol vai primeiramente para os ápices e não para as bases, aonde estão a maioria dos bronquíolos e ocorre a maior parte da ventilação.35 – Quais as vantagens e desvantagens dos nebulizadores de pó seco?Tabela 5.36 – Quais são os aspectos básicos do turbuhaler?
O turbuhaler foi o primeiro dispositivo de pó seco disponível com grande número de doses. É um dispositivo de alta resistência e muito fácil de ser preparado e usado. Pode depositar mais medicamento nos pulmões do que os nebulímetros, desde que, o paciente consiga gerar fluxo inspiratório superior a 60 l/min.
Uma das queixas dos pacientes ao usar o turbuhaler é a dificuldade dele(a) saber se a dose de medicamento foi liberada. Isto ocorre porque o volume de medicação liberada é muito pequeno, pois as partículas são muito pequenas e, além disso, a budesonida não tem odor ou gosto. Para atenuar este problema, existe o turbuhaler com marcador de doses, contendo budesonida (200 ou 400 mg) associada a formoterol (6 mg). O contador de dose informa quantas doses há ainda no dispositivo e sua contagem varia de 10 em 10 doses.
Alguns estudos sobre o turbuhaler merecem destaque:
- Em 24 pessoas sadias a deposição pulmonar de budesonida via turbuhaler foi o dobro e a gastrointestinal a metade do que via nebulímetro (Thorson L et al. Eur. Respir. Dis. 1994);
- Em 30 asmáticos em uso de budesonida, apenas 13 de 5248 medidas do pico de fluxo inspiratório com turbuhaler foram inferiores a <40 l/min (Meijer RJ et al. Thorax 1996);
- Nos pacientes com DPOC grave, com VEF1 em torno de 0,7 ± 0,2 l, mais de 70% dos pacientes não conseguem gerar fluxo inspiratório maior que 59 l/min (Dewar MH et al. Respir. Med. 1999);
- Pouco mais da metade das crianças com idade inferior a 8 anos e apenas 20% daquelas com menos de 5 anos conseguem usar corretamente o turbuhaler. Nas crianças acima de 8 anos, mais de 90% delas conseguem fazê-lo (Boeck KD et al. J. Allergy Clin. Immunol. 1999);
- A maioria dos asmáticos em crise consegue gerar fluxo inspiratório de no mínimo 30 l/min; em 90 asmáticos em crise, o pico do fluxo inspiratório com turbuhaler foi de 60 ± 20 l/min e sem turbuhaler 152 ± 77 l/min (Bronw PH et al. Eur. Respir. J.1995).
37 – Quais os aspectos básicos do diskus?
Foi o primeiro dispositivo de pó seco com marcador de dose e que funciona bem sem necessitar de fluxo inspiratório muito alto.
Estudos importantes:
- Em um estudo de 129 crianças, o pico do fluxo inspiratório através do diskus foi maior do que 30 l/min em 96% e superior a 90 l/min em 26%. O controle da asma foi semelhante em pacientes que usaram salmeterol diskus com baixo ou alto fluxo, respectivamente, 30 e 90 l/min (Nielsen KG et al. Eur. Respir. J. 1998);
- O diskus tem menor porcentagem de deposição de aerossol de pequeno diâmetro e menor dependência do pico do fluxo inspiratório do que o turbuhaler (Bisgaard H et al. Eur. Respir. J. 1998).
38 – Quais os aspectos básicos do dispositivo aerolizer ?O areoloizer foi o primeiro dispositivo de pó seco lançado no Brasil. É mais eficiente com altos fluxos. O inconveniente de ter de transportar e preparar as cápsulas do dispositivo é equilibrado pela certeza de inalação da dose e a chance de nova inalação caso todo o pó não tenha sido inalado. Atualmente existe o aerolizer com a associação de cápsula de beclometasona 200 ou 400 mcg e formoterol 12 mcg.39 – O que é o Pulvinal?Pulvinal (easivent), contém beclometasona. É um dispositivo pequeno, de alta resistência, com múltiplas doses no qual o medicamento encontra-se misturado a lactose e magnésio. Seu reservatório de pó seco é transparente permitindo ao paciente a visualização das doses restantes. Os estudos iniciais sugerem que o pulvinal tem menor dependência do fluxo inspiratório do que o turbuhaler e deposita 11% a 14% de aerossol nos pulmões com pico do fluxo inspiratório de 30 a 60 l/min.40 – O que são os inaladores de névoa suave?
Este inalador foi lançado há pouco mais de um ano no Brasil e o nome registrado é Respimat®. Este inalador foi desenvolvido pela Indústria Farmacêutica Boehringer e aqui no Brasil ele é veículo do medicamento tiotrópio. Na Alemanha o Respimat® serve também para a liberação da associação fenoterol e ipratrópio.
O Respimat® caracteriza-se por produzir uma névoa com partículas muito pequenas, com uma velocidade bastante baixa o que leva à deposição pulmonar de mais de 50% do total da medicação liberada. Uma outra vantagem do Respimat® é que ele não tem nenhuma ação deletéria sobre a camada de ozônio ou efeito estufa pois o veículo é aquoso.
O mecanismo de funcionamento baseia-se no uso da energia mecânica de uma mola que impulsiona a dose de medicamento passar por dois tubos capilares e no choque dos fluxos líquidos, criando a névoa.
41 – Quais os fatores que mais afetam o débito dos nebulizadores de jato?
Determinantes mais importantes
- Tipo e marca do nebulizador: o débito varia acentuadamente entre as diversas marcas de compressores e copinhos de nebulização;
- Fluxo de gás ou ar comprimido: <4 l/min não produz aerossóis respiráveis (diâmetro de 1 a 5 m);
- Volume residual do copo de nebulização: o volume de líquido que, usualmente, permanece nas paredes do copo varia de 0,6 a 1 ml. Quanto maior esse volume, menor o débito de medicamento liberado para inalação;
- Padrão da respiração do paciente: respiração pelo nariz reduz a deposição pulmonar em 50%. Respiração muito rápida, com fluxo turbilhonado, aumenta a deposição em vias aéreas superiores.
Determinantes que necessitam de mais estudos para definir a importância
- Concentração da solução;
- Viscosidade/tensão superficial da solução;
- Temperatura da solução;
- Carga eletrostática do copinho de nebulização;
- Condições ambientais.
42 – Como obter eficiência máxima dos nebulizadores de jato?
- Fluxo de ar ou oxigênio de 6 a 8 l/m;
- Diluir o medicamento em 3 a 4 ml de soro fisiológico: volumes maiores reduzem a perda para o espaço morto mas aumentam o tempo de nebulização;
- Respirar pela boca;
- Adaptar a máscara à face (em adultos o uso de bocal seria mais confiável): distância de 2 cm da face reduz 85% da dose liberada para os pulmões;
- Retirar a máscara da face, para conversar ou devido à ansiedade causada pela dispnéia, reduz acentuadamente a porcentagem de dose nos pulmões;
- Manutenção e limpeza periódicas:
- Evita contaminação e obstrução dos orifícios de produção do aerossol;
- Lavar com água morna após cada nebulização,
- Uma vez por semana esterilizar o copinho de nebulização, por exemplo, com solução de vinagre branco e água na proporção 1/1, por 30 minutos. Não lavar a mangueira de nebulização.
43 – Todos os nebulizadores de jato são eficientes?
É muito frequente que os pacientes reclamem que a nebulização feita em casa é fraca e não melhora o broncoespasmo, quando comparada com a realizada no hospital. Em um estudo de 23 combinações de 15 marcas de compressores e 11 copinhos de nebulização foi constado que:
- O ruído dos aparelhos era muito alto – 50 a 68 decibéis;
- O fluxo gerado variava de 3 a 8 l/m – para produção de aerossóis respiráveis é necessário fluxo mínimo de 4 l/min;
- A porcentagem de aerossóis respiráveis variou de 20 a 83% – o ideal seria que mais de 50% fossem de diâmetro variando de 1 a 5 m;
- O volume nebulizado em 10 minutos variou de 17 a 71% – para aumentar a adesão e evitar que o paciente se irrite, é aconselhável que a nebulização completa não dure mais que 10 minutos;
- Apenas 40% combinações eram eficientes.
44 – Quais as vantagens e desvantagens dos nebulizadores de jato, incluindo compressores domiciliares?Tabela 6.45 – Quais as vantagens e desvantagens da nebulização ultra-sônica?Tabela 7.46 – Em que se baseia a escolha dos dispositivos inalatórios?
Existem inúmeros tipos de dispositivos, com ampla variação de técnica de uso, custos, facilidade de transporte e de uso durante crises de broncoespasmo. Independente do dispositivo que for escolhido, em comum acordo com o paciente, é fundamental orientar e checar a técnica de uso periodicamente. Orientações sobre o funcionamento do dispositivo, seus benefícios e redução dos temores infundados atribuídos ao uso de aerossóis ajudam a aumentar a adesão ao tratamento.
Ao fazer a escolha do dispositivo, considerar os seguintes fatores:
Relacionados ao paciente:
- Idade – idosos e crianças pequenas têm maior dificuldade de usar nebulímetros e nebulizadores de pó seco com alta resistência;
- Adesão – avaliar os motivos de alta ou baixa adesão com o uso prévio dos dispositivos;
- Grau de obstrução – pacientes com obstrução grave, especialmente aguda, têm maior dificuldade de utilizar nebulímetros e podem não obter efeito máximo de nebulizadores de pó seco com alta resistência;
- Doenças associadas – pacientes com baixa acuidade visual ou motora podem ter dificuldade para usar dispositivos que necessitam de disparo manual, como nebulímetros, ou que necessitam de preparo de dose como certos nebulizadores de pó ou de jato;
- Preferência – é de fundamental importância respeitar a preferência do paciente por determinado dispositivo, inclusive devido ao custo.
Relacionados a droga/dispositivo
- Apresentação
- formato do dispositivo;
- facilidade para saber que a dose foi inalada – maior com dispositivos que têm marcador de dose ou veiculados por cápsula;
- facilidade de saber que dispositivo está vazio – pior com nebulímetros.
- Dose – adequar o número de aplicações à dose prescrita;
- Custo/efetividade – dispositivos mais caros, como pó seco, podem ter melhor relação de custo/adesão/efetividade, do que os mais baratos, como nebulímetros;
- Transporte – espaçadores, mesmo de pequeno volume, não cabem no bolso e podem dificultar a adesão;
- Limpeza – inconveniente e fundamental nos nebulizadores de jato;
- Deposição pulmonar – nem sempre o dispositivo que deposita maior porcentagem de medicamento nos pulmões poderá ser usado com eficiência máxima pelo paciente. A deposição varia muito entre os dispositivos e com a técnica de uso e com o grau de obstrução das vias aéreas.
47 – Segundo o artigo da Força Tarefa da European Respiratory Society e da International Society for Aerosls in Medicine, quais as recomendações para o prescritor?
- Deveria conhecer os tipos de dispositivos que estão disponíveis para liberar os fármacos específicos e as classes dos medicamentos;
- Saber as vantagens e desvantagens de cada dispositivo;
- Escolher dispositivos que o paciente possa e usará efetivamente;
- Escolher dispositivos que tenham sido aprovados pelas autoridades competentes;
- Treinar os pacientes sobre a manobra correta da inalação para o dispositivo que foi escolhido;
- Checar regularmente a técnica do paciente com o inalador;
- Rever a adesão do paciente ao tratamento em cada visita;
- Não trocar para um novo dispositivo sem o envolvimento do paciente e seguimento da parte educativa em como usar o dispositivo apropriadamente.
1 – Qual a definição de cor pulmonale? |
Cor pulmonale é a alteração na estrutura e/ou função do ventrículo direito secundária a hipertensão pulmonar que, por sua vez, é causada por doença que acomete os pulmões ou sua circulação. Devem ser excluídas dilatações de ventrículo direito secundárias à falência do ventrículo esquerdo, como as causadas por cardiopatias congênitas ou valvares adquiridas. |
2 – Quais são os mecanismos que podem determinar o cor pulmonale? |
A pressão na circulação pulmonar é baixa (em média cinco vezes menor que a sistêmica) em função de tratar-se de um circuito de grande distensibilidade e baixa resistência. Quando a resistência na circulação pulmonar se eleva, o ventrículo direito não é capaz de bombear adequadamente o sangue, surgindo a falência cardíaca direita. Os mecanismos patogênicos envolvidos são:
Deve-se ressaltar ainda que a circulação pulmonar exposta a altos níveis pressóricos pode ainda ser alvo de trombose secundária in situ, agravando a hipertensão arterial. |
3 – Quais são as causas de cor pulmonale? |
A seguir estão listadas algumas das principais causas de cor pulmonale, sendo que cada uma delas encaixa-se em um ou mais dos mecanismos patogênicos descritos anteriormente.Doenças pulmonares
Doenças da circulação pulmonar
Doenças neuromusculares
Alterações da parede torácica
Doenças do controle da ventilação
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4 – Como deve ser feita a suspeita inicial de cor pulmonale? |
Existem duas formas principais pelas quais se chega ao diagnóstico de cor pulmonale. Na primeira delas, diante de sintomas e sinais de falência de ventrículo direito, os quais serão discutidos adiante, inicia-se a investigação e chega-se ao diagnóstico de uma doença pulmonar ou de sua circulação que é a responsável pela falência cardíaca. Na segunda forma, provavelmente a mais comum, a partir do diagnóstico de uma doença que sabidamente pode evoluir para hipertensão pulmonar e falência de ventrículo direito, ou seja, cor pulmonale, o paciente passa a ser monitorado em relação ao surgimento dessas complicações. |
5 – Quais são os sintomas no cor pulmonale? |
O sintoma mais freqüente é a dispnéia de esforço, que pode ser acompanhada de fadiga ou letargia. Elas decorrem da impossibilidade de aumento do débito cardíaco em função da obstrução no leito vascular pulmonar. Eventualmente, pela mesma razão, pode haver síncope durante o esforço.Dor torácica com características de angina pode ocorrer, sendo atribuída à isquemia subendocárdica no ventrículo direito, em função da hipoxemia e do aumento da pressão transmural neste local, ou à compressão dinâmica da coronária esquerda pela artéria pulmonar dilatada.Em fases mais avançadas, a congestão hepática pode determinar dor em quadrante superior direito do abdome e anorexia. Outros sintomas menos comuns incluem tosse, hemoptise e rouquidão, esta por compressão do nervo laringo-recorrente esquerdo pela artéria pulmonar dilatada.Deve-se estar atento à presença de sintomas das doenças capazes de determinar cor pulmonale. |
6 – Quais são os achados de exame físico no cor pulmonale? |
As alterações de exame físico no cor pulmonale são as decorrentes da hipertensão pulmonar, da hipertrofia/dilatação do ventrículo direito e da falência do ventrículo direito.Sinais de hipertensão pulmonar
Sinais de hipertrofia de VD
Sinais de falência de VD
Como ocorre em relação aos sintomas, deve-se estar atento em relação a achados de exame físico da doença de base. |
7 – Quais são os achados radiográficos no cor pulmonale? |
O radiograma de tórax é um exame importante na investigação do cor pulmonale, mesmo podendo ser normal em até 10% dos pacientes com hipertensão pulmonar. Além de poder fornecer dados importantes para o diagnóstico do cor pulmonale em si, ele pode auxiliar na caracterização da sua etiologia.Os principais achados de hipertensão pulmonar são o alargamento das artérias pulmonares centrais e o apagamento dos vasos periféricos. O ramo descendente da artéria pulmonar direita com largura maior que 20 mm é importante achado para o diagnóstico de hipertensão pulmonar.Na presença de falência de ventrículo direito, observa-se aumento das câmaras direitas (ventrículo e átrio). No perfil, o aumento do VD leva à redução do espaço retroesternal, achado que pode ser mascarado na vigência de hiperinsuflação. |
8 – Quais são os achados eletrocardiográficos no cor pulmonale? |
Os principais achados de cor pulmonale ao ECG são:
Esses achados são mais específicos do que sensíveis, ou seja, a ausência dos mesmos não exclui as sobrecargas de câmaras direitas. Além disso, as presenças de hipertrofia ventricular esquerda concomitante ou de DPOC reduzem ainda mais a sensibilidade. |
9 – Qual o papel do ecocardiograma no diagnóstico do cor pulmonale? |
O ecocardiograma é o melhor exame não-invasivo para avaliar pacientes com suspeita de hipertensão pulmonar e cor pulmonale. A hipertensão pulmonar determina espessamento da parede do ventrículo direito (VD) e deslocamento do septo para o ventrículo esquerdo (VE) durante a sístole. Em fases mais avançadas há dilatação do VD e do átrio direito, além de regurgitação tricúspide em função de dilatação do anel valvar. A partir do momento em que há regurgitação tricúspide, o ecocardiograma com Doppler pode estimar a pressão da artéria pulmonar. Outro achado ecocardiográfico, presente em fases avançadas, é a distensão da veia cava inferior, a qual passa a não sofrer colapso na inspiração.Por fim, o ecocardiograma é importante para afastar falência de VE, cardiopatias congênitas ou valvares como causa da falência do VD, definindo assim o cor pulmonale. |
10 – Qual o papel do cateterismo cardíaco direito no diagnóstico do cor pulmonale? |
Embora seja o padrão-ouro para o diagnóstico de hipertensão pulmonar e cor pulmonale, por tratar-se de exame invasivo e disponibilidade restrita, o cateterismo cardíaco direito nem sempre é feito. Sua indicação é restrita às condições em que as informações necessárias para a condução do caso não podem ser obtidas pelo ecocardiograma com Doppler. As principais indicações incluem:
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11 – Que outros exames complementares são úteis na avaliação do paciente com cor pulmonale? |
Os demais exames complementares que auxiliam na condução de pacientes com cor pulmonale são os relacionados ao diagnóstico da doença de base e à avaliação da função pulmonar, que determinam a intensidade das alterações que estão determinando hipertensão pulmonar e falência do ventrículo direito. A seleção dos exames deve ser guiada, obviamente, pela suspeita clínica.Os principais exames são:
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12 – Quais são as bases do tratamento do cor pulmonale? |
O tratamento do cor pulmonale baseia-se em:
A seguir entraremos em maiores detalhes sobre os diferentes pontos do tratamento do cor pulmonale. |
13 – Qual o papel da oxigenoterapia no cor pulmonale? |
A oxigenoterapia é uma das mais importantes medidas no tratamento do cor pulmonale, determinando, nos pacientes hipoxêmicos, melhora dos sintomas, da qualidade de vida e da sobrevida, efeitos muito bem definidos entre os pacientes com DPOC, mas que têm sido extrapolados para outras causas de cor pulmonale. Ela reduz a vasoconstrição pulmonar e, assim, a resistência vascular pulmonar, melhorando o volume sistólico do ventrículo direito e o débito cardíaco. Acredita-se ainda que a oxigenoterapia reduza a vasoconstrição renal e melhore a excreção de sódio. A melhora da oxigenação do sangue arterial permite melhor funcionamento dos diferentes órgãos vitais, como coração, cérebro, dentre outros.As indicações de oxigenoterapia suplementar são:
Quando indicada, a oxigenoterapia deve ser empregada pelo maior número de horas possível, insistindo-se no mínimo de 15 horas por dia. O fluxo de oxigênio deve ser ajustado para manter a PaO2 entre 60 e 80 mmHg ou a SaO2 entre 90 e 92%. Do ponto de vista prático, recomenda-se aumentar o valor titulado em 1 l/min durante a noite, período em que pode haver hipoventilação e maior queda da oxigenação. Durante atividades físicas também podem ser necessários aumentos. |
14 – Quando está indicada a flebotomia no tratamento do cor pulmonale? |
A flebotomia está indicada quando o hematócrito encontra-se acima de 55%, devendo ser repetida até que ele chegue a 50%. Assim reduz-se a viscosidade do sangue e a resistência vascular pulmonar. O uso apropriado da oxigenoterapia reduz sobremaneira a necessidade de flebotomias. |
15 – Quais as medicações inotrópicas positivas estudadas no cor pulmonale? Quais os seus papéis? |
As medicações com ação inotrópica positiva estudadas no cor pulmonale são: digoxina, aminofilina e beta-adrenérgicos.Não há indicação para o uso de digital no cor pulmonale crônico, a não ser que haja falência concomitante de ventrículo esquerdo. Além da falta de benefícios, podem ocorrer arritmias como efeitos adversos, as quais podem ser facilitadas pela hipóxia e pela hipopotassemia, quando presentes. Alguns estudos sugerem que, na exacerbação da DPOC com falência respiratória, o uso de digital endovenoso aumenta a força de contração e o fluxo sanguíneo do diafragma e pode ser benéfico.A teofilina parece ter um efeito benéfico no tratamento do cor pulmonale. Ela produz diminuição na pós-carga, diminuindo a resistência vascular pulmonar periférica e aumentando a contratilidade cardíaca, levando a aumento da função de bomba bi-ventricular. Assim, em pacientes com cor pulmonale por DPOC, em função também de seu efeito broncodilatador, mesmo que inferior ao dos beta-2 agonistas e dos anticolinérgicos, o uso da teofilina pode ser considerado. Deve-se estar atento às suas complexas interações medicamentosas e riscos de efeitos colaterais, que determinam necessidade de monitoração periódica dos níveis séricos durante o tratamento. Também os beta-2 agonistas têm sido associados a efeitos benéficos no cor pulmonale, por ação inotrópica miocárdica e vasodilatadora pulmonar. |
16 – Qual o papel dos diuréticos no tratamento do cor pulmonale? |
O uso de diuréticos no tratamento do cor pulmonale não é simples e deve ser regido pelo equilíbrio entre seus benefícios e riscos. Em pacientes com volume de enchimento de ventrículo direito aumentado, os diuréticos melhoram o débito cardíaco, sobretudo por reduzirem o desvio do septo interventricular, que dificulta o enchimento do ventrículo esquerdo. Por outro lado, seu uso excessivo, ao depletar a volemia, pode comprometer o débito cardíaco.Não se deve ter como objetivo da terapia diurética simplesmente reverter o edema periférico. Ela deve ser monitorada com medidas periódicas de creatinina, cuja elevação é, nesta situação, marcador de baixa perfusão renal, sugerindo que o débito cardíaco está comprometido. Outro risco do uso de diuréticos é o surgimento de alcalose metabólica, que pode levar a hipoventilação e piorar, desta forma, a condição respiratória do paciente.Por tudo isso, recomenda-se o uso de diuréticos menos potentes, como a espironolactona, ou baixas doses dos diuréticos de alça. |
17 – Qual o papel dos vasodilatadores no tratamento do cor pulmonale? |
Medicamentos classicamente empregados com vasodilatadores sistêmicos, como hidralazina, nitratos, nifedipina, verapamil, diltiazem e inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA), têm sido tentados no tratamento da hipertensão pulmonar e do cor pulmonale, mas com resultados, em geral, desanimadores. Os efeitos, muitas vezes, não são sustentados ou clinicamente significantes, enquanto eventos adversos importantes são relatados, sobretudo hipotensão e, às vezes, piora da hipoxemia.Opções mais recentes de vasodilatadores têm sido aplicadas em pacientes com hipertensão pulmonar, sobretudo na forma primária. São elas os inibidores de fosfodiesterase (sildenafil), os bloqueadores dos receptores da endotelina (bosentana, sitaxsentana e ambrisentana) e os derivados da prostaciclina (epoprostenol, teprostinil, iloprost). Maiores detalhes sobre o papel desses medicamentos no tratamento da hipertensão pulmonar estão disponíveis no temaHipertensão arterial pulmonar. |
18 – Como orientar o uso de vasodilatadores no tratamento do cor pulmonale? |
Em função das limitações já apresentadas, os vasodilatadores só estão indicados quando a terapia convencional da doença de base e a oxigenoterapia tiverem falhado em melhorar os sintomas de falência ventricular direita ou hipertensão pulmonar. Em face aos efeitos adversos potenciais, o estudo hemodinâmico e a monitoração das trocas gasosas estão indicados. No estudo hemodinâmico, os seguintes resultados predizem boa resposta ao tratamento vasodilatador e, portanto, sustentam sua introdução
Se estes benefícios forem confirmados, inicia-se o tratamento com a medicação e, após 4 a 6 meses de terapia, repete-se o cateterismo direito para documentar se os benefícios hemodinâmicos persistem. |
1 – O que são os corticóides? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os corticosteróides, também chamados de adrenocorticosteróides ou apenas corticóides, são hormônios de natureza esteroídica produzidos na porção cortical das glândulas adrenais a partir de um precursor comum, o colesterol. Caracteristicamente, apresentam em sua estrutura molecular básica o núcleo ciclopentano (peridro) fenantreno.
Compreendem três famílias: os glicocorticóides, os mineralocorticóides e os andrógenos. Os glicocorticóides (GCs) são os principais hormônios do córtex adrenal, sendo o cortisol a sua forma mais comum. Tanto os GCs naturais como seus derivados sintéticos são agentes farmacológicos muito usados pelos médicos de diferentes especialidades. |
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2 – Qual a diferença entre glicocorticóides e mineralocorticóides? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os glicocorticóides atuam predominantemente sobre o metabolismo intermediário dos carboidratos, proteínas e lípides, enquanto os mineralocorticóides, representado pela aldosterona, atuam predominantemente sobre o metabolismo do sódio e do potássio. Interessante destacar que os glicocorticóides, naturais ou sintéticos, podem apresentar graus variados de efeito mineralocorticóide, ao passo que a aldosterona praticamente não apresenta atividade glicocorticóide. Para efeitos didáticos, adotaremos o termo corticóides para se referir aos glicocorticóides. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
3 – Como é feita a regulação da produção endógena do corticóide? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A regulação da produção dos corticóides ou glicocorticóides é feita por meio do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA). O hormônio liberador de corticotropina (CRH), produzido principalmente no núcleo paraventricular do hipotálamo, é liberado na circulação portal hipofisária e estimula a porção anterior da glândula a produzir o ACTH ou corticotropina. Por sua vez, o ACTH atua sobre a adrenal estimulando a síntese de esteróides. A secreção do ACTH possui as seguintes características:
Os corticóides, além de inibirem a secreção de ACTH por ação direta sobre a hipófise, inibem também a produção de CRH pelo hipotálamo. |
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4 – O que é ritmo circadiano? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A taxa de secreção do cortisol pelo córtex da adrenal do ser humano em condições fisiológicas é de aproximadamente 20 a 30 mg por dia. No entanto, essa secreção não é constante e apresenta flutuações rítmicas ao longo do dia, com níveis máximos de cortisol nas primeiras horas da manhã, decréscimo ao longo do dia e níveis mínimos durante a noite. Este ritmo de secreção é denominado circadiano. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
5 – Quais são os principais efeitos fisiológicos dos corticóides? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os principais efeitos fisiológicos dos glicocorticóides são aqueles sobre o metabolismo intermediário dos carboidratos, proteínas e lípides.Ação sobre os carboidratosOs corticóides tendem a promover elevação dos níveis séricos de glicose, resultado do seu efeito antagônico à insulina, com redução da captação periférica da glicose e aumento da síntese hepática de glicose (gliconeogênese). Além disso, estimula a síntese da enzima glicogênio-sintetase, aumentando a produção e o armazenamento do glicogênio hepático.Ação sobre as proteínasPromovem aumento do catabolismo protéico, com tendência a balanço nitrogenado negativo.Ação sobre os lípidesOs corticóides promovem a lipólise dos triglicérides do tecido adiposo, bem como a redistribuição da gordura corporal. Nos estados de hipercortisolismo, verifica-se predominância de adiposidade central (região dorsocervical e supraclavicular) e perda de tecido celular subcutâneo nas extremidades.Os corticóides apresentam outros efeitos fisiológicos sobre diferentes sistemas:
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6 – Qual o mecanismo de ação molecular do corticóide? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os corticóides, para exercerem seus efeitos, fisiológicos ou farmacológicos, se ligam a receptores de glicocorticóides situados no citoplasma de praticamente todas as células. Após a ligação com os receptores dos corticóides dentro das células, eles atuam de três maneiras:
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7 – Qual o papel dos corticóides sobre a inflamação e a imunidade? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A utilização dos corticóides como parte de uma estratégia terapêutica se baseia, na grande maioria das vezes, na sua capacidade de interferir com a inflamação ou suprimir a resposta imune.O efeito antiinflamatório dos corticóides está provavelmente relacionado às alterações promovidas na microcirculação e na supressão das citocinas inflamatórias. Apesar do aumento do número de neutrófilos circulantes, há redução da expressão das moléculas de adesão na superfície das células endoteliais e dos leucócitos, de tal forma que há menor acúmulo de células fagocitárias no local da inflamação. Além disso, há redução significativa no número de eosinófilos e linfócitos periféricos, principalmente os linfócitos T, de tal maneira que há comprometimento da imunidade celular. Os corticóides também exercem ação, embora menor, sobre a resposta humoral, pois modulam direta e indiretamente a função das células B.Paralelamente, há redução da produção e da ação dos mediadores da inflamação (interferon, interleucinas 1, 2 e 6, prostaglandinas, histamina, leucotrienos, bradicinina, fator ativador de plaquetas, serotonina, entre outros). Além disso, os corticóides podem aumentar a síntese de substâncias com ação antiinflamatória, como a lipocortina-1, proteína que suprime a fosfolipase A2, inibindo a liberação de ácido araquidônico e a subseqüente elevação dos produtos da via da lipo-oxigenase e ciclo-oxigenase.Interessante destacar que alguns desses efeitos antiinflamatórios e imunológicos dos corticóides são dose-dependente. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
8 – Quais são os corticóides disponíveis para uso terapêutico? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os seguintes corticóides sistêmicos são disponíveis para uso terapêuticos:
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9 – Quais são as principais características farmacocinéticas e farmacodinâmicas dos corticóides? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A tabela 1 descreve algumas das principais características farmacocinéticas e farmacodinâmicas dos corticóides sistêmicos mais utilizados.
Obs: A porção dos corticóides não ligadas ás proteínas plasmáticas é que apresenta atividade farmacológica. |
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10 – Qual a equivalência de dose entre os corticóides? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A potência antiinflamatória e a capacidade de retenção salina diferem entre as diversas preparações de corticóides. Assim, é importante que se conheça o perfil de equivalência das diferentes apresentações, conforme descrito na tabela 2.
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11 – Quais são as principais interações medicamentosas dos corticóides? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Alguns medicamentos reduzem os efeitos dos corticóides, outros aumentam.Medicamentos que podem reduzir os efeitos dos corticóides:
Medicamentos que podem aumentar os efeitos dos corticóides:
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12 – Como classificar os esquemas terapêuticos com corticóides de acordo coma duração e intensidade? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A classificação a seguir, embora arbitrária, é bastante útil em caracterizar os esquemas de corticoterapia.Corticoterapia com altas doses e de curto prazoCaracteriza-se pelo uso de doses equivalentes de 20 a 60 mg/dia de prednisona, com duração de até no máximo duas semanas. Nessa situação, o corticóide pode ser interrompido de maneira abrupta sem risco de supressão do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA).Corticoterapia com dose alta e de médio/longo prazoCaracteriza-se pelo uso de doses equivalentes acima de 20 mg/dia de prednisona, com duração superior a duas semanas. Quando se opta pela suspensão do tratamento, há necessidade de redução gradual da dose de corticóide, pois o risco de supressão do eixo HHA com a parada abrupta do medicamento é grande.Corticoterapia com dose baixa/média e de médio/longo prazoCaracteriza-se pelo uso de doses equivalentes abaixo de 20 mg/dia de prednisona, com duração superior a duas semanas. Também há necessidade de redução gradual da dose do corticóide, quando se optar pela suspensão do tratamento.Pulsoterapia
É um esquema terapêutico em que se utiliza doses muito elevadas de metilprednisolona, por um curto período de tempo (aproximadamente 1 g/dia de metilprednisolona por um prazo de até cinco dias seguidos). |
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13 – Quando e como deve ser feita a redução gradual da dose de corticóide? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Como visto anteriormente, somente há necessidade de redução gradual da dose de corticóide nos indivíduos que fazem seu uso por tempo superior a 14 dias. Também não há evidência de que doses equivalentes a menos de 5 mg/dia de prednisona sejam capazes de suprimir o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA), de tal maneira que indivíduos em uso dessas doses poderiam cessar abruptamente o tratamento.Há inúmeros esquemas de retirada do corticóide, porém sem evidência que favoreça um sobre o outro. Assim, apresentamos um esquema racional e simples para a redução gradual da dose do corticóide:
Existem regimes de redução de dose em que, após atingir determinada dose diária de corticóide (geralmente 10 mg/dia), o paciente recebe a medicação em dias alternados. No entanto, embora seja uma prática usual, não há evidências a respeito do valor dessa conduta. |
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14 – Qual o melhor horário para administração do corticóide a pacientes que fazem uso crônico dessa medicação? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Partindo do princípio de que é necessário respeitar os aspectos fisiológicos para se reduzir os riscos com a corticoterapia, o paciente que faz uso de corticóide sistêmico deveria receber a medicação pela manhã, ao acordar. Desta forma, o ritmo circadiano estaria sendo mantido. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
15 – Quando a corticoterapia é considerada imunossupressora? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Habitualmente, os indivíduos em uso diário de 20 mg ou mais de prednisona (ou equivalente) por período prolongado, geralmente superior a 30 dias, são considerados imunossuprimidos. Também se considera que a dose equivalente de 1 mg/kg de peso de prednisona seja capaz de provocar imunossupressão, independente da duração da corticoterapia. No entanto, é importante enfatizar que essas definições são arbitrárias e que pacientes em uso de doses menores podem apresentar algum grau de redução da imunidade. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
16 – Quais são os efeitos colaterais provocados pelo uso dos corticóides? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Apesar de apresentar grandes benefícios terapêuticos, a corticoterapia, infelizmente, é associada a uma série de possíveis efeitos colaterais. Essa toxicidade dos corticóides está relacionada com a dose empregada, bem como com o tempo acumulado de uso. Convencionalmente, considera-se que doses baixas (menos 10 mg/dia de prednisona ou equivalente) usadas de forma crônica seriam relativamente seguras. No entanto, estudos demonstraram que mesmo em doses baixas, o uso crônico de corticóides associa-se significativamente com a ocorrência de eventos adversos.Os efeitos colaterais dos corticóides que acometem os mais diversos órgãos e sistemas são apresentados na tabela 3.
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17 – Como é a insuficiência adrenal secundária? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Pacientes em uso de corticóide por tempo prolongado (superior a 14 dias) podem apresentar supressão do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, de tal forma que a suspensão abrupta do corticóide sistêmico leva ao surgimento do quadro de insuficiência adrenal aguda.O quadro clínico inclui confusão mental, anorexia, náuseas e vômitos, adinamia intensa, desidratação, hipotensão e até mesmo choque, taquicardia e hipoglicemia. Esses pacientes devem receber hidratação venosa vigorosa, correção dos distúrbios eletrolíticos, aporte de glicose e administração de hidrocortisona (100 a 200 mg IV imediatamente, posteriormente mantida a cada seis ou oito horas). | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
18 – O que é a síndrome de retirada dos corticóides? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A síndrome de retirada consiste em uma série de sinais e sintomas conseqüentes à redução rápida ou abrupta do tratamento com corticóide. O que diferencia essa síndrome da insuficiência adrenal secundária é a preservação da atividade do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal. Além disso, não há reativação da doença de base. Os pacientes apresentam o seguinte quadro clínico: anorexia, letargia, náuseas, artralgias, perda de peso, descamação da pele e febre. Ainda não se conhecem os verdadeiros mecanismos fisiopatológicos que expliquem a ocorrência desse fenômeno. O retorno do corticóide às doses prévias geralmente é suficiente para reverter essa situação. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
19 – Como identificar se um paciente apresenta supressão do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA)? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Baseando-se no tempo de tratamento e na dose de corticóide utilizada podemos classificar os indivíduos em três grupos de acordo com a possibilidade de supressão da adrenal:
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20 – Como proceder quando um paciente que faz uso crônico de corticóide necessita ser submetido a procedimento cirúrgico? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O uso crônico de corticóide sistêmico pode comprometer a integridade do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA), de tal forma que durante um novo estresse, como em cirurgias, a resposta fisiológica das adrenais pode ser inadequada e advir sinais de insuficiência adrenal. Assim, quando um paciente em corticoterapia tiver que ser submetido a procedimento cirúrgico, é necessário que o médico tome as medidas necessárias para que não ocorra falência adrenal.Partindo do princípio de que se conhece o estado de integridade do eixo HHA (conforme avaliação sugerida anteriormente), pode-se recomendar as seguintes condutas:Pacientes sem supressão do eixo HHAManter a dose usual de corticóide durante a manhã, sem necessidade de suplementação.Pacientes com supressão do eixo HHA
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21 – Como identificar a osteoporose provocada pelo uso do corticóide? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Como visto anteriormente, o corticóide, além de provocar redução da formação óssea, aumenta a sua reabsorção, de tal forma que seu uso crônico pode levar a perda da massa mineral e, conseqüentemente, à osteoporose. Embora doses mais elevadas de glicocorticóides tenham mais chances de provocar este efeito colateral, doses baixas e até mesmo o uso inalatório também estão associados ao surgimento de osteoporose. Assim, qualquer paciente em corticoterapia sistêmica prolongada deve ser encarado como potencial candidato ao desenvolvimento desta complicação.Dores ósseas e fraturas patológicas fazem parte da apresentação clínica desses pacientes, sendo que uma parcela não desprezível dessa população pode ser assintomática. O diagnóstico da doença passa pela identificação da redução significativa da densidade óssea demonstrada pelos exames radiológicos convencionais e, principalmente, pela densitometria óssea. A medida da densidade óssea deve ser feita antes da instituição da corticoterapia e a cada 12 meses, enquanto o tratamento estiver sendo mantido. O objetivo é identificar precocemente a redução da massa óssea, de tal maneira que medidas terapêuticas eficazes possam ser adotadas. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
22 – Como prevenir e tratar a osteoporose induzida pelo corticóide? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
É importante destacar que a suspensão do uso do corticóide interrompe o processo de perda da massa mineral, retornando a atividade de formação óssea, que fica evidente após seis meses de retirada do medicamento. Assim, deve-se procurar usar a menor dose de corticóide pelo menor tempo possível e, sempre que possível, procurar medidas terapêuticas alternativas à corticoterapia. As formulações tópicas, quando indicadas, são preferíveis em relação às sistêmicas.Os pacientes também devem ser encorajados a cessar com o tabagismo, com o consumo excessivo de álcool e a realizar atividades físicas rotineiramente (30 minutos de caminhada diariamente). O Colégio Americano de Reumatologia sugere ainda as seguintes medidas de prevenção de osteoporose e fraturas em indivíduos em uso de doses equivalentes de 5 mg/dia ou mais de prednisona por mais de três meses:
O tratamento da osteoporose já instituída é o adotado convencionalmente para essa entidade. (veja no sitewww.medicinaatual.com.br o tema osteoporose). |
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23 – Como minimizar os riscos no uso crônico de corticóide? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Com o objetivo de se reduzir os riscos com o uso crônico de corticóide, algumas medidas podem ser úteis:
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24 – Qual a segurança do uso de corticóides sistêmicos durante a gravidez? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Não existem estudos controlados avaliando o emprego de corticóides sistêmicos durante a gravidez. O seu uso tem sido relacionado com a ocorrência de determinados efeitos indesejáveis no recém nascido: supressão adrenal neonatal, catarata, baixo peso ao nascer, comprometimento do desenvolvimento e crescimento da criança. Assim, a adoção de corticoterapia sistêmica durante a gestação deve levar em consideração o potencial benefício para a mãe e os possíveis riscos para o feto. Sempre que possível, deve-se evitar doses elevadas e uso prolongado. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
25 – Qual a segurança do uso de corticóides sistêmicos em crianças? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A grande preocupação ao se instituir corticoterapia em crianças é o seu efeito maléfico sobre o crescimento. Os corticóides em doses acima das fisiológicas têm a capacidade de reduzir a secreção do hormônio do crescimento e bloquear a sua ação biológica periférica, além de reduzir a formação óssea. Assim, observa-se em crianças redução acentuada da velocidade de crescimento e até mesmo a sua interrupção. Tal situação pode ocorrer mesmo na ausência de outros efeitos colaterais.Cuidados com a dieta, com suplementação protéica e vitamínica, bem como a instituição de atividades físicas regulares devem ser recomendadas, embora o seu impacto sobre a redução na velocidade de crescimento não seja tão significativo. Em alguns casos a prescrição de esteróides anabolizantes pode reduzir significativamente esse efeito, no entanto, tal medida pode levar ao avanço da idade óssea, de tal forma que a estatura final pode ser comprometida. Estudos têm sugerido a utilização de hormônio do crescimento para combater o efeito do corticóide sobre o crescimento. Os resultados iniciais, embora promissores, precisam ser confirmados por meio de ensaios maiores. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
26 – Quais as principais indicações dos corticóides sistêmicos em pneumologia? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os corticóides sistêmicos são utilizados em várias situações clínicas da pneumologia. Entre as principais podemos citar:
Alguns estudos iniciais têm demonstrado benefícios no uso de corticóide sistêmico na pneumonia grave e na fase fibroproliferativa da síndrome do desconforto respiratório agudo. |
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27 – Qual a indicação do corticóide sistêmico na exacerbação da DPOC? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O corticóide sistêmico está indicado no tratamento de todas as exacerbações de DPOC, exceto nas que não se acompanham de acentuação da dispnéia habitual do quadro, que constituem uma minoria. Seu uso reduz a ocorrência de falha terapêutica, o tempo de internação hospitalar, além de promover melhora clínica, do VEF1 e da PaO2 mais rapidamente.Nas exacerbações mais leves, que não requerem internação, a prednisona (ou prednisolona) é a principal opção. Pode ser usada na dose de 40 mg/dia, por dez a 14 dias, seguida de interrupção abrupta. Alternativamente, pode-se optar pelo uso de 40 mg/dia nos primeiros cinco a sete dias, reduzindo para 20 mg/dia por igual período.Quando há necessidade de internação, habitualmente prefere-se a via endovenosa, podendo-se utilizar a metilprednisolona na dose de 0,5 a 1 mg/kg por dia ou dose equivalente de hidrocortisona, fracionadas em três ou quatro administrações. Após melhora clínica inicial, pode-se mudar para prednisona, 40 mg/dia por via oral, mantendo-a por dez dias. Eventualmente, mesmo entre os pacientes internados, o corticóide sistêmico pode ser administrado desde o início pela via oral. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
28 – Os corticóides sistêmicos estão indicados no tratamento de manutenção da DPOC? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Não há benefícios no uso de corticóide sistêmico na DPOC estável. Ao contrário, há um número grande de efeitos adversos, tais como a atrofia muscular, ganho de peso, aumento da glicemia, equimoses e gastrite. Dessa forma, o uso crônico de prednisona na DPOC deve ser desencorajado. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
29 – Como o corticóide sistêmico deve ser empregado na crise de asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O corticóide sistêmico deve ser usado em todas as crises de asma, exceto em formas muito leves, que respondem à medicação de resgate e ao aumento do corticóide inalatório, sem necessidade de consulta ao médico assistente ou ao serviço de pronto-socorro. O paciente deve estar bem educado no reconhecimento do agravamento de sua enfermidade, não retardando o início desta medicação.Não havendo necessidade de internação, habitualmente opta-se pela prednisona ou pela prednisolona, na dose de 40 a 60 mg/dia em adultos (ou 1 mg/kg/dia em crianças), por um período médio de dez dias. Nos atendimentos de emergência, durante muito tempo preferiu-se a medicação endovenosa, mas hoje se sabe que o corticóide pode ser administrado por via oral, com resultados semelhantes. A via endovenosa pode ser reservada para os casos em que há vômitos, quando se suspeita de absorção intestinal inadequada, quando a via venosa é necessária para outras medicações ou nos casos mais graves. As doses habitualmente recomendadas são:
Em alguns estudos, doses bem superiores (até 125 mg a cada seis horas de metilprednisolona) foram utilizadas nas crises mais graves, acompanhadas de insuficiência respiratória. Não se sabe ao certo se há vantagens dessas doses elevadas em relação às habituais. Outros autores sugerem benefícios da associação de um corticóide inalatório ao sistêmico no tratamento da crise de asma. Ainda não há evidências suficientes para recomendação rotineira desta conduta. |
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30 – Existe indicação de corticóide sistêmico no tratamento de manutenção da asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O corticóide sistêmico pode ser necessário para o controle de uma minoria de pacientes com asma persistente grave. Tentado minimizar ao máximo os efeitos adversos, as menores doses capazes de controlar os sintomas devem ser buscadas. Elas devem ser administradas uma vez ao dia, pela manhã, ou até mesmo em dias alternados. As melhores opções são a prednisona ou a prednisolona, por apresentarem menos efeitos mineralocorticóides e menor ação sobre a musculatura estriada.Diante de um paciente com asma persistente grave com necessidade de corticóide sistêmico, deve-se ter certeza que etapas anteriores para o controle da doença foram implantadas com sucesso. Entre elas pode-se destacar:
Por fim, nessas formas graves de asma, deve-se estar atento para a possibilidade de diagnósticos diferenciais ou concomitantes, como DPOC, Churg-Strauss, aspergilose broncopulmonar alérgica, disfunção de cordas vocais. |
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31 – A asma pode ser resistente ao corticóide? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Na verdade a córtico-resistência é característica do paciente. Sua descrição na asma deve-se ao fato de ser uma enfermidade na qual os corticóides, inalatórios ou sistêmicos, são largamente usados e com excelentes resultados, tornando mais fácil a identificação de resistência.A resistência aos corticóides, incluindo aos inalatórios, ocorre em 1 a cada 10.000 asmáticos. Deve-se suspeitar desta condição nos casos em que o paciente tem incapacidade de melhorar em mais de 15% o VEF1 matinal após receber 40 mg de prednisona por sete a 14 dias. Confirma-se a resistência se o VEF1 melhorar mais de 15% após 400 mcg de beta-2 agonista de ação rápida.Existem dois tipos de córtico-resistência: a genética e a adquirida. O tipo genético, mais raro, decorre da redução do número absoluto de receptores de corticóide e ausência generalizada de resposta às doses elevadas dessa medicação. Não há nem resposta terapêutica, nem efeitos colaterais. No tipo adquirido ocorre diminuição na afinidade dos receptores de corticóide e a resistência pode ser revertida com a utilização de doses elevadas da medicação, que, por outro lado, determina o surgimento de efeitos adversos. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
32 – Existe indicação de corticóide sistêmico no tratamento da fibrose pulmonar idiopática? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Até o momento não se dispõe de nenhuma terapia medicamentosa que dê resultados brilhantes em pacientes com fibrose pulmonar idiopática. Os corticóides sistêmicos, mesmo estando entre as medicações mais usadas nessa enfermidade, têm seus benefícios questionados. Entretanto, eles são ainda recomendados em esquemas terapêuticos combinados com outros imunossupressores, como os propostos pelas sociedades americana e européia:
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33 – Qual o papel dos corticóides no tratamento da sarcoidose? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os corticóides sistêmicos são o tratamento de escolha da sarcoidose com comprometimento pulmonar. Habitualmente inicia-se com 30 a 40 mg/dia de prednisona (ou equivalente), os quais são mantidos por um a dois meses. Posteriormente, tenta-se a redução da dose para 0,25 mg/kg, mantendo-se o tratamento por pelo menos um ano com doses baixas de corticóide.Alguns estudos avaliaram o tratamento da sarcoidose com corticóide inalatório (budesonida). Apesar de melhora dos sintomas, sobretudo da tosse, não houve melhora radiográfica. Não se recomenda seu uso isolado no tratamento da sarcoidose, pois não há comprovação dos efeitos dos corticóides inalatórios sobra a doença parenquimatosa. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
34 – Existe indicação de corticóide sistêmico no tratamento da pneumonia de hipersensibilidade (PH)? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O corticóide sistêmico é a terapia inicial de escolha na PH. Nas fases aguda e subaguda, o tratamento com prednisona associa-se a melhoras clínica, radiográfica e funcional em algumas semanas. Em formas leves, o corticóide pode ser dispensável, com resolução do quadro apenas com o afastamento do paciente do fator agressor.Nas formas crônicas a corticoterapia também está indicada, mas a resposta ao tratamento nem sempre é marcante. Muitos pacientes já com quadro de fibrose não apresentam melhora e nestes podem ser tentados imunossupressores, como azatioprina ou ciclofosfamida. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
35 – Qual o papel dos corticóides no tratamento da pneumonia eosinofílica? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os corticóides são a base do tratamento da pneumonia eosinofílica. Nas formas agudas a resposta é tão exuberante que se constitui, inclusive, em prova do diagnóstico. Não havendo insuficiência respiratória, inicia-se com prednisona (40 a 60 mg/dia, ou dose equivalente de outro corticóide oral). Do contrário, inicia-se com metilprednisolona (60 a 125 mg IV a cada seis horas), passando para as doses habituais de prednisona após a melhora inicial, em geral com três dias. O tratamento inicial é mantido por duas a quatro semanas, com posterior redução gradual da dose, ao longo de seis meses. É comum a recaída após a suspensão da medicação, fazendo com que alguns autores recomendem a manutenção de doses baixas de corticóide por até cinco anos. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
36 – Qual o papel dos corticóides na síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA)? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os corticóides, por reduzirem a produção de uma série de mediadores inflamatórios e diminuírem a ação de mediadores pró-fibróticos, têm sido estudados na SDRA. Inicialmente testaram-se doses elevadas e por curtos períodos de tempo, com resultados que não se associaram a melhora da sobrevida e, em alguns casos, mostraram maior risco de infecção. A partir da década de 90, surgiram estudos avaliando o uso de doses menores e por maior tempo, em pacientes com SDRA de evolução mais prolongada. Acredita-se que após sete a dez dias do diagnóstico, o quadro inflamatório mais exuberante dê lugar à fase fibroproliferativa, sobre a qual os corticóides teoricamente teriam melhores efeitos. Os resultados obtidos com esses estudos foram melhores, sendo o mais ilustrativo o publicado por Meduri e colaboradores em 1998. Eles estudaram 24 pacientes com SDRA e que não tinham melhora após sete dias de evolução, randomizando-os a receberem metilprednisolona (16 pacientes) ou placebo (8 pacientes). Os pacientes tratados com corticosteróide apresentaram melhor evolução gasométrica, menor falência de órgãos e maior sobrevida (87% versus 37%, com p=0,03) do que os que receberam placebo.Apesar desses resultados animadores, a literatura ainda é pobre sobre o papel dos corticóides na SDRA. Até que se tenha melhor posição, alguns pontos podem ser colocados nesse momento:
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37 – Qual o papel dos corticóides no tratamento da pneumonia adquirida na comunidade (PAC) grave? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Em função dos resultados animadores obtidos com o uso de corticóide na pneumocistose e em determinadas condições de síndrome do desconforto respiratório agudo, voltaram-se as atenções para possíveis benefícios de seu uso nas PACs graves. Neste sentido, um interessante artigo foi publicado em 2005 no Am J Respir Crit Care Med, que mostrou que o a adição de hidrocortisona ao tratamento da PAC grave associou-se a melhora da mortalidade e redução da ocorrência de choque séptico, o que pode refletir um efeito protetor sobre a resposta inflamatória que ocorre nas pneumonias graves. A hidrocortisona foi administrada na dose de 200 mg, por via endovenosa, como ataque, seguida da infusão contínua de 10 mg/h, durante dez dias.Por tratar-se de um único estudo, conduzido em só centro e com um número limitado de pacientes, aguardam-se comprovações de seus resultados antes de se recomendar essa prática de forma rotineira. |
1 – Qual o princípio em se utilizar os corticóides pela via inalatória no tratamento de certas doenças respiratórias? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os glicocorticóides são conhecidos pelo seu grande poder antiinflamatório, característica fundamental para o tratamento de determinadas doenças, com destaque para a asma. No entanto, o seu uso prolongado é associado a uma variedade de efeitos colaterais, restringindo a sua utilização. Assim, com o objetivo de atingir uma ótima ação tópica, porém com baixa repercussão sistêmica, corticóides inalatórios foram desenvolvidos.
Inicialmente tentou-se a cortisona, que apresenta ação tópica fraca e exigia altas doses e posologia freqüente, de hora em hora, impedindo seu uso clínico. Posteriormente, utilizou-se a dexametasona, com potente ação tópica; porém, sua alta biodisponibilidade sistêmica levou a efeitos sistêmicos importantes, inclusive síndrome de Cushing. Na década de 70, com o surgimento do dipropionato de beclometasona, droga que apresentava melhor perfil terapêutico que as anteriores, a corticoterapia inalatória ganhou força e passou a ser utilizada com maior freqüência. |
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2 – Quais são os corticóides inalatórios disponíveis? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Atualmente, temos os seguintes corticóides inalatórios:
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3 – Qual o mecanismo de ação dos corticóides inalatórios? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O corticóide inalatório, tal como o sistêmico, exerce sua ação principalmente por meio de mecanismos moleculares. Após se ligar a receptores de glicocorticóides situados no citoplasma de praticamente todas as células, o complexo corticóide-receptor penetra no núcleo celular onde se liga ao DNA e então ativa ou reprime a transcrição genética de diferentes mecanismos de ação celular. Os corticóides também promovem seus efeitos por meio de ação indireta sobre o genoma e por ação sem ligação com o genoma, mecanismos ainda pouco conhecidos.Como resultado dessas ações, tem-se o aumento do número de receptores beta-2, redução da produção e da ação dos mediadores da inflamação (interferon, interleucinas 1, 2 e 6, prostaglandinas, histamina, leucotrienos, bradicinina, fator ativador de plaquetas, serotonina, entre outros). Há ainda aumento da síntese de substâncias com ação antiinflamatória, como a lipocortina-1, proteína que suprime a fosfolipase A2, inibindo a liberação de ácido araquidônico e a subseqüente elevação dos produtos da via da lipoxigenase e cicloxigenase. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
4 – Quais são as principais características farmacocinéticas dos corticóides inalatórios? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A tabela 1 mostra as principais características farmacocinéticas dos corticóides inalatórios.
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5 – Qual a importância da biodisponibilidade sistêmica do corticóide inalatório? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A biodisponibilidade sistêmica corresponde à velocidade e à quantidade da medicação administrada que alcança a circulação sangüínea. No caso das medicações inalatórias, será um dos fatores determinantes no desenvolvimento de efeitos sistêmicos adversos. Quanto maior a biodisponibilidade sistêmica, maiores são as chances de ocorrerem esses efeitos.A biodisponibilidade sistêmica corresponde ao somatório da biodisponibilidade pulmonar (parcela da medicação que é depositada nos pulmões) com a biodisponibilidade oral (parcela da medicação que é absorvida pelo trato gastrointestinal e que alcança o plasma após sofrer metabolismo hepático de primeira passagem). | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
6 – Qual o papel da inativação hepática de primeira passagem sobre os efeitos dos corticóides inalatórios? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Após a inalação, uma parcela muito significativa dos corticóides inalatórios (45% a 90%) fica depositada na orofaringe, sendo deglutida e absorvida pelo tubo digestivo. Porém, antes de alcançar a corrente sangüínea, o corticóide sofre uma primeira passagem hepática, onde será metabolizado e uma parcela será inativada, reduzindo a quantidade de droga ativa sistêmica disponível. Assim, a inativação hepática de primeira passagem é fundamental para reduzir a biodisponibilidade oral do corticóide e, conseqüentemente, os seus efeitos sistêmicos adversos. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
7 – Qual a importância da deposição pulmonar no tratamento com corticóides inalatórios? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A porcentagem do corticóide inalatório que alcança o tecido pulmonar é fundamental para determinar o seu efeito terapêutico. A deposição pulmonar dos corticóides é influenciada pelo dispositivo inalatório utilizado, pela técnica inalatória, pelo tipo de propelente (no caso dos aerossóis) e pelo tipo de corticóide. Por outro lado, a deposição pulmonar (biodisponibilidade pulmonar) é o principal determinante da biodisponibilidade sistêmica da medicação, pois a droga absorvida diretamente a partir do tecido pulmonar não sofre efeito de primeira passagem hepática. Toda a medicação depositada nos pulmões será invariavelmente absorvida e exercerá efeitos sistêmicos. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
8 – Quais são as características de um corticóide inalatório ideal? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O corticóide inalatório ideal seria aquele que aliasse máxima potência antiinflamatória tópica com mínima repercussão sistêmica. Para tanto, ele deveria apresentar as seguintes características farmacocinéticas:
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9 – Qual a equivalência de doses entre os corticóides inalatórios disponíveis comercialmente no Brasil? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A tabela 2 ilustra as equivalências dos corticóides inalatórios, de acordo com o GINA (Global Initiative for Asthma).
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10 – Quais são os dispositivos para administração de corticóides inalatórios? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os corticóides inalatórios podem ser administrados pelos seguintes dispositivos:
Para saber mais sobre os dispositivos inalatórios, visite o site www.pacientes.com.br e assista os vídeos sobre como utilizá-los corretamente. |
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11 – Como escolher o dispositivo inalatório para a administração do corticóide? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
A escolha do dispositivo mais adequado depende de vários aspectos e deve ser individualizada. A preferência pessoal do paciente deve ser levada em consideração, bem como sua capacidade de utilizar corretamente o dispositivo. Certos pacientes têm dificuldade em utilizar os aerossóis dosimetrados (bombinhas ou “spray”), pois os mesmos exigem coordenação para o seu uso correto, embora isso possa ser minimizado pelo uso de espaçadores. Nesses casos, os inaladores de pó parecem ser mais indicados. Pacientes com deficiências motoras ou visuais, idosos debilitados ou com alterações cognitivas podem ter dificuldade de usar medicações inalatórias e algumas vezes a nebulização é a única opção viável. Sempre que possível, deve-se usar apenas um tipo de dispositivo, para facilitar o aprendizado da técnica e melhorar a adesão ao tratamento. |
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12 – Qual a influência dos dispositivos e da técnica inalatória na eficácia do tratamento com os corticóides? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os dispositivos e a técnica inalatória adequada são os principais determinantes da deposição pulmonar do corticóide inalatório e, conseqüentemente, influenciam significativamente na eficácia do tratamento, bem como na ocorrência de efeitos colaterais. Por exemplo, a utilização de aerossol acoplado a um espaçador pode reduzir em até dez vezes a quantidade de droga que fica depositada na orofaringe quando comparada ao uso isolado do nebulímetro. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
13 – Por que o propelente dos aerossóis está sendo trocado de CFC para HFA? Qual a influência disto na eficácia da corticoterapia inalatória? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os gases CFC, também conhecidos como freon, são liberados para a estratosfera e, sob ação dos raios ultravioletas, liberam íons cloro. Um átomo de cloro, cuja meia vida ultrapassa 100 anos, degrada um milhão de moléculas de ozônio (O3). Na década de oitenta, foi detectado um buraco na camada de ozônio da Antártida. A redução desta camada acarreta, entre outros problemas, aumento na incidência de câncer de pele e de catarata e interfere no ecossistema aquático. Há poucos anos, o protocolo de Montreal, com participação de mais de 160 países, decidiu eliminar a produção de CFC, inclusive para fins medicinais, como única alternativa de prevenir a progressão do buraco da camada de ozônio. Assim, os aerossóis tiveram o seu propelente trocado para HFA (hidrofluoroalcano) que além de não afetar negativamente o meio-ambiente mostrou ser mais eficiente em relação à deposição do corticóide nos pulmões. Isso ocorre em função do HFA liberar partículas mais finas do corticóide, o que contribui para a sua deposição nas vias aéreas mais distais. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
14 – Qual o papel dos corticóides inalatórios no tratamento da asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os corticóides inalatórios constituem a terapêutica antiinflamatória mais eficaz para o tratamento da asma. Há evidências suficientes indicando a eficácia dessa medicação em melhorar a função pulmonar, reduzir a hiperresponsividade brônquica e os sintomas da doença. Eles ainda reduzem a freqüência e a gravidade das agudizações, bem como melhoram a qualidade de vida do asmático. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
15 – Quando indicar os corticóides inalatórios no tratamento da asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os corticóides inalatórios constituem a primeira opção para o tratamento de manutenção dos pacientes com asma persistente, independentemente da gravidade. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
16 – Qual a dose inicial dos corticóides inalatórios no tratamento da asma? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Enquanto a eficácia dos corticóides inalatórios no tratamento da asma está bem estabelecida, a determinação da dose inicial a ser utilizada ainda é motivo de discussão. Diversos estudos que avaliaram a curva dose-resposta dos corticóides mostraram que ela costuma assumir a forma de platô a partir de determinadas doses (por exemplo, 100 a 250 mcg/dia de fluticasona). Isto significa que a maioria dos benefícios clínicos é atingida com essas doses e que aquelas mais altas acrescentariam pouco ao tratamento, ainda com o risco de trazer efeitos colaterais. No entanto, na prática clínica, doses mais elevadas são utilizadas com freqüência, principalmente em pacientes com asma persistente grave.Com o objetivo de esclarecer essa questão, uma meta-análise publicada recentemente avaliou 13 ensaios randomizados e controlados (com um total de 2.525 pacientes) e concluiu que a utilização de doses elevadas de corticóide no tratamento inicial do adulto com asma não apresenta benefícios sobre o uso de doses moderadas, as quais, entretanto, foram superiores às baixas. Assim, com base na literatura, é recomendado que se inicie o tratamento do asmático com doses moderadas de corticóide inalatório. O posterior ajuste da posologia deve ser individualizado, de acordo com a resposta do paciente. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
17 – Como proceder quando o paciente asmático persiste sintomático apesar do uso do corticóide inalatório? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Inicialmente, recomendava-se que o paciente asmático que se mantém sintomático apesar do uso de corticóide inalatório devia utilizar doses maiores desse medicamento. No entanto, como visto na questão anterior, essa conduta pode não trazer grandes benefícios, além de aumentar o risco de efeitos colaterais. Mais recentemente, diferentes autores mostraram que melhor controle da doença pode ser alcançado com a associação de um beta2-agonista de ação prolongada (formoterol ou salmeterol), ficando a elevação da dose do corticóide inalatório como um passo seguinte. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
18 – Após quanto tempo de uso surgem os benefícios do tratamento da asma com corticóide inalatório? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Geralmente, são necessárias quatro semanas de uso contínuo para que se alcance o melhor efeito com determinada dose de corticóide inalatório. É importante que o médico explique isso ao paciente, pois a não melhora nos primeiros dias pode levar o paciente a abandonar o tratamento. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
19 – O paciente com asma deverá usar o corticóide inalatório durante quanto tempo? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O GINA (Global Initiative for Asthma, documento usado como consenso mundial sobre a doença) recomenda que, a partir do momento em que o controle da asma é atingido e mantido por pelo menos três meses, a redução gradual da dose da medicação de manutenção (no caso, o corticóide inalatório) deve ser tentada, com o objetivo de se identificar a menor dose necessária para o controle da doença. Assim, a duração do tratamento é variável, sendo que em alguns indivíduos pode ser necessário o uso por tempo indefinido, enquanto em outros pacientes o corticóide inalatório pode até ser suspenso. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
20 – Qual o papel do corticóide inalatório no tratamento da crise asmática? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Alguns estudos mostraram que o corticóide inalatório utilizado em altas doses se associou a desfechos favoráveis (melhora da função pulmonar, prevenção de recaídas precoces, redução de hospitalização) em pacientes com exacerbação da asma atendidos em serviços de emergência. Há também trabalhos indicando possível benefício do aumento da dose habitual do corticóide inalatório assim que surjam os primeiros sintomas e sinais da crise. No entanto, ainda são necessários mais ensaios clínicos para que se tenha uma posição definitiva do papel dessa medicação no tratamento da crise asmática e, assim, até o momento, pacientes com exacerbação da asma devem ser tratados com corticoterapia sistêmica. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
21 – Existe paciente resistente ao tratamento com corticóide? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Sim, a resistência aos corticóides, incluindo aos inalatórios, ocorre em 1 a cada 10.000 asmáticos. Deve-se suspeitar desta condição nos casos em que o paciente tem incapacidade de melhorar em mais de 15% o VEF1 matinal após receber 40 mg de prednisona por sete a 14 dias. Confirma-se a resistência se o VEF1 melhorar mais de 15% após 400 mcg de beta-2 agonista de ação rápida.Existem dois tipos de córtico-resistência: a genética e a adquirida. O tipo genético, mais raro, decorre da redução do número absoluto de receptores de corticóide e ausência generalizada de resposta às doses elevadas dessa medicação. Não há nem resposta terapêutica, nem efeitos colaterais. No tipo adquirido, ocorre diminuição na afinidade dos receptores de corticóide e a resistência pode ser revertida com a utilização de doses elevadas da medicação, que, por outro lado, determina o surgimento de efeitos adversos. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
22 – Os corticóides inalatórios podem ser usados no tratamento de crianças asmáticas? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Sim, os corticóides inalatórios são a mais eficaz medicação para o tratamento de manutenção da asma em crianças com doença persistente, independente da gravidade. Estudos demonstraram que baixas doses de corticóide são habitualmente suficientes para promover melhora clínica e funcional nesse grupo etário. No entanto, há a preocupação em relação aos possíveis efeitos deletérios do corticóide tópico sobre o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal e sobre o crescimento da criança asmática (pontos que serão discutidos mais a frente), de tal forma que a menor dose necessária de corticóide inalatório deve ser tentada. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
23 – Pacientes asmáticas que estejam grávidas podem continuar o tratamento com corticóide inalatório? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Sim, os corticóides inalatórios constituem a medicação recomendada para o tratamento da asma persistente em grávidas. Evidências científicas demonstram que seu uso reduz o risco de exacerbações e melhora os valores obtidos na prova de função pulmonar. Dados obtidos em diversas pesquisas, quando esta medicação foi usada, não registraram aumento de casos de malformações congênitas ou outros problemas ocorridos durante o parto. A maioria dos trabalhos utilizou a budesonida para o tratamento da asma durante a gravidez, considerada como o medicamento de preferência nessa situação. Entretanto, outros corticóides inalatórios poderão ser mantidos caso a paciente já esteja em uso antes da gestação. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
24 – O Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza corticóide inalatório para o tratamento dos asmáticos? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Infelizmente, são poucas as cidades que disponibilizam, através do SUS, corticóide inalatório para o tratamento de asmáticos. Tal fato é lamentável, pois o impacto da asma na saúde pública é significativo: 329.182 internações no ano de 2004 (4ª causa de hospitalização), resultando em gastos de mais de 106 milhões de reais. Programas de controle da asma em que o fornecimento de corticóide inalatório fazia parte da estratégia demonstraram redução significativa da hospitalização por essa enfermidade, principalmente na população pediátrica. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
25 – Existe indicação para o uso de corticóide inalatório no tratamento da DPOC? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Existe ainda grande polêmica com relação ao uso dos corticóides inalatórios na DPOC. Sabe-se que o tratamento regular com corticóide inalatório não altera o declínio do VEF1 e provavelmente não aumenta a sobrevida nos pacientes com DPOC.No entanto, existem dois grupos de pacientes com DPOC que poderiam se beneficiar desse tratamento. O primeiro seria constituído por aqueles pacientes que apresentam associadamente características asmáticas, tais como história de asma na infância, história passada ou presente de outras atopias, ou que apresentaram acentuada melhora sintomática quando submetidos a um curso curto de corticóide sistêmico (ex: 40 mg de prednisona por dez dias). O segundo grupo que se beneficiaria do uso dos corticóides inalatórios seria constituído por pacientes com doença mais avançada, aqueles com VEF1 menor que 50% do previsto e com exacerbações freqüentes (em média três ou mais episódios por ano), com necessidade de uso de corticóide oral e antibióticos. Nestes pacientes, foi demonstrado que a corticoterapia inalatória é capaz de reduzir o número de exacerbações, bem como promover melhora na qualidade de vida. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
26 – Qual a posologia dos corticóides inalatórios para pacientes com DPOC? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Não se conhece ao certo a relação dose-resposta dos corticóides inalatórios para o tratamento da DPOC. Os estudos clínicos utilizaram doses moderadas a elevadas de corticóide, sendo que os mais estudados foram a fluticasona e a budesonida com doses em torno de 800 mcg/dia de budesonida e 1000mcg/dia de fluticasona. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
27 – Qual o papel dos corticóides inalatórios no tratamento das bronquiectasias? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
O processo inflamatório brônquico é peça chave na patogenia das bronquiectasias, assim, o uso de agentes antiinflamatórios poderia, teoricamente, ser benéfico no seu tratamento. No momento a literatura ainda carece de estudos nessa área. Alguns poucos ensaios mostraram que o uso de corticóide inalatório poderia promover melhora funcional pulmonar dos pacientes com bronquiectasia. Estudo publicado recentemente comparou o uso de fluticasona (500 mcg 12/12 h) com placebo, durante período de 12 meses, em 86 pacientes portadores de bronquiectasia. Os resultados demonstraram redução significativa do volume de expectoração, porém sem efeito sobre a freqüência das exacerbações, bem como sobre o VEF1. Assim, o uso de corticóide inalatório para o tratamento da bronquiectasia deve ser individualizado, podendo ser empregado nos pacientes mais sintomáticos. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
28 – Há indicação para o uso de corticóide inalatório no tratamento da sarcoidose? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os estudos controlados que avaliaram o uso do corticóide inalatório no tratamento da sarcoidose demonstraram alguma melhora dos sintomas, principalmente a tosse, porém sem efeito sobre a função pulmonar e as imagens radiológicas. Assim, os corticóides inalatórios poderiam ser recomendados nas seguintes situações: presença de hiperresponsividade brônquica, obstrução ao fluxo aéreo ou tosse importante, principalmente nos estádios I e II da doença. Pacientes que necessitam do uso prolongado de corticóide sistêmico em baixas doses (5 a 10 mg/dia de prednisona) para o controle da sarcoidose pulmonar poderiam receber o corticóide inalatório como alternativa, embora o seu efeito sobre a doença parenquimatosa seja pequeno.Importante destacar que os estudos que avaliaram tais indicações para o corticóide inalatório utilizaram doses elevadas: 2.000 mcg/dia de fluticasona ou 800 a 1.600 mcg/dia de budesonida. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
29 – Quais são os principais efeitos adversos locais dos corticóides inalatórios? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os efeitos colaterais mais freqüentes dos corticóides inalatórios são os locais, ou seja, aqueles que acometem a orofaringe e a via aérea superior. A prevalência desses efeitos é bastante variável: há estudos que indicam taxas de 10%, enquanto outros mostram valores próximos a 60%. Embora sejam menos graves que os sistêmicos, esses eventos podem ser causa de não aderência ao tratamento. Acredita-se que a etiologia desses efeitos esteja ligada à irritação local provocada pelo corticóide residual, bem como à ação pró-inflamatória provocada pelo propelente e lubrificante contidos nos aerossóis dosimetrados. Os efeitos colaterais incluem:
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30 – Como prevenir os efeitos adversos locais dos corticóides inalatórios? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Nenhum estudo avaliou especificamente as medidas para a prevenção dos eventos adversos locais, no entanto, algumas recomendações são importantes:
Estudos iniciais mostraram que foi semelhante a incidência de eventos locais em pacientes asmáticos tratados com ciclesonida (novo corticóide inalatório) e com placebo, sendo ambos inferiores aos outros corticóides inalatórios. A explicação para isso reside no fato de que a ciclesonida é uma pró-droga, ou seja, composto farmacologicamente inativo que somente é ativado no pulmão (tecido alvo). Isso sugere que o desenvolvimento de formulações do tipo pró-droga pode ser importante na prevenção dos eventos adversos locais. |
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31 – Os corticóides inalatórios podem provocar efeitos colaterais sistêmicos? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Efeitos sistêmicos, embora raros, podem ocorrer. Estão relacionados com a dose e com a potência do corticóide empregado, bem como a sua biodisponibilidade sistêmica e o tipo de dispositivo inalatório utilizado. Alguns estudos comparativos demonstraram que a budesonida e a fluticasona têm menor risco de provocar efeitos sistêmicos que a beclometasona. Acredita-se que a ciclesonida, por ser ativada somente nos pulmões, possa também ter menos efeitos sistêmicos. Os principais efeitos sistêmicos são:
Convém destacar que o corticóide inalatório é fundamental para o paciente com asma persistente, não apresentando efeitos adversos clinicamente importantes na grande maioria dos casos. Seu uso reduz a necessidade das formulações sistêmicas, as quais certamente têm risco de provocar efeitos adversos freqüentes e graves. |
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32 – Qual o efeito dos corticóides inalatórios sobre o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Estudos demonstraram que o corticóide inalatório pode provocar supressão do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA), no entanto este efeito é dependente da dose, do tempo de uso e da formulação utilizada. A supressão foi mais comum em pacientes utilizando doses elevadas (doses de beclometasona acima de 1.500 mcg/dia, ou equivalente, em adultos, e 400 mcg/dia em crianças). Entretanto, mesmo em indivíduos recebendo doses mais altas é comum a preservação do eixo HHA, além do fato de que o significado clínico desse grau de supressão necessita ser melhor esclarecido.O médico deve estar ciente deste potencial efeito colateral, buscando prescrever a menor dose necessária para controle da asma. Ao mesmo tempo, essa preocupação não deve ser encarada como um fator de restrição para a utilização dessa classe de medicamento, em função do grande benefício promovido por ela no tratamento da asma. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
33 – Em relação ao crescimento, qual a influência do uso contínuo de corticóide inalatório? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Uma das grandes preocupações com o uso prolongado de corticóide inalatório no tratamento da asma em crianças, provavelmente contribuindo para a redução de sua prescrição, é a possibilidade dele prejudicar o crescimento desses pacientes. Talvez por este receio, o impacto dos corticóides inalatórios sobre o crescimento tem sido repetidamente avaliado. A maior parte dos estudos mostra realmente que esta medicação reduz a velocidade de crescimento, mas esse efeito é pequeno e transitório, restrito ao início do tratamento (nível de evidência A). Mais importante do que esse discreto retardo inicial no crescimento, os estudos mostram que a altura final das crianças asmáticas tratadas por longos períodos com corticóide inalatório não é comprometida (nível de evidência C). Não há dados suficientes na literatura que permitam avaliar se há diferenças no impacto sobre o crescimento conforme o corticóide utilizado. Vale a pena ainda ressaltar que o não controle adequado da asma e/ou cursos freqüentes de corticóide sistêmico podem comprometer o crescimento de forma mais intensa do que o uso regular da medicação inalatória. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
34 – Há relação entre o uso de corticóide inalatório e a ocorrência de osteoporose? | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Os principais estudos que avaliaram o uso prolongado de corticóide inalatório em crianças não mostraram efeitos deletérios sobre a densidade óssea. Já em relação aos adultos, os resultados são mais conflitantes. Alguns estudos prospectivos mostraram segurança da medicação em relação à perda de densidade óssea, mas falhas nos métodos, como número pequeno de pacientes, ausência de grupo controle recebendo placebo ou outro tratamento de forma “cega” e randômica, comprometem os seus resultados. Por outro lado, os trabalhos que mostraram perda da densidade óssea em adultos tratados com corticóides inalatórios também têm suas limitações, entre as quais destaca-se a freqüente presença de cursos de corticóide sistêmico entre os pacientes que recebem as formulações tópicas por tempo prolongado. Além disso, não se sabe ao certo se pequenas reduções na densidade óssea que porventura ocorram têm significado clínico, como por exemplo, maior risco de fratura.Em resumo, não se pode afastar a possibilidade de redução da densidade óssea em adultos tratados com corticóides inalatórios, sobretudo quando são usadas doses elevadas por tempos prolongados, mas o impacto clínico dessas possíveis perdas não está definido (nível de evidência C). |